Descrição de chapéu Eleições 2020

Mandato colaborativo leva vereador a ser o mais votado em cidade do interior de SP

Em Tatuí, espaço usado para discussões se transforma em centro cultural e reúne sindicatos e cursinho pré-vestibular na cidade

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Ribeirão Preto

Um lugar em que predominam debates, cursos e um mandato colaborativo levou o sociólogo Eduardo Sallum (PT), 27, a ser o vereador mais votado na eleição deste ano em Tatuí (a 141 km de São Paulo).

A história que o levou ao ponto mais alto entre os postulantes ao Legislativo na cidade do interior paulista teve início há dez anos, quando iniciou as atividades num grupo de estudos que passou a promover protestos contra atos da administração local e do governo estadual.

O primeiro foi contra o então governador Geraldo Alckmin (PSDB), que esteve na cidade para inaugurar uma maternidade, no qual o grupo cobrou a realização de promessas eleitorais. A ele se sucederam outros, como o que questionava a venda de um patrimônio público na cidade, além dos atos de 2013.

Esse histórico fez o Movimento Popular Práxis, nome do grupo, concluir que alguém deveria entrar na política.

Sallum estudava na Unesp (Universidade Estadual Paulista) em Araraquara e voltou a Tatuí para ser candidato. Foi, aos 23 anos, o mais jovem vereador da cidade, eleito com 682 votos, ou 1,17% dos válidos. Neste ano, chegou a 1.709, 3,17% dos votos válidos.

“Sabia que tinha um trabalho construído muito bem fundamentado, mas ser o mais votado foi uma surpresa muito grande, uma sinalização muito grande da população”, disse.

Homem de camisa azul sorri com prédio amarelo com detalhes em branco nas janelas ao fundo
O vereador Eduardo Sallum (PT), o mais votado para a Câmara de Tatuí (SP) nas eleições deste ano - Divulgação

O Práxis concentra laboratórios populares para discussões que resultam em sugestões de melhorias e projetos para serem apresentados nas sessões e que acabou se transformando num centro cultural do município.

Abre espaços para sindicatos que não têm sede própria e oferece cursos à população carente —pré-vestibular, idiomas e desenho, entre outras atividades.

Esse desempenho atraiu políticos como o ex-ministro Carlos Gabas (Previdência), ex e atuais deputados e o vereador paulistano Eduardo Suplicy (PT), figura constante no espaço. O exemplo de Tatuí foi um dos módulos de um curso que o PT deu neste ano.

O desafio inicial, segundo Sallum, era como vencer uma eleição sem ter uma família tradicional na política por trás ou uma empresa que bancasse custos de uma candidatura.

“A cidade é há 100 anos governada por três ramos econômicos, que são uma empreiteira, ceramistas e o mercado financeiro. O que trouxemos de novo foi a ideia do mandato compartilhado.”

A lógica que o grupo adotou foi a de, em vez de um candidato contratar, por exemplo, 15 cabos eleitorais para que cada um “consiga” 100 votos, conseguir 150 participantes que multiplicassem seus votos por 10.

“Invertemos a lógica eleitoral. Assim, ninguém se afasta de seu trabalho para trabalhar em eleição como cabo eleitoral, não precisa investir em propaganda de massa e terá tempo para conversar olho a olho com as pessoas.”

Nos quatro anos do atual mandato, o Práxis apresentou mais de 3.000 matérias entre requerimentos, indicações, emendas, substitutivos e projetos de lei, muitas dos quais Sallum discordava.

“Muitas vezes fui voto vencido. O mandato compartilhado é uma aprendizagem muito grande. Cada reunião aqui eu aprendo. Me sinto sendo preparado por todos para ir para a Câmara. Quem me ajudou não é cabo eleitoral, mas um vereador popular. Eu sou vereador, mas tem muitos trabalhando comigo na prática.”

A casa utilizada pelo movimento, de 300 metros quadrados, é paga com a destinação de mais de 50% do salário como vereador. O vencimento líquido em setembro foi de R$ 5.799,76, segundo a Câmara.

É nela que o mandato popular é desenvolvido e as ações de voluntariado são criadas. O cursinho pré-vestibular gratuito aprovou mais de 50 alunos de baixa renda em vestibulares nos dois últimos anos, inclusive em medicina.

Também há uma escola de música e atendimento psicológico gratuito, além de coletivos –um feminista e um evangélico de esquerda. Seis sindicatos se reúnem na casa.

Em 2018, Sallum correu o risco de perder o mandato, depois de ter chamado o então presidente da Casa de frouxo.

“Ele cortou meu microfone, disse que ele não era ditador. Ele me mandou calar a boca e eu o chamei de frouxo. Não deveria ter falado, mas o parlamentar tem inviolabilidade de fala, basta ver o que o Bolsonaro fala e não acontece nada”, disse.

Apenas um vereador era contrário à cassação, segundo ele, mas a movimentação de pessoas, entre elas líderes sindicais e deputados, contribuíram para que o requerimento que trataria da constituição de uma CP (Comissão Processante) para cuidar do tema fosse retirado da pauta –nunca mais voltou.

Relatos dos arquivos da Câmara mostram que, ao se pronunciar na tribuna em sessão anterior, o petista disse que não teve intenção de ofender ninguém e que respeita todos. Hoje ele é vice-presidente da Casa.

A cidade será governada por Maria José Gonzaga (PSDB), 74, reeleita com 58,29% dos votos válidos e que teve oito partidos em sua coligação.

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