Descrição de chapéu Eleições 2020

Com projeto chamado de eleitoreiro, Covas faz dobradinha com PT para aprovar renda emergencial

Medida passou em primeira votação na Câmara Municipal de SP e prevê R$ 100 para até três pessoas da mesma família

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São Paulo

Com acusações de que a iniciativa é eleitoreira e bate-boca entre vereadores, o projeto de renda básica emergencial avalizado pelo prefeito Bruno Covas (PSDB) começou a ser discutido nesta terça-feira (20) na Câmara Municipal de São Paulo com o apoio do PT, mas sem contemplar o texto original do vereador petista Eduardo Suplicy .

Na semana passada, o tucano candidato à reeleição prometeu uma dobradinha com o petista, defensor histórico da bandeira, ao sinalizar via redes sociais que apoiaria a aprovação de um texto, protocolado por Suplicy no Legislativo em abril, que liberaria o pagamento por causa da pandemia do coronavírus.

Nesta terça, a prefeitura surpreendeu o PT ao apresentar um substitutivo (novo texto) de um projeto de lei sobre o tema enviado pelo Executivo em 2016, na gestão Fernando Haddad (PT). A versão encaminhada para votação desidratava a proposta original e restringia o benefício a um período de três meses.

O projeto foi aprovado em primeira votação com 39 votos favoráveis e 2 contrários. Pelo acordado até o momento, até três pessoas da mesma família poderão receber R$ 100 por três meses, que posteriormente poderiam ser prolongados.

Durante a sessão, Suplicy usou as redes sociais para cobrar Covas e o presidente da Câmara e aliado do prefeito, Eduardo Tuma (PSDB), sobre o descumprimento da promessa. "Infelizmente não é isso [o projeto do petista, endossado por outros vereadores] que está sendo votado", reclamou.

Na troca de mensagens públicas, Tuma afirmou na última quarta-feira (14) que o texto seria incluído na pauta desta semana.

O aceno de Covas havia sido interpretado como uma reação a seu principal adversário na eleição, Celso Russomanno (Republicanos), que tem como bandeira de campanha a criação do "auxílio paulistano", um complemento local do futuro programa federal Renda Cidadã.

O PT também enxergou uma oportunidade de colher dividendos eleitorais com a iniciativa, embora, para isso, tivesse que se alinhar ao PSDB e votar favoravelmente ao projeto.

Para evitar que Covas herdasse sozinho os bônus, o plano era exaltar o protagonismo de Suplicy no tema e deixar claro que, independentemente de divergências políticas, o mais importante era garantir o pagamento do benefício.

Outras bancadas também decidiram marcar sim à proposta, por concordarem com a necessidade de auxílio a famílias pobres no cenário de crise econômica. O curioso é que, ao mesmo tempo, rivais de Covas na corrida eleitoral dispararam ataques contra a decisão do prefeito, vista como oportunista.

O próprio candidato do PT, Jilmar Tatto, chamou a iniciativa de eleitoreira e demagógica. "Agora, a um mês da eleição, sabendo que o povo está na miséria, querem implantar. Mas não tem problema, tudo que é para o bem do povo nós somos favoráveis", disse na sexta.

A movimentação de Covas também criou uma saia justa no PSOL e no PSB: enquanto os candidatos Guilherme Boulos e Márcio França faziam críticas a Covas por apoiar a ideia só às vésperas da eleição, já era consenso entre vereadores das duas legendas que o voto favorável seria inevitável.

"Obviamente votaremos favoravelmente, mas deixando claro que é um estelionato eleitoral, oportunismo e incoerente com os ataques que o PSDB promove contra os trabalhadores", disse nesta terça Celso Giannazi, líder da bancada do PSOL.

Depois de ser apresentado por Suplicy, outros vereadores solicitaram coautoria no projeto. Hoje são 29 coautores, de 12 partidos.

O texto chegou a ser colocado para votação três vezes, em julho e em setembro, mas sofreu boicote de vereadores da base de Covas, que deram voto contrário ou não se registraram para votar, dificultando o quórum.

No último fim de semana, a avaliação era a de que, com o novo cenário, o projeto poderia ser aprovado até por unanimidade na Câmara.

A discussão teve uma guinada nesta terça, com a decisão do governo Covas de ressuscitar o texto formulado pela gestão Haddad.

O argumento oficial para descartar a proposta liderada por Suplicy foi o de que, por se tratar de iniciativa que cria despesa para a prefeitura, o assunto só poderia ser legislado por meio de um projeto de autoria do próprio Executivo.

O vereador petista também participou da elaboração desse projeto, na época em que era secretário de Direitos Humanos de Haddad.

Só que, diferentemente da versão original, que previa um programa permanente e universal de renda básica, a nova se restringia a um pagamento emergencial em decorrência da pandemia.

Suplicy afirmou que o projeto havia sido descaracterizado e apresentou uma emenda, que não foi aprovada.

A bancada do PSDB usou a sessão para defender Covas e afastar a pecha de eleitoreira que a oposição buscava colar na medida. Em vários momentos, os aliados do prefeito entraram em atrito com vereadores como Antonio Donato (PT) e Alfredinho (PT).

Donato disse que o prefeito fez uma jogada e que, apesar do mérito da iniciativa, não poderia "ignorar a manobra eleitoral por trás desse projeto".

Ele afirmou ainda que, pelas condições financeiras da prefeitura, era possível fazer um programa mais amplo. "É inaceitável que um auxílio emergencial para suportar as famílias mais vulneráveis seja visto só como um joguete eleitoral, 'vou dar um pouquinho para dizer que fiz e botar na propaganda eleitoral'."

Donato propôs emenda para aumentar de duas para três pessoas o número máximo de beneficiados pelo auxílio, o que foi apoiado pela base de Covas após acordo.

A expectativa inicial da prefeitura era gastar R$ 300 milhões para atender 480 mil famílias. No entanto, após a emenda de Donato não foram apresentados novos números.

"É claro que jamais vamos ser contrários a que se conceda qualquer tipo de ajuda a quem precisa", afirmou Alfredinho. "[Mas] é um projeto eleitoreiro!"

Police Neto (PSD) se referiu à medida como "voucher eleitoral" e questionou se a Câmara contribuía para a criação da "pior das pandemias possíveis, que é a mentira no processo eleitoral".

"Me assusta, porque a gente precisa ainda entender o que motivou a votar hoje e não há três meses, há seis meses, há três anos”, disse o aliado do candidato a prefeito Andrea Matarazzo (PSD).

Fabio Riva (PSDB) rebateu os colegas e disse que a medida teve andamento agora porque a prefeitura está "com as finanças mais saneadas". "O prefeito Bruno Covas entende e nós entendemos que esse auxílio será importante para muitas pessoas."

Em outra frente, adversários de Covas já avaliam questionar na Justiça Eleitoral a legalidade do pagamento de novo benefício em plena campanha.

A legislação proíbe, por exemplo, a distribuição de bens e valores em ano eleitoral, mas em 2020 foram estabelecidas exceções por causa da situação de emergência provocada pela Covid-19.

O vereador Fernando Holiday (Patriota), um dos que votaram contra o projeto, fez uma petição para o Ministério Público Eleitoral com o objetivo de barrar a lei. Além disso, entrou com ação na Justiça Eleitoral pedindo suspensão via liminar.

"Vejo como uma tentativa desesperada de assumir a liderança nas pesquisas. Há uma tentativa do Covas de fazer o seu próprio auxílio paulistano. Pretende se mostrar mais eficiente que o Russomanno, mas na prática se trata de uma compra de votos descarada", afirmou Holiday.

Advogado da campanha de Márcio França, Anderson Pomini também analisa o caso. "Forçar a criação de uma renda básica durante o período eleitoral avança para um ato claramente eleitoreiro."

"Se a ação pretendida fosse legítima e emergencial, o prefeito já poderia ter implementado independentemente de lei", diz Pomini.

A campanha de Covas não comentou o assunto. Informalmente, assessores dizem que é preciso esperar a conclusão da votação na Câmara para se ter clareza sobre as condições do programa.

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