Descrição de chapéu Legislativo Paulista

Minimizada por tucanos e valorizada pela esquerda, CPI das Fake News estreia na Assembleia de SP

Deputados bolsonaristas investigados no STF estão na mira da comissão, que deve ser presidida por Caio França (PSB)

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São Paulo

Aguardada pela oposição e minimizada pelo governo João Doria (PSDB), a CPI das Fake News nas eleições de 2018 da Assembleia Legislativa de São Paulo começa seus trabalhos nesta terça-feira (30), em reunião virtual, às 10h. A comissão deve ser presidida pelo deputado Caio França (PSB), considerado neutro.

Para a bancada do PT e do PSOL, a CPI tem potencial de desbaratar a rede de propagação de mentiras e difamação que também é alvo apuração pela CPMI do Congresso Nacional, por ações eleitorais no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e pelo inquérito conduzido pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Essas investigações miram aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), incluindo parlamentares e empresários.

A Assembleia chegou a ser alvo de operação de busca e apreensão da Polícia Federal por suspeitas de que o deputado estadual Douglas Garcia (PSL), aliado de Bolsonaro, usasse verba e estrutura de seu gabinete numa espécie de braço do chamado gabinete do ódio.

O Ministério Público de São Paulo também abriu investigação sobre a atuação de Garcia. Reportagem da Folha revelou, por outro lado, que o gabinete do deputado Gil Diniz (PSL), também bolsonarista, agiu igualmente como uma central de dossiês e memes contra adversários políticos.

​A operação na Assembleia no fim de maio deu fôlego para a instalação da CPI, formada em março, mas que teve sua primeira reunião cancelada pela pandemia do coronavírus.

Com o aval do presidente da Assembleia, Cauê Macris (PSDB), as CPIs da Casa, que são cinco, poderão funcionar de forma virtual e começam a ser retomadas nesta semana.

A primeira reunião da CPI das Fake News, nesta terça, é dedicada a escolher presidente e relator da comissão. Os deputados entraram em acordo no fim de semana para que Caio seja o presidente. A relatoria deve ficar com o deputado Sargento Neri (Avante) e deve haver sub-relatoria —a deputada Mônica da Bancada Ativista (PSOL) quer ocupar a função.

A CPI foi proposta pelo PSDB, mas o partido do governador João Doria, que é alvo constante dos bolsonaristas da Assembleia, abriu mão de presidir a comissão e escalou Caio para a função. A leitura entre os tucanos é de que a CPI não deve avançar em relação às demais apurações sobre o tema e também não terá grande destaque, em meio à pandemia e às eleições municipais.

Por outro lado, caso a CPI ganhe corpo e relevância como pretendem os deputados de esquerda, o líder do governo, Carlão Pignatari (PSDB), está designado como suplente para acompanhar a comissão de perto.

Ao recuar do comando da CPI, mas sem entregá-la ao PT ou ao PSL, os tucanos encaminharam justamente o filho de Márcio França (PSB), adversário de Doria em 2018, para presidir o grupo. França também será candidato a prefeito da capital paulista neste ano, rivalizando com Bruno Covas (PSDB).

Como presidente da CPI, Caio terá destaque na Casa, mas tucanos afirmam que o fato de ele ser filho de França não interfere em sua atuação. Em geral, o deputado acompanha o PSDB nas votações da Assembleia e tem boa interlocução com os governistas.

O deputado Caio França (PSB), ao tomar posse para o segundo mandato na Assembleia, em 2019
O deputado Caio França (PSB), ao tomar posse para o segundo mandato na Assembleia, em 2019 - Agência Alesp

Para o deputado, seu perfil equilibrado o ajudou a chegar à presidência, caso isso se confirme. Caio afirma ainda que a CPI terá liberdade para investigar governo e oposição e que os trabalhos devem focar o escopo da comissão: as eleições de 2018.

"A CPI não é a favor ou contra governo A ou B, mas sim sobre a propagação de notícias comprovadamente falsas nas eleições. Todos sabemos que a liberdade de expressão é um direito fundamental e isso não se pode confundir", afirma.

O PSL será representado pela deputada Janaina Paschoal. Garcia, que é alvo do inquérito do Supremo, está escalado como suplente do partido na CPI, mas deve perder o posto porque foi suspenso pela sigla e, portanto, não pode integrar comissões.

Janaina ensaiou concorrer à presidência da CPI, mas desistiu diante da articulação que formou maioria em torno de Caio. A deputada afirma que tem uma visão mais restritiva sobre a definição de fake news do que a dos colegas na Assembleia e do que o entendimento que tem prevalecido na comissão do Congresso.

"Minha visão é técnico-jurídica. Eu não considero qualquer meme, qualquer postagem como fake news. E abomino essa prática recorrente no país de as pessoas caracterizarem como fake news aquilo que lhes desagrada, de alguma maneira cerceando a liberdade de manifestação", diz a deputada.

Janaina pretende convidar especialistas do direito à CPI para auxiliar na definição do que é fake news.

Outra discussão que a comissão enfrentará é sobre restringir-se ao tema das eleições de 2018, como defende Caio, ou avançar a casos mais recentes, como ocorre na investigação do Congresso e do Supremo.

Para Mônica da Bancada Ativista, é possível que a CPI da Assembleia use material já levantado pelas demais investigações de Brasília. Ela pretende, inclusive, chamar o ministro Alexandre de Moraes a prestar depoimento na comissão e já reúne o que concerne a São Paulo na CPI do Congresso.

​"As eleições se aproximam num momento em que a gente está começando a entender que existe uma máquina que desequilibra as ferramentas de fazer campanha entre candidatos", afirma a deputada.

Mônica e o deputado Paulo Fiorilo (PT) querem concentrar o trabalho da CPI no financiamento da rede de fake news, considerando as suspeitas de que haja dinheiro público envolvido.

"Espero que a CPI produza resultados concretos. O mais importante é descobrir quem são os financiadores e apontar os que produzem e reproduzem as fake news", afirma Fiorilo.

O próprio deputado Sargento Neri chegou a ser alvo de campanha difamatória feita pelo gabinete de Gil Diniz.

Outro membro da CPI, o deputado Arthur do Val (Patriota), conhecido pelo seu canal no YouTube Mamãe Falei, também foi alvo de ataques bolsonaristas nas redes desde que rompeu com o presidente Bolsonaro e sua família.

Gil Diniz e Douglas Garcia afirmam que o inquérito do Supremo é inconstitucional e apoiam as investigações da CPI. Para Diniz, a comissão será usada politicamente para desgastar Bolsonaro, mas não vai encontrar nenhuma conduta errada por parte dos bolsonaristas.

A CPI foi requisitada em março de 2019, no início da atual legislatura, pelo tucano Mauro Bragato. Na ocasião, o PSDB queria evitar uma CPI com potencial explosivo que vasculharia a Dersa, estatal paulista de desenvolvimento rodoviário. Como as CPIs são instaladas segundo a ordem de protocolo, os tucanos correram para registrar comissões com outros temas antes.

Nesta quarta-feira (1°), outra CPI, que investiga quarteirizações, também dará seu pontapé, elegendo presidente e relator em reunião virtual às 13h. A comissão quer apurar irregularidades nos contratos entre o governo paulista e o terceiro setor.

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