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STF

Poder presidencial, politização e filtro falho do Senado são entraves em nomeações ao STF

Questão central tem sido a inapetência do Senado em exercer prerrogativa constitucional de servir como filtro genuíno

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Felipe Kotait Buchatsky

Acadêmico da FGV Direito SP

São Paulo

O papel cada vez mais central assumido por cortes constitucionais nas últimas décadas traz ao debate público o tema da sucessão de cargos nestes órgãos. A perda de Ruth Ginsburg, juíza da Suprema Corte americana reconhecida pela defesa intransigente dos direitos das mulheres, reacendeu este debate em ano eleitoral.

Por sua vez, o anúncio da aposentadoria do ministro Celso de Mello abre discussão sobre quem o sucederá e recoloca questões sobre qual seria o melhor modelo de escolha dos ministros do Supremo Tribunal Federal.

As críticas no Brasil aludem, sobretudo, à suposta politização da escolha e ao demasiado poder presidencial conferido.

O presidente Jair Bolsonaro comunicou a ministros do STF que já escolheu um nome para a vaga de Celso na corte: o juiz federal Kássio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

O presidente Jair Bolsonaro e então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em dezembro de 2019
O presidente Jair Bolsonaro e então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, em dezembro de 2019 - Pedro Ladeira/Folhapress

O caráter político de uma corte constitucional é intrínseco ao seu desenho institucional.

Responsável por assegurar a supremacia da Constituição, uma norma jurídica de textura muito aberta, e solucionar conflitos entre elites políticas que não puderam dirimir controvérsias nas arenas legislativa e executiva, as ações desses tribunais sempre terão uma dimensão política.

Após estudo comparado em todas as 79 democracias estabelecidas entre 1974 e 2012, foi possível constatar que, em todas elas, autoridades políticas participam da seleção de juízes constitucionais.

Todavia as formas de participação variam se considerarmos que diferentes atores políticos, integrantes dos Três Poderes ou de outras instituições do Estado, influenciam a seleção.

Mesmo quando admitida a participação popular, tal como na Argentina, a atuação está condicionada ao espaço decisório do Executivo e do Legislativo.

A contribuição dos atores no processo de escolha também varia: de um lado, estão os que indicam e os que taticamente vetam uma nomeação; de outro, os que meramente participam da pré-seleção de nomes viáveis ou emitem opiniões públicas acerca da nomeação.

No que tange à concentração de poder, o modelo brasileiro dá ao Executivo o poder de escolha e ao Legislativo o poder de veto, buscando garantir freios e contrapesos no processo de seleção de juízes da mais alta corte.

Assim, o Brasil se assemelha a 43% das novas democracias, que conferem de um a dois Poderes a atores políticos na escolha dos magistrados. Apenas 5% das novas democracias possuem modelos mais participativos, conferindo cinco ou seis poderes no processo de escolha.

Vice-presidente do TRF1, desembargador federal Kassio Nunes Marques
Vice-presidente do TRF1, desembargador federal Kassio Nunes Marques - Samuel Figueira/TRF 1ª Região

Na Sérvia, por exemplo, um terço dos 15 juízes é escolhido pela Assembleia Nacional, a partir da pré-seleção de 10 nomes pelo presidente da República. Este, por sua vez, escolhe um terço dos membros, a partir de lista decupla elaborada pela Assembleia.

O último terço é preenchido pela Suprema Corte de Cassação, dentre 10 indicados pelos conselhos da Magistratura e da Procuradoria em sessão conjunta.

Apesar das críticas ao modelo bifásico do Brasil, a proposta de inclusão de atores como Judiciário, Ministério Público e Ordem dos Advogados do Brasil não reduziria a politização do processo. Apenas aumentaria a influência de interesses corporativistas na composição do STF.

Mais transparência e controle social ao processo de nomeação para o Supremo seriam bem-vindos, como por exemplo fizeram os argentinos, de modo a mitigar a concentração de poder nas mãos do presidente.

A questão central no caso brasileiro tem sido a inapetência do Senado em exercer a sua prerrogativa constitucional de servir como filtro genuíno para a aceitação de indicados à missão suprema de guardar a Constituição. O que a sociedade precisa cobrar é que o Senado cumpra a sua tarefa.

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