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Agenda do STF para 2020 tem desafios previsíveis, mas ausências inexplicáveis

Descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal e suspeição de Moro ficaram de fora da pauta de 2020

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O Supremo Tribunal Federal retomou suas atividades com a solenidade de abertura do ano e um discurso de seu presidente pautando como “objetivo primordial do Poder Judiciário na atual quadra da história do país” a previsibilidade. Interessante escolha, pois se há algo de previsível no Supremo Tribunal Federal é sua capacidade em surpreender até aos mais céticos.

Os desafios colocados ao Supremo são previsíveis e, em grande parte, sua reação também. E nada disso é necessariamente positivo. Em verdade, o tribunal começa o ano de 2020 com enormes e conhecidos desafios a superar. Segue sendo um tribunal que acumula funções, que distribui muito poder aos ministros individualmente e que conta com um acervo enorme de processos a julgar. 

Sessão solene de abertura do ano Judiciário de 2020 no Supremo; da esq. para a dir: o procurador-geral da República, Augusto Aras; o presidente do Senado , Davi Alcolumbre (DEM-AP); o presidente do STF, Dias Toffoli; o vice-presidente, Hamilton Mourão, e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) - Roque de Sá/Agência Senado

Sabemos de antemão o que o colegiado do Supremo vai julgar. Aliás, a pauta escolhida pelo presidente Dias Toffoli não é ousada, mas está longe de ser amena.

Apenas nas primeiras semanas de trabalho o tribunal deverá enfrentar o final do julgamento sobre a desaposentação, a possibilidade de redução de vencimentos e de jornada de servidores públicos para manter o limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ações relativas à tabela do frete —resultado negociado da greve dos caminhoneiros— serão julgadas ainda em fevereiro. Nos meses de março a maio estão em pauta ações sobre royalties do petróleo, minirreforma eleitoral, reforma da Previdência de 2003, reforma trabalhista, ICMS na base de cálculo de PIS e Cofins, doação de sangue por homens homossexuais, reforma do ensino médio, Fundeb e a execução da pena das condenações oriundas do Tribunal de Júri antes do trânsito em julgado.

Como não poderia deixar de ser, a pauta conta ainda com casos relativos à Operação Lava Jato, como a ordem de alegações finais entre réus colaboradores e não colaboradores; a validade da delação da JBS e a ação que questiona a lei de organizações criminosas.

Fonte constante de desgaste institucional para o Supremo, a Lava Jato foi o motor para os piores momentos da corte nos últimos anos: decisões excepcionais, interferência no Legislativo, vai e vem na posição de ministros.

Por isso, independentemente do resultado do julgamento destes casos, pode-se dizer que o contexto é previsível: ministros e procuradores trocando farpas e um custo enorme para o Supremo lidar com as próprias más decisões tomadas no auge da Operação Lava Jato.

Se a divulgação antecipada dos processos do semestre é uma medida que merece elogios, a falta de transparência nos critérios de escolha dos casos persiste como um problema institucional. E o que não será julgado se torna tão importante quanto o que está na pauta.

Há pelo menos uma ausência inexplicável na agenda de julgamentos: a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal —que esteve na pauta um par de vezes em 2019.

Não no plenário, mas na Segunda Turma do STF, também segue sem previsão de julgamento a arguição de suspeição do então juiz Sergio Moro, desdobramento da Vaza Jato, com a revelação de conversas entre o magistrado e procuradores.

Este último caso pode vir à mesa de julgamento a qualquer momento: afinal, o uso oportuno do tempo e da pauta pelo Supremo também é, pode-se dizer, previsível. Da mesma forma, não surpreenderia ninguém uma guerra de liminares entre ministros: a disfunção do Supremo já é conhecida.

Os maiores desafios ao Supremo, entretanto, estão postos pela “atual quadra da história do país” e de igual forma são previsíveis: um Poder Executivo que diariamente ultrapassa os limites constitucionais e, com isso, degrada nossa democracia.

Desde janeiro de 2019, 70 ações foram levadas ao STF questionando atos do presidente da República e outras 28 ações questionando políticas emblemáticas do governo e de seus ministros. Apenas um número ínfimo destas contou com uma decisão. Por enquanto, parece que o Supremo tem abdicado de impor controles ao Executivo. Em 2020, nada indica que a toada presidencial vá mudar. E o Supremo?

JULGAMENTOS PREVISTOS PARA O PRIMEIRO SEMESTRE NO SUPREMO 

Prisão imediata de condenados pelo Tribunal do Júri (12.fev)

Redução de ICMS para agrotóxicos (20.fev)

Prazo para INSS fazer perícia médica nos segurados (20.fev)

Fornecimento de remédio sem registro na Anvisa (11.mar)

Conclusão de julgamento sobre ordem das alegações finais de réus delatores e delatados (25.mar)

Prisão especial para portadores de diplomar de ensino superior (26.mar)

Pontos da Lei de Responsabilidade Fiscal, como o que permite diminuir jornada e salário de servidores (2.abr)

Constitucionalidade da reforma do ensino médio (22.abr)

Regras de distribuição de royalties do petróleo (29.abr)

Pontos da reforma trabalhista, como o trabalho intermitente (14.mai)

Suspensão do WhatsApp e quebra de sigilo das mensagens por ordem judicial (20.mai)

Porte de arma para guardas municipais (28.mai)

Validade da delação da JBS (17.jun)

Eloísa Machado de Almeida

Professora e coordenadora do Supremo em Pauta da FGV Direito SP

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