Descrição de chapéu Folhajus

Investigação contra Paes vira denúncia em 48 dias, após ficar três anos parada no STF

Ex-prefeito do Rio foi acusado de caixa 2 na reeleição, em 2012; ele atribui acusação a tentativa de interferência na atual disputa

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Rio de Janeiro

Praticamente parada havia três anos no STF (Supremo Tribunal Federal), a investigação eleitoral contra o ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes (à época no MDB, hoje no DEM) pela prática de caixa dois levou 48 dias para se transformar numa denúncia sob acusação de corrupção e falsidade ideológica eleitoral.

No intervalo entre 1º de julho, data da instauração do procedimento no Ministério Público, e o oferecimento da denúncia, em 17 de agosto, foram ouvidas 12 testemunhas, além da obtenção de provas de corroboração compartilhadas por outros órgãos.

Parte das diligências realizadas foi solicitada “em regime de urgência” pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.

Candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, Paes foi denunciado pela prática de caixa dois sob acusação dos crimes de corrupção e falsidade ideológica eleitoral.

Os promotores afirmam que o ex-prefeito recebeu R$ 10,8 milhões não declarados na campanha de 2012 da Odebrecht. A Justiça Eleitoral aceitou a acusação e transformou o ex-prefeito em réu.

Ele classificou a acusação e a busca e apreensão realizada em sua casa no último dia 8 como um tentativa de interferência na eleição municipal.

“Às vésperas da eleição meus adversários vêm se utilizar de instrumentos da Justiça para me associar a coisas erradas. Me causa muita estranheza que uma história de oito anos atrás seja explorada às vésperas de um processo eleitoral”, disse Paes.

O Ministério Público do Rio de Janeiro afirmou, em nota, que as diligências do caso "seguiram seu curso regular e, quando concluídas, culminaram no oferecimento da denúncia".

A demora para a conclusão do inquérito se deveu ao tempo em que o procedimento permaneceu no STF (Supremo Tribunal Federal), bem como as discussões jurídicas em torno do caso. O inquérito foi aberto em abril de 2017 após a delação dos executivos da empreiteira. Desde então, o procedimento teve um andamento acidentado.

Inicialmente, o ministro Marco Aurélio, relator, decidiu dividir as investigações, enviando as menções a Paes para a Justiça Federal no Rio de Janeiro, mantendo a apuração sobre Pedro Paulo no STF. A decisão foi revista pela 1ª Turma do STF em setembro de 2017.

Uma série de recursos foram interpostos pelas defesas dos dois investigados. A Procuradoria-Geral da República calculou em 26 os incidentes processuais no período, tendo o inquérito ficado apenas dois meses com a Polícia Federal, sem a realização de nenhuma diligência.

O debate sobre o destino da investigação foi levada a plenário em março de 2019, quando os ministros entenderam que o Código Eleitoral é claro ao definir que cabe aos juízes eleitorais processar os crimes eleitorais e também os crimes comuns —como corrupção— que lhes forem conexos. O acórdão da decisão só foi publicado em agosto do ano passado.

Apesar da decisão tomada, o ministro Marco Aurélio só determinou o enviou o caso à Justiça Eleitoral em 19 de fevereiro de 2020 após questionamento da Folha sobre o motivo do inquérito permanecer no gabinete do STF.

O inquérito chegou ao Tribunal Regional Eleitoral fluminense em 6 de maio. Após a juntadas de todas as peças, o MP-RJ instaurou em 1º de julho o procedimento para apuração dos fatos.

Os promotores ouviram de novo todos os delatores —quatro funcionários da Odebrecht, o marqueteiro Renato Pereira, o operador financeiro Álvaro Novis que organizava as entregas de dinheiro. Também identificaram e colheram depoimento de seis empregados de Novis, que confirmaram as entregas dos recursos para campanha de Paes.

“Em regime de urgência”, o MP-RJ também solicitou perícias realizadas pela força-tarefa da Lava Jato em Curitiba no sistema em que a Odebrecht controlava o repasse de recursos ilegais. Obtiveram também o compartilhamento das guias de controle das entregas feitas pelos funcionários de Novis, documentos obtidos por meio de busca e apreensão sem acordo de delação premiada.

As provas documentais acumuladas nos 48 dias ajudaram a corroborar, para os promotores, os depoimentos que convergiam para a versão de que Paes obteve recursos ilegais da Odebrecht para sua campanha de reeleição em 2012.

A denúncia oferecida não reúne todos os fatos apontados pelos executivos da Odebrecht em delação.

O MP-RJ mantém apuração aberta sobre pagamento de suposto caixa dois ao deputado federal Pedro Paulo na eleição de 2010, pago pela Odebrecht a mando de Paes. Há ainda um procedimento para investigar o suposto envio de recursos ilegais da empreiteira a aliados do ex-prefeito.

Além disso, um suposto pagamento de US$ 5,75 milhões em duas contas no exterior foi enviado para a Justiça Federal para apuração de crime comum, como evasão de divisas. O juiz eleitoral Flávio Itabaiana entendeu que não ficou comprovado o vínculo deste repasse com a campanha de reeleição.

Em vídeo publicado em suas redes sociais, Paes afirmou que é vítima de uma novo uso das instituições da Justiça como forma de influenciar a disputa eleitoral.

Ele faz referência ao fato de, a três dias do primeiro turno da eleição de 2018, o juiz Marcelo Bretas ter marcado um interrogatório do ex-secretário municipal de Obras Alexandre Pinto. Pela primeira vez após três depoimentos ao magistrado o acusado, que não havia firmado delação premiada, acusou o ex-prefeito de receber propina pagas por empreiteiras.

Réu confesso, o ex-secretário afirmou ainda ter ouvido de Leandro Azevedo, diretor da Odebrecht, que Paes recebia 1,75% de propina sobre o contrato da Transoeste. Delator, o executivo da empreiteira nunca mencionou a propina.

"O senhor Alexandre Pinto, ladrão confesso, no afã de conseguir benefícios penais, agora diz que 'ouviu falar' sobre esta mentira de um dirigente da Odebrecht, às vésperas das eleições. É no mínimo curioso, para não dizer suspeito, que a declaração do senhor Alexandre Pinto tenha ocorrido a três dias do primeiro turno eleitoral, sem oferecer nenhuma prova", disse Paes na ocasião.

O MP-RJ disse, em nota, que as investigações do caso foram feitas "de forma diligente e regular, em respeito aos ditames da lei, como atua com regularidade em todos os seus procedimentos".

"As diligências seguiram seu curso regular e, quando concluídas, culminaram no oferecimento da denúncia", declarou a Promotoria.

O órgão disse ainda que a tramitação do PIC tomou 48 dias porque "os fatos já haviam sido esclarecidos pelos colaboradores, tanto da parte de quem pagou (Odebrecht), quanto de quem recebeu (Renato Pereira) tendo sido necessário apenas a corroboração de tais narrativas com provas independentes (documentos que estavam em poder do MPF e foram solicitados pelo GAECC, e depoimentos dos funcionários da Trans-Expert)".

O MP-RJ disse ainda que há registro de pedido de urgência "em um único ofício, diante do notoriamente elevado volume de demandas direcionadas àquele destinatário, no intuito de que o pedido fosse atendido em tempo razoável, conforme protocolo usualmente adotado em tais casos".

O PIC mostra a expressão em ao menos dois ofícios à força-tarefa da Lava Jato de Curitiba. A urgência também foi solicitada na determinação de oitiva de funcionários da Trans-Expert.

Em relação às declarações de Paes, os promotores disseram que não iriam "comentar declarações do réu". "As manifestações serão prestadas no curso do processo", afirma a nota.

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