Descrição de chapéu STF

Bolsonaro anuncia indicação de Kássio Nunes para vaga de Celso de Mello no STF

Sob pressão, presidente confirma escolha, diz que juiz federal é 'família' e que próximo posto será de evangélico

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou nesta quinta-feira (1º) que escolheu indicar o juiz federal Kássio Nunes Marques, 48, para ocupar a vaga que será deixada pelo ministro Celso de Mello no STF (Supremo Tribunal Federal), no próximo dia 13.

A confirmação da indicação foi dada pelo próprio presidente em sua live semanal.

"Sai publicado amanhã [nesta sexta-feira, dia 2], no Diário Oficial da União, por causa da pandemia, temos pressa nisso, conversado com o Senado, o nome do Kássio Marques para a nossa primeira vaga no Supremo Tribunal Federal", disse Bolsonaro na transmissão feita do Palácio da Alvorada.

Ele disse que a segunda vaga será destinada a um evangélico e afirmou que os ministros da Justiça, André Mendonça, e da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge de Oliveira, cotados para o cargo, "estão na fita".

O juiz federal Kassio Nunes Marques, escolhido por Bolsonaro para ocupar a cadeira de Celso de Mello no STF - Samuel Figueira/TRF 1ª Região

"Primeiro pré-requisito: tem que ser evangélico, terrivelmente evangélico. O outro: tem que tomar Tubaína comigo. Não adianta chegar um currículo aqui, maravilhoso, [nota] 10, indicado aí por autoridades. Mas se eu não conhecer, não vou indicar. O meu compromisso é com um evangélico", afirmou.

Com a indicação anunciada por Bolsonaro, Kássio deverá passará por uma sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado. Se aprovado, seu nome segue para apreciação do plenário. Se for aprovado por maioria absoluta, é então nomeado pelo presidente da República.

Bolsonaro disse que Kássio "é católico, é família" e que tem "conversado com ele, já conheço ele há algum tempo, já tomou muita tubaína comigo".

"Tenho certeza que vocês vão gostar do trabalho dele no Supremo Tribunal Federal", afirmou.

O presidente disse que tinha sobre sua mesa dez currículos de pessoas sugeridas a ele para assumir a vaga no STF, mas que descartou outros candidatos por falta de contato pessoal.

"Não vou botar uma pessoa só por causa do currículo. Com todo respeito que eu tenho a esta pessoa. Tinha que ter um contato a mais comigo ao longo do tempo", disse Bolsonaro.

Ele também disse que o novo ministro "tem que transitar em Brasília, conhecer gente no Supremo, conhecer o Parlamento". "Eu quero botar uma pessoa lá não é para votar as coisas e perder por 10 a 1 tudo."

Na quarta-feira (30), o presidente surpreendeu a classe política e jurídica ao comunicar ministros do STF sobre seu plano de indicar um nome até então inesperado para a vaga.

Kássio integra o Tribunal Regional Federal da 1ª Região e ganhou o apoio de Bolsonaro com a chancela de caciques de partidos do centrão, representando ainda um gesto ao Nordeste, região onde o presidente sofreu derrota eleitoral em 2018.

Hoje, o Supremo não tem nenhum ministro nordestino. A escolha de Kássio foi influenciada pelos senadores Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Ciro Nogueira (PP-PI), um dos líderes do centrão no Congresso.

Segundo aliados do presidente, na semana passada, Flávio sugeriu ao pai que avaliasse Kássio para o STF. O juiz federal estava em campanha para o STJ (Superior Tribunal de Justiça). Os advogados Frederick Wassef e Willer Tomaz também teriam respaldado a indicação, de acordo com aliados de Bolsonaro e integrantes do Judiciário.

Na última sexta-feira (25), Celso de Mello anunciou que irá antecipar em três semanas sua aposentadoria do STF. Inicialmente, a saída do decano estava prevista para 1º de novembro, quando ele completa 75 anos e se aposentaria compulsoriamente. Mas ele informou que sairá no dia 13 de outubro.

No Legislativo e no Judiciário, a expectativa é de que o Supremo ganhe um reforço no grupo de ministros que costuma impor derrotas à Lava Jato. A aposta é também de que o novo ministro tenha atitude contrária à rescisão da colaboração premiada da JBS, em discussão no STF.​

O escolhido pelo presidente também poderá herdar o acervo de processos de Celso de Mello, o que inclui a investigação contra Bolsonaro por supostas interferências na Polícia Federal, motivada por acusações do ex-ministro Sergio Moro.

Além disso, a escolha passa pela definição da situação jurídica de Flávio. O STF decidirá sobre a concessão de foro especial ao senador. Caso o benefício seja confirmado, poderá ganhar força a tese de anulação das provas colhidas quando a investigação do caso da "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio estava sob responsabilidade do juiz de primeira instância​​​.

A indicação foi elogiada pelo presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz.

"A Ordem dos Advogados do Brasil saúda a indicação do desembargador federal Kássio Nunes Marques para ocupar a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal. O desembargador possui todos os pressupostos constitucionais e uma trajetória honrada e de reconhecida eficiência", escreveu em uma rede social.

O presidente vinha sendo pressionado por aliados e eleitores a recuar da indicação do juiz federal. Desde que o nome do juiz foi anunciado como o favorito do presidente, textos e imagens estão sendo divulgados nas redes sociais associando Kássio ao PT, partido adversário da atual gestão.

As mensagens foram também enviadas ao WhatsApp de Bolsonaro por deputados aliados.​ Durante a live, havia vários comentários no YouTube contra a indicação de Kássio. Bolsonaro reagiu dizendo que "qualquer um que eu indicasse estaria levando tiro" e salientou que a palavra final sobre a escolha é do Senado, que tem que sabatinar o indicado. Kássio já se encontrou pessoalmente com ao menos cinco senadores. Os parlamentares querem que a sabatina ocorra na semana que vem.

"O pessoal bota aqui, fala palavrões e julga as pessoas. E gente séria, gente que enviou o currículo para mim para o candidato dele. Ele escreve lá embaixo estas besteiras. E estas pessoas já foram discriminadas no passado", reagiu o presidente.

"É impressionante como se julga as pessoas e esculhambam com as pessoas de uma hora para a outra, sem comprovação de nada", disse Bolsonaro.

O chefe do Executivo procurou rebater críticas pontuais feitas a Kássio e, numa resposta a seus apoiadores, disse que, até pouco tempo atrás, eles apoiavam que o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, hoje desafeto de Bolsonaro, fosse indicado para a vaga no STF.

"Vocês querem o Sergio Moro para o Supremo? Vocês acham que ele vai ser um ministro que vai ser leal às nossas causas?", indagou.

Pessoas próximas ao juiz federal Kássio Nunes o descrevem como levemente conservador e dizem que, nos últimos dois anos, ele ajustou seu discurso e se alinhou à visão de Bolsonaro em temas de comportamento.

Ele é juiz do TRF-1 desde 2011 e chegou ao cargo nomeado pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), graças à proximidade com caciques políticos do MDB e do PP, incluindo o senador Ciro Nogueira (PP-PI).

Preencheu vaga reservada aos advogados —o quinto constitucional. Recebeu o apoio do então presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Marcus Vinícius Furtado Coelho, e do atual governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), à época chefe da OAB local. Após a indicação da ordem, foi o mais votado em lista tríplice.

Antes do TRF-1, Kássio atuou como juiz do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Piauí, de 2008 a 2011. Neste período, participou do julgamento que aprovou as contas eleitorais de Ciro Nogueira na campanha ao Senado em 2010.

Na ocasião, a Procuradoria Eleitoral apontou irregularidades nas contas do parlamentar —informações não declaradas à Justiça Eleitoral sobre o uso de veículos pela campanha.

Em entrevistas como juiz federal, Kássio já deixou claro que tem visões diferentes da Lava Jato. Para ele, a execução de pena após condenação de segunda instância, que levou o ex-presidente Lula (PT) à prisão, não é automática.

Como a jurisprudência do Supremo de determinar o cumprimento de pena após o fim do processo foi decidida por 6 a 5, a eventual nomeação de alguém contrário a essa tese (caso do ex-ministro Sergio Moro) poderia reverter o entendimento do tribunal a respeito.

Mudar esse entendimento para permitir o cumprimento de pena após decisão de segundo grau daria força novamente à operação. E desagradaria boa parte do mundo político, incluindo caciques do MDB e do PP alvos da Lava Jato.

Foi de Kássio a derrubada de liminar da primeira instância que havia suspendido licitação do STF para a contratação de bufê para o fornecimento de refeições, com menu que incluía lagosta. A compra gerou repercussão negativa, e a decisão de primeiro grau ajudou a desgastar a imagem da corte.

O magistrado tem mestrado na Universidade de Lisboa, onde faz doutorado. Especialistas na área, no entanto, afirmam que ele tem uma carreira acadêmica pouco expressiva.

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