Sem citar Bolsonaro, Toffoli diz que não há democracia sem Parlamento atuante

Em nota, presidente do STF afirmou que país não pode conviver com clima permanente de disputa

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Brasília

O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Dias Toffoli, afirmou em nota nesta quarta-feira (26) que não há democracia sem um Parlamento atuante e um Judiciário independente, e que o Brasil não pode viver um clima de disputa permanente.

“Sociedades livres e desenvolvidas nunca prescindiram de instituições sólidas para manter a sua integridade. Não existe democracia sem um Parlamento atuante, um Judiciário independente e um Executivo já legitimado pelo voto. O Brasil não pode conviver com um clima de disputa permanente. É preciso paz para construir o futuro. A convivência harmônica entre todos é o que constrói uma grande nação”, afirmou, em nota.

Como noticiado nesta terça (25), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) encaminhou a seus contatos no WhatsApp um vídeo que conclama a população a ir às ruas no dia 15 de março, quando está marcado um ato pró-governo e contra o Congresso. ​

Após a repercussão negativa do episódio, Bolsonaro escreveu no Twitter, nesta quarta, que as interpretações sobre o compartilhamento do vídeo são “tentativas rasteiras de tumultuar a República”. Ele não negou que tenha encaminhado o vídeo a seus contatos.

“Tenho 35 milhões de seguidores em minhas mídias sociais (Facebook, Instagram, YouTube e Twitter) onde mantenho uma intensa agenda de notícias não divulgadas por parte da imprensa tradicional. Já no WhatsApp tenho algumas poucas dezenas de amigos onde, de forma reservada, trocamos mensagens de cunho pessoal”, escreveu.

Pela manhã, o decano do Supremo, ministro Celso de Mello, disse em nota à coluna Mônica Bergamo que, se confirmada a conclamação feita por Bolsonaro, ela revela “a face sombria de um presidente da República que desconhece o valor da ordem constitucional, que ignora o sentido fundamental da separação de Poderes, que demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do altíssimo cargo que exerce e cujo ato de inequívoca hostilidade aos demais Poderes da República traduz gesto de ominoso desapreço e de inaceitável degradação do princípio democrático!!!”.

Sem citar Bolsonaro explicitamente, o ministro Gilmar Mendes divulgou no Twitter uma mensagem em defesa das instituições e da separação dos Poderes.

“A CF88 [Constituição Federal de 1988] garantiu o nosso maior período de estabilidade democrática. A harmonia e o respeito mútuo entre os Poderes são pilares do Estado de Direito, independemente dos governantes de hoje ou de amanhã. Nossas instituições devem ser honradas por aqueles aos quais incumbe guardá-las”, escreveu Gilmar.

Líderes políticos como os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique Cardoso e o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, manifestaram repúdio, ainda na noite de terça (25), à iniciativa de Bolsonaro de compartilhar vídeos que convocam manifestações para o próximo dia 15.

Santa Cruz disse que o ato de Bolsonaro, se confirmado, pode abrir caminho para pedido de impeachment.

“Entendo que é inadmissível, o presidente está mais uma vez traindo o que jurou ao Congresso em sua posse, quando jurou defender a Constituição Federal. A Constituição e a democracia não podem tolerar um presidente que conspira por sua supressão”, afirmou.

Segundo ele, a convocação pode se enquadrar no artigo 85 da Constituição, que diz que “são crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: [...] o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação”.

Bolsonaro

Após a repercussão sobre o vídeo que compartilhou, Jair Bolsonaro orientou a sua equipe de governo a evitar endossar publicamente a manifestação marcada para o dia 15 contra o Congresso.

Em conversas na manhã desta quarta, o presidente disse a aliados e a auxiliares que não está incentivando o protesto e que apenas reencaminhou em um grupo privado um conteúdo que lhe foi enviado.

Segundo relatos feitos à Folha, o presidente avaliou que o fato de ele ter compartilhado o conteúdo não é algo grave e considerou que tem havido um exagero na repercussão do episódio.

Para evitar novas críticas, no entanto, a ordem repassada pelo Palácio do Planalto é para que a equipe ministerial não compareça à manifestação de março para evitar um desgaste desnecessário com o Legislativo e o Judiciário.

A manifestação do dia 15 é uma reação à fala do ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, que chamou o Legislativo de "chantagista" na semana passada.

O ato estava previsto desde o final de janeiro, mas acabou mudando de pauta para apoio a Bolsonaro e encorpando insinuações autoritárias após Heleno atacar o Legislativo.

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