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Doria vira alvo preferencial de ataques e segue ignorado por campanha de Covas

Campanha de prefeito na TV ignora período em que foi vice do atual governador

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São Paulo

Em uma de suas primeiras campanhas na TV nesta eleição para prefeito de São Paulo, o candidato a reeleição, Bruno Covas (PSDB), elenca fatos importantes da sua vida de forma cronológica. Diz onde nasceu, quando foi morar na capital paulista, as faculdades que fez e quando entrou para a política.

Após falar da experiência como deputado estadual e secretário de estado, ele emenda: "Em 2014 fui eleito deputado federal e trabalhei na CPI da Petrobras combatendo a corrupção. E em 2018 assumi o maior desafio da minha vida: ser prefeito de São Paulo."

Entre uma coisa e outra, a campanha omite que Covas foi eleito em 2016 vice-prefeito do hoje governador João Doria (PSDB), nome com alta rejeição entre os eleitores paulistanos e que até agora não apareceu na campanha do afilhado político.

Se não é defendido na campanha do aliado, o nome do governador é onipresente de forma negativa nas inserções, entrevistas ou comentários em redes sociais dos adversários na disputa pela prefeitura, que tentam ligar o nome de Covas ao de Doria e fazem questão de lembrar que o governador renunciou ao cargo de prefeito.

Pesquisa Datafolha de setembro mostrou que 59% dos paulistanos disseram não votar de jeito nenhum em um candidato apoiado pelo governador, rejeição maior que a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O prefeito Bruno Covas e o governador João Doria em 2019 - Danilo Verpa - 18.nov.2019/Folhapress

Por isso, a estratégia de candidatos como Celso Russomanno (Republicanos) é colar a imagem de Covas à de Doria, inclusive chamando o adversário de Bruno Doria, para lembrar a população que os dois foram eleitos juntos.

"O objetivo é mostrar que é uma chapa só. Assim como foram eleitos juntos, agora não pode, do nada, esconder o padrinho", diz o Elsinho Mouco, marqueteiro de Russomanno.

Na visão de Mouco, o vínculo ainda não está totalmente claro na cabeça da população. Mas ele acredita que, no segundo turno, eles terão que “acelerar juntos”, em referência a um antigo slogan de Doria.

"Sabemos da rejeição do governador entre os paulistanos. Aqui, diferentemente de outros lugares, o eleitor não perdoa ele ter abandonado a cidade. Bruno Doria é uma expressão divulgada pelo Celso de fácil compreensão", completa.

O próprio candidato do Republicanos usa na campanha uma aproximação com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que, também com alta rejeição em São Paulo, não tem revertido em pontos nas pesquisas eleitorais —Russomanno começou a campanha como favorito, mas vem em tendência de queda.

Uma peça de Russomanno começa com ele fingindo que procura Doria no estúdio. “Gente, cadê o Doria? Vocês viram o Doria por aí? Ele não aparece nem na propaganda do Bruno. Será que o prefeito esconde o governador com medo de atrapalhar?”, diz o deputado.

Uma das coisas que explicam a alta rejeição é o fato de Doria ter sido eleito para os quatro anos de mandato como prefeito e ter abandonado o cargo pouco mais de um ano depois para disputar o governo do estado.

Na eleição de 2018, Doria venceu o adversário Marcio França (PSB) com 52% dos votos no estado, mas, se considerados apenas os votos da capital, ficou atrás com 42%.

Naquele ano, Doria também foi criticado por correligionários por esconder Geraldo Alckmin, seu padrinho político que disputava a eleição presidencial, da campanha. O hoje governador tentava na ocasião colar sua imagem à de Jair Bolsonaro.

França hoje disputa a prefeitura e também abusa do "Bruno Doria" em entrevistas e nas redes sociais.

Raul Cruz Lima, responsável pela campanha do candidato do PSB, diz que a decisão de atacar o governador também se dá em função do respeito pelo câncer que acomete o atual prefeito.

"Ele [França] foi muito amigo do avô do Bruno, o Mario Covas, e também com a situação da doença ele fica sem jeito de bater. Então bate no Doria. A briga dele é realmente com o Doria", resume.

A estratégia da campanha de França, no entanto, é deixar os ataques de fora das inserções na TV. "Na campanha oficial a gente não coloca, a ideia é fazer propostas. Fomos por esse caminho porque é o que nossas pesquisas avaliam que é mais efetivo ser propositivo. Mas sempre que há uma brecha, o Márcio, em entrevistas e essas coisas, dá um pau no Doria", diz Lima.

Principal nome da esquerda na disputa, Guilherme Boulos (PSOL) também aposta em ligar o nome de Covas ao de Doria. O coordenador da campanha, Josué Rocha, explica a estratégia: "Doria sumiu da campanha de Covas para confundir a população, e cabe a nós lembrar aos paulistanos que os dois são carne e unha", diz.

Mesmo quem era próximo de Doria, como a deputada federal Joice Hasselman (PSL), ataca o governador e questiona seu sumiço na campanha do pupilo. "Bruno Covas esconde Doria em sua campanha! Ué, por quê? Se o prefeito recebeu a prefeitura de presente do atual governador, por que esconde Doria?", questionou na internet.

Nos bastidores, a campanha do tucano minimiza o assunto, não confirma se Doria vai aparecer ou não e diz que tradicionalmente o governador se envolve pouco na disputa municipal, citando episódios como as eleições para a prefeitura em que Alckmin ficou de fora do segundo turno, em 2000 e 2008, pleitos em que Mario Covas e José Serra, então governadores, teriam entrado para valer só na reta final.

A avaliação é de que Covas já é suficientemente colado a Doria e não esconde isso, participando juntos com frequência, por exemplo, das coletivas no Palácio dos Bandeirantes de anúncio das medidas de contenção do novo coronavírus.

Os dois tucanos, no entanto, já tiveram seus atritos quando ambos batiam ponto na prefeitura, com ápice quando Doria retirou Covas da Secretaria de Subprefeituras em novembro de 2017.

A demissão aconteceu em um momento em que Doria era criticado pela situação da zeladoria da cidade, e depois que o então prefeito demitiu Fabio Lepique, braço direito de Covas na pasta, abrindo uma crise entre os dois.

Para minimizar o problema, Doria colocou Covas para articular projetos na Câmara Municipal e brincou, na ocasião, que seu vice havia "caído para cima", mas deixando claro que "a população fez algumas reclamações".

“Não há nenhum reparo na gestão do Bruno, mas com esta nova estrutura vamos melhorar ainda mais. Já disse que temos que ter os ouvidos muito ligados na população, e a população fez algumas reclamações”, disse Doria na época.

Na ocasião ele testava uma possível candidatura à Presidência em 2018, furando a fila de seu padrinho político Geraldo Alckmin, o que causou conflitos também com Covas, que era próximo do então governador paulista.

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