Membros de conselho da Procuradoria criticam atuação de Aras, que acusa colegas de plantar fake news

Em carta aberta, subprocuradores-gerais afirmam que críticas à Lava Jato 'alimentam suspeitas e dúvidas'

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Brasília

Integrantes do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) divulgaram nesta sexta-feira (31) uma carta aberta em que criticam as recentes declarações do procurador-geral da República, Augusto Aras, sobre a atuação das forças-tarefas da Operação Lava Jato.

“As palavras do procurador-geral da República pavimentam trilha diversa e adversa, uma vez que alimentam suspeitas e dúvidas na atuação do MPF”, diz o documento.

Assinada pelos subprocuradores-gerais Nicolao Dino, Nívio de Freitas Silva Filho, José Adonis Callou de Sá e Luíza Cristina Frischeinsen, a carta foi lida durante a reunião do CSMPF que discutia a proposta orçamentária do próximo ano.

Após ouvir os colegas, Aras disse que não lhe falta coragem para rebater cada crítica e afirmou que suas declarações feitas em videoconferência com advogados foram baseadas em informações que estão em poder de órgãos competentes do MPF, incluindo a Corregedoria-Geral.

“Eu me dirigi em evento acadêmico baseado em fatos e provas”, afirmou. Em seguida, o chefe do MPF passou a sugerir que os colegas que subscrevem o documento estão por trás de fake news “plantadas” na imprensa.

Ele disse que está colecionando as "fake news" e que ao final de sua gestão cada uma terá resposta.

O Conselho Superior, presidido por Aras e composto por outros dez subprocuradores-gerais, é a instância máxima de deliberação dentro do MPF.

Tramita no colegiado uma proposta, defendida pelo atual chefe do MPF, de criação de um órgão central para o combate à corrupção, a Unac (Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado) ​, passando as forças-tarefas no Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília.

A carta aberta afirma que um Ministério Público "desacreditado, instável e enfraquecido" atende aos interesses daqueles que se posicionam à margem da lei.

Os subprocuradores-gerais que a endossam afirmam que “nunca, jamais, houve fraude em quaisquer eleições no âmbito do Ministério Público Federal, sendo absurdo cogitar-se de sua ocorrência”.

Eles afirmam também que dados relativos a investigações submetidos a cláusula de sigilo só podem ser compartilhados mediante autorização judicial, com devida motivação e se necessário para outra investigações.

“A salvaguarda desse sigilo não se confunde com opacidade ou ‘caixa-preta’”, diz a carta.

Os signatários defendem ainda que a independência funcional é um pilar estruturante do MPF, “essencial à sua atuação, sem receio de perseguições, observado, é claro, o regular funcionamento de seus canais de controle, coordenação e revisão”

Para eles, o modelo de forças-tarefas pode e deve ser aprimorado, mas que esse aperfeiçoamento não passa pela deslegitimação de seus trabalhos ou pela desqualificação de seus membros.

Um dos conselheiros e aliado do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, Nicolao Dino foi o primeiro a abordar o tema durante a reunião do CSMPF.

“O MPF não está imune a críticas, mas há que se fazer a diferenciação do que é crítica de desconstrução”, afirmou o conselheiro.

No início da reunião, Dino começou a abordar os recentes ataques de Aras à Lava Jato, mas foi interrompido pelo atual chefe do MPF.

Dino respondeu que Aras “quer estabelecer um monólogo e não um diálogo” e disse que isso nunca havia acontecido na história do Conselho Superior.

O procurador-geral afirmou que não aceitaria ato político em sessão convocada para tratar de orçamento, que as manifestações pessoais deveriam ser reservadas para o final do encontro e que replicaria todos os comentários dos colegas.

“E o farei com documentação de que disponho em mãos para acabar com qualquer dúvida acerca dos fatos. É com documentos que responderei a Vossa Excelência [Dino] e a todos os conselheiros”, disse Aras.

Integrante do Conselho Superior, a corregedora-nacional do MPF, Elizeta Ramos, reforçou as palavras de Aras, lembrando que existe uma sindicância aberta para apurar as circunstâncias da ida da subprocuradora-geral Lindora Maria de Araújo a Curitiba para copiar dados da Lava Jato. A força-tarefa se recusou a entregar.

Coordenadora da Lava Jato na PGR, Lindora foi denunciada à Corregedoria por integrantes da operação na capital paranaense sob a acusação de manobra ilegal ao tentar acessar, segundo eles, as informações sem respaldo legal.

Aras afirmou que o acesso pleiteado era baseado em decisões judiciais.

Inconformado com a recusa da Lava Jato em franquear acesso às informações, o procurador-geral recorreu ao Supremo Tribunal Federal. O presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, determinou o compartilhamento.

Em nota, a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República) manifestou "solidariedade aos membros do CSMPF, alvos de ofensas por parte do procurador-geral da República"

"O respeito ao MPF e a manutenção do decoro em seu órgão máximo, o Conselho Superior, devem ser observados por todos os membros da instituição e, principalmente, o PGR. Exatamente por isso, as falas registradas no início da noite desta sexta-feira são inaceitáveis", afirmou.

"Os conselheiros superiores do MPF constituem o mais alto colegiado, eleitos por seus pares como representantes de toda a classe. A agressão a qualquer deles é, assim, uma agressão a todas as procuradoras e procuradores da República e à própria instituição."

A ANPR observou ainda que a respeitosa convivência diante de divergências de pensamento é a tradução do regime democrático que deve se pautar igualmente pela observância da urbanidade e da igualdade de gênero.

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