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Lava Jato prevê derrotas e anulação de delações com troca na presidência do STF

Apesar de ser defensor da operação, a gestão de Fux pode gerar danos aos julgamentos de casos

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Brasília

A autorização para delatados questionarem colaborações premiadas e uma possível mudança na composição da segunda turma do STF (Supremo Tribunal Federal) podem levar a Lava Jato a sofrer derrotas em série no Supremo.

A avaliação no tribunal e no Ministério Público Federal é que a troca de comando na corte, apesar de o ministro Luiz Fux ser um defensor do trabalho dos investigadores, deve trazer danos a julgamentos relativos à operação.

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Os ministros do STF Marco Aurélio, Dias Toffoli (centro), Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski - Pedro Ladeira - 2.out.2019/Folhapress

Há na corte uma articulação em curso para que o ministro Dias Toffoli, que deixará a presidência do STF nesta quinta-feira (10), assuma o assento do ministro Celso de Mello na segunda turma a partir de novembro. O colegiado é composto por cinco ministros e julga os principais casos relacionados à Lava Jato.

Com a aposentadoria de Celso e a nova formação, Toffoli formaria maioria com os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes para dar decisões contrárias ao trabalho dos procuradores de primeira instância.

Um argumento que tem pesado em favor da mudança é a ideia de preservar o ministro a ser indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para o STF na vaga de Celso.

Como a segunda turma é o órgão natural para o julgamento de recursos do caso das “rachadinhas” do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), o novo integrante do STF não precisaria enfrentar o constrangimento de analisar tema que afete quem o escolheu para a vaga.

A chegada de Toffoli ao colegiado daria ainda mais tração ao movimento de Lewandowski e Gilmar, que têm se juntado há algum tempo para impor reveses ao trabalho da operação.

Como o ministro Celso de Mello está ausente por questões de saúde, os votos de ambos têm sido suficientes para derrotar a Lava Jato. Em julgamento penal o empate favorece o réu, e os votos do ministro Edson Fachin e da ministra Cármen Lúcia acabam sendo derrotados ao divergir dos colegas.

Foi o que aconteceu, por exemplo, na sessão do último dia 25 de agosto, quando, após um 2 a 2, o colegiado anulou, a pedido de pessoas implicadas pelos relatos, a colaboração premiada firmada pelo Ministério Público do Paraná com um ex-auditor fiscal.

Mais do que o caso concreto, a decisão é importante porque cria um precedente que permite a terceiros impugnar delações.

Em 2015, o plenário do STF decidiu que as colaborações só podiam ser questionadas pelas partes signatárias do acordo, ou seja, o Ministério Público e os próprios delatores. Gilmar e Lewandowski, porém, entenderam que em casos de manifesta ilegalidade os atingidos podem acionar o Judiciário.

O julgamento foi concluído com voto de Cármen Lúcia, que havia pedido vista em novembro de 2019. A ministra seguiu a linha de Fachin ao afirmar que o plenário da corte já definiu que terceiros não podem questionar as delações.

Gilmar, porém, sustentou que o cenário do caso é repleto “de abusos e desconfiança na atuação das partes envolvidas no acordo” e justifica a revisão judicial.

A decisão animou advogados de investigados na Lava Jato. Na visão deles, o entendimento firmado abre brecha para todos alvos da operação procurarem a Justiça em busca da anulação de delações que os implicaram.

Em casos em que os ministros entenderem que houve ilegalidade no acordo, a tendência ainda é que os delatores mantenham os benefícios, baseado no princípio da boa fé da negociação que haviam fechado com o Ministério Público.

Além disso, a esperança dos advogados é que, uma vez confirmada a nova formação na segunda turma, com maioria crítica à operação, o colegiado também reveja outras decisões da Lava Jato contestadas pela ala garantista do direito.

A ida de Toffoli para o colegiado que revisa as principais investigações contra políticos, porém, depende de outros fatores. Ao deixar a presidência da corte, ele passará a ocupar o lugar de Luiz Fux na primeira turma do tribunal.

Em 1º de novembro, contudo, o ministro Celso de Mello irá se aposentar. Quando um assento fica vago, o integrante mais antigo da turma que está completa pode pedir para mudar para o outro colegiado.

Nesse caso, a prioridade para solicitar a substituição caberia ao ministro Marco Aurélio. O magistrado, porém, é um crítico histórico da dança das cadeiras nas turmas do STF e nunca exerce o direito de trocar a primeira pela segunda turma.

Assim, caso Marco Aurélio mantenha a mesma posição de sempre, a prioridade passará para Toffoli, segundo mais antigo. Nos bastidores do tribunal, a avaliação é que esse cenário serviria para evitar o constrangimento de o ministro a ser indicado por Bolsonaro analisar recursos contra a investigação sobre suposto esquema de desvio de salários no gabinete de Flávio Bolsonaro quando deputado estadual.

A estratégia seguiria o histórico do Supremo de tentar preservar o novo integrante do tribunal. Isso ocorreu, por exemplo, com o ministro Alexandre de Moraes, que foi indicado para o STF pelo então presidente Michel Temer, que era alvo da Lava Jato.

Ele entrou na vaga do ministro Teori Zavascki, morto em um acidente de avião em janeiro de 2017. Os ministros consideravam ruim para a imagem do Supremo deixar Moraes no colegiado que poderia vir a julgar seu ex-chefe e ex-colegas de governo.

Foi nesta ocasião que o ministro Edson Fachin mudou-se para a segunda turma e acabou sendo sorteado relator da Lava Jato em substituição a Teori. Moraes, por sua vez, assumiu o assento de Fachin na primeira turma.

Caso o cenário se confirme, a troca de comando do STF, que chegou a ser vista como uma esperança para a Lava Jato, uma vez que Fux é um dos maiores defensores da operação, pode ter o efeito contrário.

Além da ida de Toffoli para a segunda turma, o poder de pauta do presidente está esvaziado devido à ampliação do plenário virtual instituída por Toffoli.

Agora, os ministros podem levar processos a julgamento no meio on-line sem depender do presidente do Supremo, responsável por determinar a pauta do plenário físico, que atualmente se reúne por videoconferência.

Além da posição em favor da Lava Jato nos julgamentos, a proximidade de Fux com a operação se tornou evidente no episódio da Vaza Jato revelado pelo site The Intercept Brasil.

Em uma das conversas de Deltan Dallagnol, que chefiava a força-tarefa da operação, com o então juiz Sergio Moro, ambos deixaram claro que o magistrado do Supremo era uma das esperanças para as investigações na corte.

Logo após a abertura do processo de impeachment contra a então presidente Dilma Rousseff (PT), eles conversaram sobre o cenário interno no Supremo.

“[Fux] disse para contarmos com ele para o que precisarmos, mais uma vez. (…) Os sinais foram ótimos. Falei da importância de nos protegermos como instituições. Em especial no novo governo”, relatou Deltan. Moro respondeu: “Excelente. In Fux we trust”.

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