Descrição de chapéu Os Nós de São Paulo

Repeteco de enchentes, reciclagem empacada e 47 dias para tapar buraco são gargalos para prefeito de SP

Zeladoria está entre as demandas da população que desafiarão Covas em seu novo mandato

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São Paulo

Muitos prefeitos paulistanos já buscaram fazer da zeladoria sua vitrine. Nas campanhas eleitorais, no entanto, dificilmente escapam de ver o assunto usado como vidraça pelos opositores.

O excesso de buracos nas ruas, a sujeira espalhada e a espera por serviços como poda de árvores são queixas que se repetem em seguidas gestões, mesmo as que aumentaram os investimentos, e têm encontro marcado com Bruno Covas (PSDB), reeleito em novo mandato neste domingo (29).

O tempo médio para a prefeitura tapar um buraco, por exemplo, chega a 47 dias —ainda que tenha havido redução nos últimos anos e ele já tenha superado quatro meses.

Nós de SP - Ilustração sobre zeladoria
Carolina Daffara

Outro gargalo imediato para quem estiver no comando da cidade de São Paulo a partir de janeiro de 2021 são as enchentes, agravadas pelos pontos viciados de lixo e que se repetem há décadas, especialmente no período do verão.

Há ainda necessidade de avanço em áreas nas quais São Paulo, mesmo sendo a cidade mais rica do país, está atrás de capitais mais pobres, como a reciclagem, setor em que o município está empacado.

Antes da pandemia da Covid-19 a cidade vinha com as contas confortáveis, que permitiam uma política de aumento do gasto nesta área. Mas, em um cenário de crise acentuada e possível perda de arrecadação no próximo ano, pode ser difícil manter o mesmo patamar de gastos que possibilitou melhora em alguns dos índices.

A série da Folha "Os nós de São Paulo" apresenta uma radiografia de desafios em diversas áreas sob responsabilidade do prefeito eleito para comandar a capital paulista a partir de janeiro de 2021. Com discussões que devem ser tratadas na campanha eleitoral, as reportagens poderão ser consultadas em folha.com/nosdesaopaulo.

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Quais são as principais demandas na área da zeladoria na cidade de São Paulo? Os serviços de zeladoria figuram historicamente entre os mais solicitados no portal 156, da Prefeitura de São Paulo, por meio do qual são recolhidas as demandas da população.

As atividades de zeladoria incluem, de maneira geral, toda a manutenção da cidade, indo da limpeza às condições do asfalto, poda de árvores e cuidado com praças.

No segundo trimestre deste ano, esses serviços só perdiam para demandas relacionadas à pandemia da Covid-19 e aos moradores de rua.

Em quarto na lista, os de tapa-buraco representavam 5% das solicitações, seguidos pelos de manejo de árvores (3%) e retirada de grandes objetos (3%).

Que setor da prefeitura cuida dessa área? A maioria das ações de zeladoria está a cargo da Secretaria das Subprefeituras. As subprefeituras são as 32 administrações regionais, que têm entre suas funções a de zelar por cada uma das regiões. Isso inclui serviços de recapeamento, arrumação de calçadas, cuidado com praças.

As subprefeituras, porém, sofrem um processo de loteamento político. Muitos funcionários ligados a vereadores, alguns deles sem experiência na área, já assumiram, nas mais diferentes gestões, cargos de chefia nas regionais.

A Amlurb (órgão que cuida da limpeza e coleta de lixo) também é subordinada à pasta das Subprefeituras, além do setor que cuida da iluminação pública.

Como a atual gestão lidou com a questão? ​A zeladoria foi um dos grandes motivos de ataque do então candidato a prefeito João Doria (PSDB) contra Fernando Haddad (PT) na eleição de 2016. Após ser eleito, Doria até se vestiu de gari no início mandato, mas parte dos índices não melhorou naqueles primeiros meses.

Mais tarde, ele voltou à carga apostando na zeladoria como bandeira para se eleger governador. Uma de suas principais vitrines foi um programa de asfaltamento das ruas da cidade, o Asfalto Novo.

No primeiro ano de mandato do tucano, o asfaltamento pulou de 77,7 km, em 2016, para 171,5 km no ano seguinte. O período também foi marcado por alto gasto em publicidade para divulgar o programa.

O prefeito Bruno Covas (PSDB) seguiu o mesmo caminho na tentativa de se reeleger. Ele dobrou a previsão de gastos para zeladoria para 2020, chegando a R$ 3 bilhões.

O serviço de tapa-buraco aumentou nos últimos anos, passando de 136 mil reparos em 2013 para 250 mil em 2017. Os números começaram a cair em 2018 (230 mil) e 2019 (186 mil).

De janeiro a julho, em meio à pandemia, houve diminuição da média mensal, atingindo apenas 83 mil até julho. A prefeitura sustenta, porém, que diminuiu a média de espera de 130 dias, em 2017, para 47 dias. O estoque, diz o município, também caiu de 11.349 para 2.244.

As toneladas de lixo varridas também vêm minguando ao longo dos anos, mas a prefeitura costuma alegar inúmeros fatores para isso, que vão desde o desaquecimento da economia até a redução dos chamados pontos viciados, que entram na conta. Em 2016, foram recolhidas 91,7 mil toneladas, contra 79,6 mil no ano passado.

O que são os pontos viciados? São áreas da cidade em que há despejo regular de lixo e entulho, que tomam calçadas e algumas vezes chegam a interditar a passagem de veículos. Parte importante desse lixo vem de despejo irregular de material de construção. Há, inclusive, quadrilhas especializadas nesse tipo de atividade ilegal.

Segundo dados oficiais, esses locais para despejos caíram de 4.000, em 2016, para 2.314, no fim do ano passado. No entanto, há sempre surgimento de novos pontos, tornando a eliminação deste tipo de sujeira a mais difícil para os prefeitos.

Na região central, a grande quantidade de pontos viciados afeta a qualidade de vida da população, atraindo pragas como ratos e prejudicando a acessibilidade das calçadas.

De quem é a responsabilidade de cuidar das calçadas? Segundo a pesquisa Origem e Destino do Metrô de São Paulo, as viagens a pé representam 31% dos deslocamentos na cidade, ou 12,8 milhões de viagens/dia.

Apesar disso, cuidar das calçadas é de responsabilidade de donos dos imóveis, segundo a legislação municipal. Vários especialistas, porém, afirmam que isso faz com que um importante modal de transporte, o das viagens a pé, seja negligenciado.

Há na cidade 68 milhões de m² de calçadas. Segundo a prefeitura, aproximadamente 16% são de responsabilidade municipal —o que inclui áreas como os calçadões do centro, por exemplo.

Pela lei, as calçadas devem seguir regras como manter um tamanho mínimo de 1,20 metro. A lei que impõe multas sobre o assunto mudou bastante nos últimos anos e muitas vezes as multas acabam sendo questionadas judicialmente. A fiscalização falha, no entanto, permanece um problema, uma vez que a equipe das subprefeituras é reduzida.

No entanto, a prefeitura afirma que fará obras em calçadas prioritárias, onde há maior circulação de pessoas. Segundo a gestão, 1,5 milhão de m² de calçadas receberão melhorias até o final do ano, com investimento de R$ 200 milhões.

A atual gestão afirma que reformou 354.148 m² de calçadas no ano passado, um aumento de 217% em relação ao ano anterior.

Qual assunto de zeladoria mais incomoda os paulistanos? De acordo com relatório de reclamações à Ouvidoria municipal, o principal problema são serviços relacionados às árvores na cidade. No balanço fechado de 2019, de 17,1 mil reclamações, 3.200 eram ligadas a esta área.

O prazo para a realização do serviço de avaliação e poda de árvore era de 120 dias. Impulsionadas pela demora, surgiram quadrilhas especializadas na retirada clandestina dos espécimes.

No entanto, uma lei que entrou em vigor em 2020 passou a possibilitar que a população pagasse por serviços particulares sem ter que esperar pelo serviço público, com dez dias como prazo para a resposta. O preço médio da poda via particular é de R$ 1.500 e da retirada, de R$ 2.000. Desde a aprovação da lei, segundo a prefeitura, foram realizadas cerca de 850 podas de árvores em áreas particulares.

Apesar das reclamações, segundo dados da prefeitura, houve aumento no número de árvores podadas em 2019. Os serviços passaram de 89.668, em 2018, para 117.856, uma variação de 31%. Neste ano, já foram 102.810 árvores podadas.

Como está a situação do lixo reciclável na cidade? A coleta seletiva em São Paulo está muito abaixo esperado. Cerca de 40% dos resíduos gerados pelos paulistanos poderiam ser reciclados, mas o número fica em torno de 7%, em estimativa da própria prefeitura.

Nos anos da atual gestão, a quantidade de material reciclável permaneceu estagnada e chegou até a ter uma queda em 2018, de 13%.

A quantidade de lixo reciclado vinha tendo altas significativas nas últimas gestões, mas acabou parando em cerca de 80 mil toneladas por ano, marca do ano passado, na administração atual.

Em ranking feito em 2017, a capital paulista amarga o décimo lugar, atrás de Maceió (AL), segundo a Abrelpe (associação de empresas de limpeza).

A gestão Covas argumentou que os motivos para o desempenho são a concorrência com catadores e empresas irregulares que surgiram durante a crise econômica, além da queda de produção causada devido à economia desaquecida.

Embora a meta ainda não tenha sido cumprida, a prefeitura avalia que conseguirá comprir o objetivo de alcançar 100% dos distritos com 100% de atendimento de coleta.

Hoje em dia, a cidade tem duas modernas centrais de triagem que operam com metade da sua capacidade. O resultado é que a meta da prefeitura de reduzir em 500 mil toneladas por ano o lixo que vai para aterros dificilmente será cumprida. No ano passado, 3,6 milhões de toneladas foram despejadas em lixões.

Atualmente, a unidade pública que recebe os dejetos só tem condições de aguentar cerca de uma década.

Especialistas afirmam que a melhora do índice de reciclagem também passa por estimular a logística reversa junto às empresas, por meio de acordos setoriais.

Por que não se resolve o problema das enchentes em São Paulo? A expansão da cidade de São Paulo, desordenada e que resultou na impermeabilização do solo, torna as enchentes uma das principais dores de cabeça de qualquer prefeito.

As enchentes são agravadas por fatores históricos de expansão desordenada da cidade próxima das margens dos rios e pela redução de áreas verdes, mas influenciadas também por problemas pontuais, como excesso de lixo nas ruas e bueiros entupidos.

Entre medidas defendidas por especialistas, além dos tradicionais piscinões, estão manutenção de córregos e galerias e medidas simples como recuperação de margens dos rios.

Caras e com pouca visibilidade, as intervenções contra enchentes da cidade de São Paulo acabam sendo adiadas por várias gestões. Há obras atrasadas em vários córregos da cidade, algumas delas prometidas até na gestão anterior, conforme a Folha noticiou.

A prefeitura promete, porém, a entrega de algumas delas até o fim deste ano. É o caso de reservatórios na Aricanduva, zona leste, ponto histórico de alagamentos na cidade. Já o piscinão do Taboão, naquela mesma região, só deve ser totalmente finalizado em 2021.

Algumas delas estão prometidas há vários anos e também podem continuar na lista de tarefas do próximo prefeito, como obras na região do córrego Zavuvus, na zona sul, que ficaram suspensas após o TCU (Tribunal de Contas da União) apontar falhas nos contratos em 2017 e foram retomadas em 2019.

Neste ano, de R$ 784 milhões orçados para saneamento, apenas R$ 299 milhões haviam sido gastos no fim de agosto.

Regiões como o Jardim Pantanal e Jardim Romano, ambos no extremo leste, enfrentam problema crônico de enchentes que, às vezes, podem durar mais de uma semana.

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