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Alvo de embate entre Moro e Bolsonaro, PF teve queda drástica de operações na pandemia

Ações em março caíram 76%; risco de contágio por coronavírus leva corporação a postergar cumprimento de mandados

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Brasília

O número de operações deflagradas pela Polícia Federal para combater crimes despencou durante a pandemia do novo coronavírus.

A queda foi de 76% em março, quando empresas e órgãos públicos implementaram a maioria das medidas de isolamento social, em uma comparação com igual período do ano passado.

O comando da PF é alvo de um embate entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Justiça, Sergio Moro. Como revelou a Folha, Moro chegou a pedir demissão nesta quinta-feira (23) após ser informado por Bolsonaro da troca da diretoria-geral da PF, hoje ocupada por Maurício Valeixo, homem de confiança do ex-juiz da Lava Jato.

O pedido foi seguido de uma ofensiva da cúpula militar do Palácio do Planalto para tentar manter Moro no cargo. Segundo assessores presidenciais, ele sinalizou disposição em aceitar um acordo desde que tenha a palavra final na sucessão na PF. Bolsonaro, porém, exonerou Valeixo do cargo nesta sexta-feira (24), o que pode decretar a saída de Moro do governo.

Em março de 2019, foram desencadeadas pela Polícia Federal 322 operações nas ruas do país, quantidade que caiu para 78 no mesmo mês deste ano.

A tendência é a mesma quando se compara o primeiro trimestre do ano passado com o deste. Houve redução de 1.069 para 408 investidas (62%).

A nova rotina impactou, por exemplo, as operações deflagradas contra o tráfico de drogas. Entre janeiro e março de 2019, foram 353, contra 70 agora.

Como a segurança pública é serviço essencial, as atividades de investigação continuam em curso, mas, por causa do risco de contágio nas ruas, as autoridades têm sido agora mais criteriosas ao definir o momento de cumprir mandados judiciais, como os de prisão e busca e apreensão.

Não raro, para essas tarefas, é necessário escalar dezenas ou até mais de cem policiais. As ordens são expedidas pela Justiça, que está em regime de teletrabalho e, em alguns casos, diminuiu o ritmo de apreciação de demandas apresentadas por delegados e procuradores da República.

A PF sustenta que, apesar de parte das saídas a campo ser postergada, sua produtividade continua, com outros tipos de diligência e prisões em flagrante sendo feitas.

“As apreensões de cocaína nos três primeiros meses de 2020 superaram em quase 7% aquelas dos três primeiros meses de 2019. Já as de maconha se mantiveram praticamente nos mesmos índices em ambos os primeiros trimestres de 2019 e 2020”, informou a corporação em nota, sem detalhar os números.

Delegados ouvidos pela Folha afirmaram que muitas equipes de investigação estão em home office, mas fazendo normalmente as análises necessárias para o andamento dos inquéritos. É o caso, por exemplo, da avaliação de quebras de sigilos bancário e fiscal.

Porém algumas atividades, como depoimentos presenciais de testemunhas e investigados, foram suspensas. Para facilitá-las, a PF adquiriu licenças de um programa de computador que permite a realização por videoconferência.

Os responsáveis pelos inquéritos afirmam que, em alguns casos, a avaliação de quais deflagrações podem ser adiadas e quais não podem tem sido feita conjuntamente com procuradores da República e os juízes que deferem os mandados.

Casos mais urgentes, como os flagrantes, têm sido priorizados e orienta-se o uso de equipamentos de proteção individual, como as máscaras, pelos agentes.

Na Superintendência da PF em Minas Gerais, a presença de policiais em alguns setores de investigação está reduzida a um policial por sala, com os demais trabalhando de casa.

Outra estratégia, adotada em Brasília por delegados, é a de programar turnos de trabalho diferentes para os profissionais, para evitar que eles dividam o mesmo espaço.

Procurada pela Folha, a PF afirmou que suas operações continuam em andamento e que a redução se deu apenas no número de deflagrações, ou seja, das ações para cumprir mandados judiciais.

“Antes da deflagração, há uma etapa investigativa na qual outros elementos de prova podem ser obtidos e, também, após tal evento, a investigação segue seu rumo com outras diligências até o relatório final e encaminhamento do inquérito policial à Justiça”, afirmou, em nota.

Segundo a corporação, a expedição dos mandados demanda autorização do Judiciário, após manifestação do Ministério Público, não cabendo só aos delegados os cronogramas de deflagração.

“Há que se considerar que, por vezes, pode ser que a autoridade policial decida, por aspectos operacionais e estratégicos, postergar a deflagração da operação em razão da pandemia da Covid-19, por entender que a prova será melhor produzida em outro momento”, diz a PF.

Os atos ou providências que demandem movimentação de efetivo ou transporte de presos, segundo a corporação, estão sendo avaliados “tendo sempre como norte o caráter essencial da atividade policial e a necessidade decorrente do serviço, sendo realizadas apenas as ações entendidas como inadiáveis”.

A PF alegou que, “com a normalização do cenário mundial, a tendência é de que as deflagrações represadas passem a acontecer”.

​A corporação ressaltou que suas unidades seguem trabalhando, pois a “atividade criminosa não cessa”, e que medidas de prevenção preconizadas pelo governo federal são adotadas, quando aplicáveis.

“A Polícia Federal tem feito sua parte em manter sua atuação com o mesmo profissionalismo pela qual é conhecida, com risco à própria vida, trabalhando para que a segurança pública não seja outro foco crítico de problemas a ser enfrentado em meio à relevante questão sanitária.”

Questionada sobre outros indicadores de produtividade, como os do enfrentamento ao tráfico de drogas, a PF afirmou que as apreensões demonstram que o órgão “segue trabalhando fortemente”.

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