Descrição de chapéu Eleições 2020

Marta ignora rusgas e usa histórico de alianças em flerte com Bruno Covas

Ex-prefeita, que se uniu a Mário Covas em 1998 e 2000, adapta discurso e tenta repetir dobradinha com Bruno nesta eleição

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São Paulo

Marta Suplicy parece querer deixar no passado as ocasiões em que criticou o prefeito Bruno Covas por fechar piscinas de CEUs, responsabilizou o tucano por uma "medida perversa" contra os pobres da capital paulista e o acusou de "distorcer a realidade".

Filiada ao Solidariedade, a ex-prefeita mudou o tom sobre o candidato à reeleição pelo PSDB e se aproximou dele no intuito de ser sua vice na eleição de novembro. A hipótese, hoje tida como remota, fez ataques serem substituídos por elogios de parte a parte.

Em sua estratégia, Marta recorre ainda à memória de alianças feitas por ela no passado com Mário Covas, o avô de Bruno que ajudou a fundar o PSDB e foi prefeito, senador e governador até 2001, ano em que morreu.

Em 1998, quando ainda era do PT, a então candidata derrotada ao Governo de São Paulo apoiou Covas no segundo turno contra Paulo Maluf (à época no PPB). Em 2000, Covas retribuiu o gesto e declarou voto em Marta na corrida pela prefeitura, novamente tendo Maluf como rival.

A dobradinha foi bem-sucedida em ambos os casos, com Maluf saindo derrotado.

No flerte político de agora, Marta evoca a relação com o clã para tentar estar ao lado de Bruno no próximo pleito, depois que foram frustradas suas tentativas de se aliar à coligação PSB-PDT e ao PT, partido que ela deixou em 2015 rumo ao MDB de Michel Temer.

A ex-senadora e ex-ministra dos governos Lula e Dilma (PT) louvou a coalizão com Mário Covas, por exemplo, em um vídeo postado no mês passado em suas redes sociais.

"Éramos adversários, mas nos unimos contra um mal maior. Nos aliamos para preservar São Paulo e a democracia", afirmou ela na gravação, pregando a necessidade de deixar diferenças de lado.

Um repeteco agora, no entanto, dependeria da superação de obstáculos como a pouca intimidade entre Marta e Bruno e os ataques dela à gestão do prefeito, iniciada em 2018, quando João Doria (PSDB) entregou a prefeitura ao vice para disputar o governo do estado.

"Bem que avisei!", escreveu a ex-prefeita no Twitter em janeiro de 2019, culpando Covas pelo fechamento, em pleno período de férias, de piscinas dos CEUs. Os Centros Educacionais Unificados são considerados uma das principais heranças da passagem dela pela prefeitura (2001-2004).

Fazendo sinal negativo com o polegar, ela afirmou em vídeo que "a parte cultural [em] muitos deles" estava deixando a desejar. Contou ainda ter relatado o problema ao prefeito. "E ele disse que não era prioridade."

Pouco depois, em março de 2019, o portal R7 noticiou que Marta classificou como "perversa contra o cidadão mais pobre" uma medida da gestão Covas que prejudicaria usuários do Bilhete Único, outra vitrine do governo dela.

Em janeiro deste ano, a ex-petista voltou a disparar contra o tucano. "Covas distorce a realidade e, lamentavelmente, induz o leitor ao equívoco", escreveu no Facebook ao comentar um artigo do prefeito publicado na Folha.

Ela reivindicou a autoria de políticas públicas de assistência à maternidade e acusou as gestões do PSDB de se apropriarem indevidamente de "várias outras ações concluídas, e inauguradas, no governo do PT na cidade de São Paulo".

O discurso contrasta com o da homenagem que ela rendeu em maio a Doria e Covas pelo enfrentamento ao novo coronavírus. "Ainda bem que SP tem governador e prefeito que não politizam o vírus, que aceitam e dialogam com a ciência e propõem um plano racional e compreensível para todos", tuitou.

Marta ainda se solidarizou com o prefeito por, segundo ela, dedicar a mesma força ao combate à pandemia e ao tratamento de câncer. "Bruno Covas mostrou-se um guerreiro na luta contra o câncer. Não é fácil, mas coragem não lhe falta pra superar também esse obstáculo da Covid", disse, em junho.

Covas também já emitiu sinais pouco amigáveis na direção da agora aspirante a aliada. Em 2016, o tucano foi questionado pelo jornal O Estado de S. Paulo sobre um eventual segundo turno entre Marta, que disputava a prefeitura pelo MDB, e Fernando Haddad (PT), que buscava a reeleição.

"Pavoroso" foi o termo escolhido pelo tucano para descrever o hipotético cenário. "Ficaria muito difícil decidir em quem votar. Eu teria muita dificuldade", sentenciou.

Recentemente, já em meio aos acenos de Marta, o prefeito direcionou afagos a ela, algo improvável em outros tempos. Ao inaugurar um CEU na vila Alpina (zona leste) neste mês, Covas ressaltou: "O CEU é uma marca da gestão Marta Suplicy".

Embora Marta prefira destacar o lado positivo de sua convivência com Mário Covas, a história entre os dois também registra rusgas.

Em 1998, Marta se enfureceu por ter sido chamada pelo então governador de "menininha do PT". Em artigo na Folha, ela (que àquela altura tinha 53 anos) respondeu que seu adversário na briga pelo Palácio dos Bandeirantes desqualificava não só sua candidatura, mas todas as mulheres.

Semanas mais tarde, a então deputada questionou a coerência do tucano, indo a público falar que ele antes se dizia contrário à reeleição de governantes "alegando questões éticas, mas acabou cedendo em suas ditas convicções".

Depois do primeiro turno, que consagrou Covas e Maluf nas primeiras posições, Marta foi criticada por ter demorado a manifestar apoio ao primeiro. Ela estava ressentida porque atribuía a forças do PSDB uma manobra que, na visão dos petistas, tirou do partido a chance de ir ao segundo turno.

"Ele ganhou por 0,4%. Foi uma derrota, para mim, muito difícil, sofrida, naquele momento", relembrou ela em 2008, em depoimento gravado para a Fundação Mário Covas, que preserva a história do político. "A eleição foi muito conturbada, muito manipulada. Mexeram na pesquisa, né?"

A pesquisa Datafolha mostrava Maluf no topo e os demais candidatos tecnicamente empatados dentro da margem de erro, com Francisco Rossi (PDT) à frente, seguido por Covas e Marta. A margem, porém, foi ignorada por parte dos veículos que divulgaram os números.

O PT sustentou na época que isso prejudicou sua postulante, já que eleitores fiéis ao partido teriam optado por dar um voto útil para colocar Covas, e não Rossi, no segundo turno.

Em 2000, Marta enfrentou na briga pela prefeitura outro nome do PSDB, o então vice-governador Geraldo Alckmin (que terminou em terceiro lugar). Na campanha, ela chegou a acusar Covas de usar a máquina para beneficiar indiretamente o tucano veiculando propagandas da gestão estadual.

Em outro momento, mereceu o apoio do governador depois que um grupo de manifestantes atirou ovos na direção dela durante um encontro em Guaianases (zona leste). "Quem joga um ovo pode jogar uma pedra. Acho isso deplorável e que prejudica a democracia", reagiu ele.

Com o quadro mais pacificado, em outubro, uma cena histórica: Marta chorou e beijou o rosto do cacique do PSDB após ele declarar que votaria nela. Ele disse querer "impedir que alguém desqualificado" como Maluf fosse prefeito. E, para conseguir comparecer à urna, adiou uma internação para operar um tumor.

Quando Mário Covas morreu de câncer, em 2001, a ex-rival e ex-aliada afirmou que ele faria "muita falta no quadro político nacional e mais ainda no partido dele". Em 2016, por ocasião de uma homenagem no Senado, ela, como congressista, exaltou a "capacidade de diálogo" do tucano.

Marta Suplicy beija o então governador Mário Covas em ato no qual ele anunciou apoio a ela na eleição para a Prefeitura de São Paulo, em 2000; à esq., o então candidato a vice-prefeito Hélio Bicudo e, à dir., o então vice-governador Geraldo Alckmin, candidato do PSDB derrotado na disputa municipal - Ed Viggiani - 24.out.2000/Folhapress

Procurados, nem Marta nem Bruno Covas quiseram comentar o atual momento.

O nome para a vaga de vice é considerado estratégico por integrantes da campanha, que têm ressalvas à eventual escolha de Marta. Embora ela seja vista como uma figura que poderia angariar votos especialmente na periferia, seu passado de 33 anos no PT é tido como ponto negativo.

Desde 2019, a ex-senadora propaga a tese de que setores democráticos devem se dar as mãos para combater retrocessos promovidos no plano federal por Jair Bolsonaro (sem partido). Ela defende essa "frente ampla" como ensaio de uma concertação nacional contra a reeleição do presidente.

A possibilidade de que ela se lance candidata a prefeita pelo Solidariedade, partido presidido pelo deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SP), é mínima. Marta já indicou que, ainda que seu nome não conste na chapa de Covas, ela topa participar da campanha como colaboradora.

PRINCIPAIS PRÉ-CANDIDATOS À PREFEITURA DE SÃO PAULO

  • Andrea Matarazzo (PSD)
  • Arthur do Val (Patriota)
  • Bruno Covas (PSDB)
  • Celso Russomanno (Republicanos)
  • Eduardo Jorge (PV), com Roberto Tripoli (PV) como vice
  • Filipe Sabará (Novo), com Marina Santos (Novo) como vice
  • Guilherme Boulos (PSOL), com Luiza Erundina (PSOL) como vice
  • Jilmar Tatto (PT)
  • Joice Hasselmann (PSL)
  • Levy Fidelix (PRTB)
  • Márcio França (PSB), com Antônio Neto (PDT) como vice
  • Marcos da Costa (PTB)
  • Orlando Silva (PC do B)
  • Vera Lúcia (PSTU)
  • A Rede Sustentabilidade anunciou que irá lançar uma candidata
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