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Tribunais estudam extinguir comarcas para economizar na pandemia, e advogados reagem

Cortes publicam medidas de contenção de despesas; terceirizados são os principais atingidos

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São Paulo

A pandemia do novo coronavírus reabriu a discussão no Judiciário sobre a extinção de comarcas para reduzir custos, o que tem provocado críticas de entidades como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Ao menos 3 dos 27 Tribunais de Justiça do país determinaram o lançamento de estudos nesse sentido nas últimas semanas: São Paulo, Pernambuco e Mato Grosso do Sul.

As medidas constam em planos de contingenciamento dos tribunais durante a crise e preveem a possibilidade de extinção ou junção de comarcas “tomando por base a relação custo-benefício decorrente de demanda pela prestação jurisdicional e nos termos da orientação do Conselho Nacional de Justiça”.

Desses três tribunais, Pernambuco foi o primeiro a publicar o seu plano, em 27 de março, e deu um prazo de 60 dias para que os estudos sejam concluídos. O plano de São Paulo foi publicado no último dia 7, e o de Mato Grosso do Sul, no dia 15.

Não é a primeira vez que o tema cria polêmica. No ano passado, o tribunal pernambucano chegou a propor a extinção de 20 comarcas, mas voltou atrás após reclamação da OAB.

Desta vez, a Ordem voltou a criticar a corte. Em nota, a seção pernambucana disse que, apesar de a pandemia demandar medidas de austeridade, “é importante ressaltar que a pacificação social através do acesso à Justiça é uma das missões mais importantes do Estado democrático de Direito”.

“Para o completo exercício da jurisdição faz-se necessário que o Poder Judiciário disponha de uma estrutura mínima, com capilaridade no estado, número de magistrados e servidores adequado, além de equipamentos para o exercício da sua missão”, disse a entidade.

No ano passado, logo após ter sido eleito presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, o desembargador Geraldo Pinheiro Franco também sugeriu que não descartava essa medida.

À época, se discutia a implementação do instituto do juiz das garantias, que mais tarde foi suspenso pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Pinheiro Franco afirmou que via a inovação com preocupação e que a medida “poderia implicar em extinção de algumas comarcas".

Para o presidente da OAB-SP, Caio Augusto Silva dos Santos, a possibilidade de extinção não é uma medida acertada.

"Os Poderes constituídos, como um todo, precisam sempre agir de maneira descentralizada, e não centralizada. A presença física de autoridades é importante, sob pena de elitizar o acesso de qualquer um aos Poderes", afirmou à Folha.

Ele avalia que medidas de contingenciamento podem ser feitas por meio de reestruturação, realocação de pessoas e melhorias tecnológicas. "A extinção é uma medida que prejudica o carente, aquele com dificuldade de acesso à Justiça em outras cidades", diz o presidente da OAB-SP.

Nada foi feito nesse sentido, no entanto, até a publicação do plano de contingenciamento. Atualmente, São Paulo tem cerca de 320 comarcas, Pernambuco tem aproximadamente 150, e Mato Grosso do Sul, 55.

Procurado, o Tribunal de Justiça de São Paulo informou em nota que, "por ora, são estudos que estão em andamento para a adequação à realidade socioeconômica pós-período Covid-19".

"Esses estudos —como tudo o que é feito no Judiciário paulista— visam à melhor forma de distribuição de Justiça em todo o estado. Existem várias e amplas possibilidades a serem estudadas, assim como as que foram elencadas pela OAB, mas todas levarão em conta os termos da orientação do CNJ no tocante a custo-benefício/prestação jurisdicional", afirma a nota.

"O Tribunal de Justiça será criterioso e responsável nessa e em todas as outras medidas que constam no Plano de Contingenciamento."

Já o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul afirma que não há indicativo para a extinção de comarcas.

"Foi determinado apenas um estudo a longo prazo para estudo da viabilidade econômica de algumas comarcas, se comparado com o atendimento e volume de processos existentes", informa, apontando que seu sistema é 100% digitalizado e audiências podem ser feitas por videoconferência.

"Em hipótese alguma o TJ fechará comarca se o atendimento à população local ficar prejudicado, mas a crise econômica exige dos gestores estudos para que os recursos sejam empregados com maior eficiência e austeridade, sem prejudicar a prestação jurisdicional", diz.

E acrescenta: “Eventual medida nesse sentido só será implantada se houver problema no repasse do duodécimo”.

Procurado, Tribunal de Justiça de Pernambuco não se manifestou.

TERCEIRIZADOS

Outras medidas de contenção de despesas foram anunciadas por tribunais de todo o país com o objetivo de conter gastos na crise, entre elas a suspensão de concursos públicos, redução de gastos de luz e energia e de diárias de viagens a magistrados.

Um dos setores mais afetados em todo o país, no entanto, devem ser os trabalhadores que prestam serviços aos tribunais e fóruns, como faxineiros, copeiros, seguranças e funcionários da manutenção.

Na última terça-feira (14), o presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas, Yedo Simões, determinou a suspensão de todos os pagamentos para os contratos de garçons, copeiros, ascensoristas e dos operadores de áudio e vídeo dos plenários.

Além disso, foram reduzidas as jornadas de trabalho de faxineiros, porteiros, motoristas, jardineiros e funcionários da manutenção predial.

O desembargador justifica que as medidas visam a “assegurar o bom funcionamento dos serviços prestados à população e cumprimento de nossos compromissos financeiros, inclusive, com o pagamento dos salários dos magistrados e servidores da corte”.

O Piauí irá reduzir, em um prazo de 90 dias, 50% da segurança armada, e estuda pedir o reforço de policiais militares e das guardas municipais, se necessário. Já Santa Catarina também diminuirá a quantidade de vigilantes armados, mas também de mensageiros, marceneiros, brigadistas, jardineiros e zeladores.

Diminuir a quantidade de terceirizados também é um objetivo em Pernambuco e na Bahia. Goiás e São Paulo encomendaram estudos sobre essa possibilidade.

Em alguns estados, houve cortes de privilégios a magistrados, como aconteceu em Roraima com os pagamentos retroativos —que muitas vezes dobram o valor da remuneração de juízes.

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