Tuíte compara orçamento do STF para plano de saúde com arrecadação do Pátria Voluntária, mas omite dados

Roberto Jefferson força comparação descabida e não explica que a assistência médica não é um privilégio do Supremo

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São Paulo

Em uma publicação no Twitter, o ex-deputado federal e atual presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, diz que o programa Pátria Voluntária, administrado pela primeira-dama Michelle Bolsonaro, arrecadou R$ 11 milhões em doações para combate à Covid-19 enquanto o Supremo Tribunal Federal estaria gastando valor similar com plano de saúde de ministros, familiares e funcionários. Os valores citados no post verificado pelo Comprova são próximos dos montantes reais, mas a publicação força uma comparação descabida.

Jefferson afirma que o STF vai gastar R$ 10 milhões com o plano de saúde. O valor aparece em dois editais do Supremo publicados nos dias 16 de abril e 28 de maio. Trata-se de uma estimativa de custos previstos para ampliar a rede de atendimento médico e odontológico credenciada do STF-Med, plano de saúde que atende a 4.180 pessoas vinculadas ao Supremo e não somente aos 11 ministros, como entendem alguns usuários que responderam ao tuíte de Jefferson. De acordo com os editais, o total de gastos pode chegar a R$ 10 milhões por ano, mas nos seis primeiros meses de 2020, mais da metade da despesa do plano foi bancada pelos beneficiários.

Roberto Jefferson gesticula durante entrevista sentado em uma cadeira
O presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, em entrevista em 2018 - Mateus Bonomi/Folhapress

Parte do orçamento do plano é custeado por meio do auxílio-saúde, um benefício que a legislação garante a todos os servidores públicos da União, não apenas do STF. O resto dos recursos é custeado pelos próprios beneficiados, que recolhem mensalmente entre R$ 121,03 e R$ 1.722,91, dependendo do tipo de vínculo com o plano. Além disso, os segurados pagam do próprio bolso um percentual que varia entre 10% a 40% da consulta, internação ou exame que utilizarem.

A comparação é descabida pois equipara uma campanha de arrecadação com o Orçamento da União. Além disso, não explica que a assistência médica é um benefício comum a muitas categorias de servidores públicos e não um privilégio do STF. No ano passado, o governo federal gastou mais de R$ 6 bilhões com esse benefício, sendo que quase 44% foram consumidos pelo Ministério da Defesa.

A “Arrecadação Solidária”, campanha do programa Pátria Voluntária para aliviar os efeitos da pandemia entre idosos, pessoas com deficiência, população de rua e povos e comunidades tradicionais, de fato arrecadou mais de R$ 10,8 milhões entre os dias 6 de abril e 20 de julho.

Verificação

Nesta terceira fase, o Comprova verifica postagens com grande viralização que tratam de políticas públicas do governo federal ou relacionadas à pandemia, que até o dia 20 de julho já custou a vida de 79.488 brasileiros, de acordo com dados da Universidade Johns Hopkins.

A publicação de Roberto Jefferson no Twitter soma as duas questões, ao comparar uma iniciativa beneficente coordenada pela primeira-dama no combate à Covid-19 com críticas ao Supremo Tribunal Federal. O tuíte teve 8,1 mil interações em uma semana. A postagem foi reproduzida no Facebook e no Instagram por páginas de direita e de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas sem tanto alcance. Foram 323 e 826 interações até a data desta verificação.

O desempenho do governo Bolsonaro na pandemia é alvo de críticas no Brasil e no exterior. Mesmo depois de infectado pelo novo coronavírus, o presidente insiste em minimizar o impacto da pandemia e pedir a reabertura da economia. A postura gerou atritos com os ministros do STF. Logo nos primeiros meses da crise, o Supremo garantiu a governadores e prefeitos a autonomia para decretar medidas de isolamento social de acordo com a realidade local. A polêmica mais recente envolve o ministro do STF Gilmar Mendes, que afirmou no dia 11 de julho que o “Exército está se associando a genocídio” na pandemia do novo coronavírus.

Desde então, Roberto Jefferson posta conteúdo contrário a Gilmar Mendes e ao STF em sua página no Twitter. Jefferson é um aliado recente do presidente Bolsonaro. Velho conhecido na política, foi deputado federal de 1983 a 2005, até ser cassado por envolvimento no escândalo do Mensalão. Nesse período, participou da Assembleia Constituinte e fez parte da base de apoio do ex-presidente Fernando Collor. Voltou ao cenário nacional em abril deste ano, depois da aproximação de Bolsonaro com os caciques do Centrão.

O Comprova já verificou outros conteúdos falsos e enganosos envolvendo ministros do STF, como o texto que sugeria um decreto-lei inconstitucional para a criação de um tribunal militar, um áudio que pedia intervenção militar ou o vídeo que alegava que as Forças Armadas iriam prender os magistrados.

Enganoso, para o Comprova, é todo o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

O Comprova fez esta verificação baseado em dados disponíveis no dia 21 de julho de 2020.

A investigação desse conteúdo foi feita por Jornal do Commercio, SBT e Estadão e publicada na terça-feira (21) pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 28 veículos na checagem de conteúdos sobre coronavírus e políticas públicas. Foi verificada por Folha, UOL, Piauí, Diário do Nordeste, O Povo, BandNews e Nexo.

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