Witzel diz à Assembleia que impeachment é ação nacional para pulverizar oposição a Bolsonaro

Defesa de governador afastado do RJ pediu oitiva de subprocuradora-Geral da República que teve relação com família presidencial questionada

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Rio de Janeiro

Em defesa apresentada à Assembleia Legislativa do Rio no âmbito de seu processo de impeachment, o governador afastado Wilson Witzel (PSC) sugeriu, em três passagens distintas, ser vítima de uma perseguição política por fazer oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O ex-juiz também se debruçou sobre argumentos jurídicos para afirmar que não há provas que embasem o processo e que os supostos atos ilícitos não foram delimitados nas denúncias que tiveram prosseguimento na Casa.

O documento, apresentado na noite de quarta-feira (2), pede que a Assembleia faça os devidos esclarecimentos e conceda novo prazo para manifestação da defesa.

O afastamento de Witzel foi confirmado também na quarta-feira pela corte especial do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

O ex-juiz foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República), que o acusa de ter chefiado um esquema de desvio de recursos públicos destinados ao combate à pandemia do novo coronavírus no estado do Rio.

Em nota, a Assembleia afirmou que começou a contar nesta quinta-feira (3) o prazo de cinco sessões para que o relator da comissão do impeachment, deputado Rodrigo Bacellar (SDD), apresente seu parecer a respeito da admissibilidade da denúncia contra o governador afastado.

Nos bastidores, a expectativa é que esse parecer seja colocado para votação no plenário em cerca de 15 dias.

Segundo a Assembleia, a denúncia será aceita se a maioria qualificada, ou seja, dois terços dos 70 deputados, votarem a favor. Nesse caso, o afastamento temporário de Witzel seria confirmado mais uma vez –agora, pelos deputados.

A decisão dos parlamentares é importante porque abre caminho para o afastamento definitivo. O julgamento final é realizado por um tribunal misto, composto por deputados estaduais e desembargadores. São eles que decidem se Witzel será ou não afastado definitivamente.​

No início do documento apresentado à Assembleia, a defesa afirma que existe um "intento político de afastar o governador democraticamente eleito", replicado em outros estados do país.

"Essa pretensão se insere dentro de um movimento mais amplo, e concertado, com vistas a remover, no âmbito de vários estados federados (AM, PA, SC), por meio de processos análogos de impeachment, governos locais de oposição ao governo federal", afirma.

Poucas páginas depois, os advogados reforçam a acusação, dizendo que o processo de impeachment contra Witzel segue uma agenda política "bem própria e peculiar".

"Ela se alinha ao fluxo de um movimento mais amplo e concertado, de âmbito federal, de pulverização da oposição", diz o texto.

Em outra passagem, a defesa nega que o inquérito aberto contra o governador no STJ (Superior Tribunal de Justiça) tenha tido como base elementos apurados por órgãos de investigação no Rio.

Os advogados apontam que a origem foi, na verdade, uma "denúncia" levada à PGR (Procuradoria-Geral da República) pelo deputado federal Otoni de Paula (PSC), aliado de Bolsonaro.

A peça também afirma que a denúncia foi acompanhada de "recortes de jornais", sem provas do envolvimento do governador em atos ilícitos.

"O que motivou a abertura da referida investigação foi uma 'denúncia' levada diretamente à douta Procuradoria Geral da República pelo deputado federal Otoni de Paula, parlamentar que faz forte oposição política ao denunciado e que é da 'tropa de choque' do presidente da República, declarado adversário político do denunciado."

No documento, Witzel também pede a produção de prova testemunhal, para esclarecer os fatos narrados nas denúncias, e pericial contábil, para apurar eventual irregularidade nos pagamentos suspeitos.

A expectativa da defesa é que as testemunhas sejam ouvidas pela comissão do impeachment, antes da votação da admissibilidade da denúncia no plenário.

Entre as oitivas requeridas pelo governador afastado, está a da subprocuradora-Geral da República, Lindôra Araújo, a quem Witzel desafiou em entrevista à imprensa após ser retirado do cargo.

Na última sexta-feira (28), o ex-juiz questionou a suposta proximidade entre Lindôra e a família Bolsonaro.

"Uma procuradora cuja imprensa já notificou seu relacionamento próximo com a família Bolsonaro. Bolsonaro já declarou que quer o Rio de Janeiro. Já me acusou de perseguir a família dele. Mas, diferentemente do que ele imagina, aqui a Polícia Civil é independente, o Ministério Público é independente", disse Witzel.

Na seara jurídica, o governador afastado argumenta que não poderia ter sido afastado por decisão monocrática do ministro Benedito Gonçalves, do STJ.

Isso porque a constituição estadual do Rio prevê o afastamento do governador somente após recebimento da denúncia, no caso das infrações penais –e a denúncia ainda não foi recebida pela corte.

Witzel é acusado pela PGR de ter utilizado o escritório da primeira-dama, Helena Witzel, para lavar dinheiro da propina paga por empresários beneficiados pelo suposto esquema de corrupção em seu governo, como Mário Peixoto.

No texto apresentado à Alerj, o ex-juiz volta a afirmar que não se pode criminalizar a advocacia. Ele também diz que a relação da mulher com os clientes citados pelo Ministério Público é anterior a sua posse, "o que será provado no momento oportuno".

"O fato de o escritório da esposa do denunciado prestar serviços para empresas supostamente vinculadas a Mário Peixoto [...] não tem o condão, por si só, de configurar exercício ilegal da profissão, menos ainda de suposto ato ímprobo praticado pelo denunciado."

Os advogados também insistem que não há provas nas denúncias da Assembleia e da PGR de que ele tenha participado de atos de improbidade na administração estadual.

"Sem provas mínimas carreadas num processo formal, não há como deputados motivarem seu voto [...] Mas o fato é que já o fizeram. O processo então é nulo", diz o texto.

Witzel afirma, ainda, que a Casa não apontou diretamente os atos ilícitos pelos quais está sendo acusado, o que impediria a ampla defesa. "Do que ele deverá se defender?", questionam os advogados.

"Qual, efetivamente, a improbidade por ele praticada? Qual, mais especificamente, o ato desonesto por ele cometido? [...] E a prova? Qual ganho ilícito, enfim, teria sido auferido pelo denunciado contra o interesse público?"

A defesa sustenta que a falta de provas nas denúncias encaminhadas pela Assembleia é um reflexo da igual ausência de lastro probatório no inquérito em curso no STJ, adjetivado pelos advogados como "embrionário".

Diz, ainda, que a denúncia do Ministério Público é baseada em presunções e que o ex-secretário de Saúde Edmar Santos não apresentou em sua delação premiada provas do envolvimento do governador afastado em ilícitos.

Também lembra que o Ministério Público do estado do Rio não encontrou indícios de participação de Witzel no esquema de corrupção.

"Não é crível que o denunciado tenha completo 'domínio' de todos os meandros das complexas e numerosas contratações de suas inúmeras secretarias."

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