Folhas da Manhã, da Tarde e da Noite se uniram sob um só título, Folha de S.Paulo, há 60 anos

A união faz a força

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São Paulo

"Deter a inflação, o objetivo do governo no ano que começa", leu Cecilia Carbonell, 42, na mesa do café da manhã, ao lado de seu marido.

A inflação batia 40% ao ano, o governo era o do presidente Juscelino Kubitschek, começava o ano de 1960, a frase era a manchete do dia. Cecilia era assinante da Folha da Manhã, mas, naquele 1º de janeiro, o jornal que tinha nas mãos era a Folha de S.Paulo.

Uma mensagem aos leitores anunciava: "Muitos dos jornais do mundo tiram mais de uma edição por dia, mas todas com um mesmo nome. Por esse motivo é que a Folha da Manhã, a Folha da Tarde e a Folha da Noite, que na realidade constituem um único jornal, vão chamar-se respectivamente 1ª, 2ª e 3ª edição da Folha de S.Paulo".

A unificação fazia parte de um movimento de modernização e racionalização implantado desde o começo da década de 1950 pelo jornalista Nabantino Ramos (1908-1979), que adquirira (com dois sócios) a empresa em 1945 e personificava o espírito de sua terceira fase.

A primeira começou em 1921, quando a Folha da Noite foi lançada por um grupo de jornalistas para informar trabalhadores urbanos de volta a casa, numa São Paulo de 580 mil habitantes.

O rádio ainda não se difundira e edições vespertinas eram a forma de atualizar os matutinos --como a Folha da Manhã, que estreou em 1925.

Veio a crise de 1929, a revolução de 1930, a empresa foi invadida e depredada por simpatizantes de Getúlio Vargas e, em sua segunda fase, comprada por um fazendeiro e comerciante que queria aproximá-la da atividade cafeeira.

Mas eram as indústrias que se expandiam em São Paulo, mulheres e trabalhadores ganhavam direito ao voto, a USP foi inaugurada em 1934 e a população chegava a 1,5 milhão de pessoas em 1940.

Com seu proprietário a distância, os jornalistas que dirigiam as Folhas valorizavam o mundo urbano.

A terceira fase acompanhou a expansão industrial que se seguiu à Segunda Guerra Mundial. A empresa trocou de mãos em 1945 e, quatro anos depois, lançou seu terceiro título, Folha da Tarde.

A essa altura, os jornais já sofriam concorrência de rádio, revistas e TV e procuravam atrair públicos de todos os sexos e todas as idades, com mais e maiores fotos, esportes e temas locais.

Montadoras e outras grandes indústrias instaladas em São Paulo atraíam moradores de outras cidades paulistas e outros estados, engrossando a população de quase 3 milhões --só um terço atendido por água encanada.

A política de "50 anos em 5" de JK e a construção de Brasília, porém, aceleraram a inflação, o que desorganizou o planejamento das empresas.

Passou a ser ineficiente manter três equipes escrevendo textos diferentes às vezes sobre o mesmo assunto, cada um composto em chumbo por um linotipista.

O primeiro passo foi mudar a técnica de redação. Cada reportagem começava com um pequeno resumo seguido pela pirâmide invertida: notícias mais importantes em cima e menos importantes embaixo.

Uma matéria de economia poderia ter 40 linhas na Folha da Manhã, das quais cinco seriam aproveitadas pela Folha da Tarde, se tivessem interesse popular, e 15 talvez chegassem à Folha da Noite.

Os textos eram cortados no próprio chumbo, o que reduziu os custos industriais.

O segundo passo foi o que completa hoje 60 anos: unificar o título, em três edições. A matutina priorizava o noticiário político e econômico, a segunda abria espaço para noticiário variado e a terceira procurava ser mais quente, com notícias atualizadas.

Um único nome significava circulação mais alta, o que trazia vantagens como veículo publicitário.

Ainda no segundo pelotão, a Folha também queria se tornar menos provinciana e, em 1961, adotou o slogan "Um jornal a serviço do Brasil".

Custos galopantes, porém, estrangulavam a empresa, e um ano depois o jornal priorizou a edição matutina, interrompendo as outras duas. Em agosto de 62, a empresa foi vendida aos empresários Octavio Frias de Oliveira (1912-2007) e Carlos Caldeira Filho (1913-1993), que levaram a Folha à liderança no Brasil.

O jornal continuou fazendo parte do café de Cecilia Carbonell por todos os dias, até 2019, quando ela morreu, aos 101 anos. E ainda chega pela manhã à sua casa. "Fez parte de toda nossa vida, virou um ritual", diz sua filha, a psicóloga Maria Cecília Rezende. "Hoje, me sento com meus filhos [de 38 e 36 anos], e continuamos falando das notícias."

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