Após acordo com Bolsonaro, Congresso dá trégua até nova partilha de verbas

Nas redes, base do presidente pressiona para que congressistas votem contra capítulo final de acerto na semana que vem

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Brasília

​​Após um acordo com o governo,​ o Congresso manteve, nesta quarta-feira (4), vetos do presidente Jair Bolsonaro ao Orçamento impositivo e deu uma trégua temporária na disputa pelo controle de verbas federais. 

Com a decisão, o Executivo retoma por enquanto o controle de R$ 30,8 bilhões, mas o acerto prevê que a gestão desse montante ainda será repartida com o Parlamento, com a votação de projetos prevista para a semana que vem. 

O presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), em sessão nesta quarta (4)
O presidente do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), em sessão nesta quarta (4) - Pedro Ladeira - 4.mar.20/Folhapress

O primeiro capítulo para concretizar o acordo que reduz a tensão entre Bolsonaro e o Legislativo foi dado na Câmara, onde 398 deputados deram aval ao veto do presidente a trechos da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) —só 2 foram contrários. Os dispositivos legais criavam regras para pagamento de emendas impositivas. 

Com o resultado, o Senado não precisou votar. Para derrubar um veto, é necessário que a maioria absoluta dos congressistas das duas Casas decidam pela derrubada —257 deputados e 41 senadores. 

Bolsonaro, em rede social, comentou a votação: "Por 398 x 2, a Câmara dos Deputados manteve os vetos ao Orçamento. Independência entre os Poderes e respeito à democracia é o que o povo deseja no Brasil".

A trégua na disputa por dinheiro entre Palácio do Planalto e Legislativo, porém, voltará à pauta na próxima semana —a poucos dias dos atos pró-Bolsonaro e anti-Congresso, marcados para 15 de março.

Ao ceder inicialmente o comando sobre o montante bilionário, congressistas estão à espera de uma parte dos recursos, conforme acertado com o presidente. Para isso, eles terão de aprovar projetos de lei para estabelecer a nova partilha no Orçamento de 2020.

A manobra foi vista como uma forma de o governo evitar retaliações futuras em propostas de interesse do Executivo, como as reformas tributária e administrativa.

Um grupo de congressistas aliados de Bolsonaro, contudo, já ameaça dificultar a finalização do acordo com o governo. 

O imbróglio se arrasta há semanas em torno dos vetos ao Orçamento de 2020, aprovado em 2019. 

A tensão subiu após o ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) afirmar, no dia 18 de fevereiro, que congressistas chantageiam o Planalto. Desde então, busca-se uma solução para a crise. 

Nesta quarta, a Câmara, ao preservar a decisão de Bolsonaro, brecou um dispositivo que dava ao relator do Orçamento de 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE), a palavra final sobre o destino do dinheiro. Isso só foi possível após acerto com o Planalto para dividir a gestão do montante. 

Um dia antes, o Executivo havia apresentado três projetos para regulamentar o Orçamento impositivo e dar aos parlamentares poder sobre R$ 19,7 bilhões, segundo as contas do Ministério da Economia. O governo ficará então com o controle de R$ 11,1 bilhões.

Técnicos da Câmara, porém, afirmaram à Folha que os cálculos do governo estão superestimados. Segundo ele, o Congresso ficaria com uma fatia menor, de cerca de R$ 15 bilhões. De acordo com estimativas do Legislativo, o governo, então, teria R$ 15,8 bilhões. 

Apesar do desfecho da votação desta quarta, uma ala de congressistas manifestou descontentamento com os textos enviados por Bolsonaro.

A incerteza levou líderes dos partidos do chamado centrão da Câmara —formado por DEM, PP, PL, Republicanos, Solidariedade e MDB— a ameaçarem obstruir e impedir a análise dos vetos.

Os deputados tinham receio em chancelar a decisão de Bolsonaro, mas não conseguir aprovar os projetos paralelos na próxima semana em razão resistência de senadores. Parte da Casa rejeita o Orçamento impositivo. 

Ao longo do dia, líderes conversaram com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Ele garantiu ter os votos necessários para aprovar a nova partilha na Casa. 

Ele teria conseguido o apoio no MDB e PSD de que 100% das bancadas votariam a favor dos projetos. Juntas, elas somam 24 senadores.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), avalizou a promessa de Alcolumbre. "A gente precisa acreditar na palavra dos senadores porque senão, acabou, não se vota mais nada por um bom período", afirmou Maia.

A votação das propostas do governo, porém, deverá ser tumultuada. Além de boa parte dos senadores ser contra o Orçamento impositivo, deputados bolsonaristas também se opõem à votação. 

"É ruim para o governo ceder. Com o veto mantido, o relator perde os superpoderes criados dentro da CMO. Por isso, sou contra os PLNs [projetos de lei], que devolvem poder a ele", disse o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP). 

O Novo já anunciou que ficará em obstrução para não votar as modificações. O "Muda, Senado!", grupo com 22 parlamentares independentes, também deverá tentar obstruir a discussão dos projetos do governo. 

A divergência entre os valores apontados por governo e técnicos da Câmara deverá ser discutida durante a votação dos projetos da CMO (Comissão Mista de Orçamento) na próxima semana. 

Em seguida, ainda sem data definida, o plenário do Congresso irá deliberar sobre a divisão do dinheiro.

Enquanto isso, nas redes, parte da base de Bolsonaro passou a pressionar para que congressistas votem contra os projetos que concretizam o acordo. 

O Vem Pra Rua, que convoca a população para as manifestações do dia 15, passou a mobilizar sua rede contra os textos. 

"Para constar contra os PLNs 2, 3 e 4, o parlamentar precisa declarar publicamente nas suas redes sociais sua posição pela não aprovação destes projetos de lei do Congresso Nacional apresentados pela Presidência da República", diz o movimento.

Desde que o acordo foi divulgado na terça, Bolsonaro passou a ser criticado por apoiadores. 

Uma das imagens nas mensagens disparadas trazia a frase "Inacreditável —Bolsonaro dá uma banana para os movimentos de rua e faz acordo com o Congresso". 

Em uma postagem em que Alcolumbre anunciou o acordo, apoiadores do presidente também repudiaram a negociação. 

Em resposta à pressão de parte de sua base, Bolsonaro negou ter feito qualquer negociação com o Congresso. 

Os textos enviados pelo Executivo dão ao governo autonomia para contingenciar o valor nas mãos do Congresso, conforme a necessidade fiscal. Na prática, porém, o Executivo pode controlar o ritmo de liberação dos recursos, mas não alterar sua destinação, como transferir para outros ministérios.

Esse ponto é uma das principais mudanças em relação ao trato que havia sido construído com o Congresso antes do Carnaval e que foi duramente criticado por auxiliares de Bolsonaro. 

 
 
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