Descrição de chapéu STF senado

Rosa vota contra drible na Constituição, e placar no STF é de 4 a 3 por brecha à reeleição de Maia e Alcolumbre

Ministra do Supremo diz que 'deslealdade ao texto constitucional' é ofensa ao pacto da sociedade brasileira

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Brasília

De 11 ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), 8 ministros já votaram no julgamento da ação sobre a possibilidade de reeleição Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) às presidências da Câmara e do Senado dentro de uma mesma legislatura.

Neste sábado (5), a ministra Rosa Weber votou contra a recondução. O placar está quatro votos para liberar nova candidatura e três contra. Ainda precisam votar os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Luiz Fux, esse último o presidente do Supremo.

A Constituição proíbe os chefes das Casas de tentarem a recondução no posto dentro da mesma legislatura. A legislatura atual começou em fevereiro de 2019 e vai até fevereiro de 2023.

Apesar da proibição, a postura de Maia e Alcolumbre nos enfrentamentos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) com o Supremo, mudanças constitucionais recentes e articulações políticas nos bastidores, porém, têm alimentado a esperança de ambos de continuarem à frente do Congresso, com o aval dos ministros do Supremo.

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A ministra Rosa Weber durante sessão plenária do STF (Supremo Tribunal Federal) - Pedro Ladeira - 24.out.2019/Folhapress

Até o momento, no julgamento com votos por escrito que vai até o próximo dia 14, uma segunda-feira, os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes votaram a favor da reeleição dos dois. Kassio Nunes defendeu a possibilidade de recondução apenas de Alcolumbre.

Ao lado de Rosa Weber, estão os ministros Marco Aurélio e Cármen Lúcia que votaram nesta sexta-feira (4). Eles divergiram de Gilmar Mendes, relator da ação que trata da sucessão na Câmara e no Senado.

Rosa Weber argumentou que o impedimento à recondução aos cargos está expressa na Constituição e portanto não há margem para interpretação.

A ministra reconhece que o conteúdo da regra em questão não configura uma matéria inerente ao modelo republicano e democrático, como outros pontos da Constituição. Como escreveu em seu voto, trata-se de uma normal desprovida de "perfil materialmente constitucional". No entanto, ressalta, isso não significa que esteja "desprovida de estatura constitucional", ou que seja uma regra menor.

Por isso, Rosa Weber afirma em seu voto que a regra em questão apenas pode ser modificada por meio de uma emenda à constituição.

Segundo a ministra, "a deslealdade ao texto constitucional caracteriza preocupante ofensa ao pacto da sociedade brasileira em torno do propósito de conferir força ativa aos compromissos assumidos no plano constitucional".

"Este Supremo Tribunal Federal, no exercício de sua missão institucional de garantir a intangibilidade da Constituição, enquanto seu guardião por força de expresso texto constitucional (CF, art.102), não pode legitimar comportamentos transgressores da própria integridade do ordenamento constitucional, rompendo indevidamente os limites semânticos que regem os procedimentos hermenêuticos para vislumbrar indevidamente, em cláusula de vedação, uma cláusula autorizadora", escreveu Rosa Weber.

"A hermenêutica constitucional não permite endosso a práticas heterodoxas que adulterem o real sentido da Constituição, ou de exegeses capciosas que estiquem o sentido semântico das palavras até que expressem qualquer coisa, e a Constituição já mais nada signifique​", completa.

"Impõe-se, no caso, a reafirmação da supremacia da Constituição".

Relator do caso, Gilmar defende que o Congresso possa alterar a regra internamente por uma mudança regimental, questão de ordem ou "qualquer outro meio de fixação de entendimento próprio à atividade parlamentar", e não necessariamente pela aprovação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição).

Os ministros que já votaram concordaram com o argumento do relator de que o trecho da Constituição que proíbe a reeleição "nunca fora princípio estruturante do Estado brasileiro, ou elemento normativo central para a manutenção da ordem democrática".

Kassio foi o único a sustentar que a regra não deveria valer para quem já foi reeleito, o que impediria Maia de buscar mais um mandato no comando da Câmara.

A tese de Kassio, primeiro indicado de Bolsonaro a uma vaga no STF, favorece as articulações do governo, que tenta derrotar Maia e reeleger Alcolumbre à frente do Senado.

Os outros quatro ministros defenderam a possibilidade de Maia tentar a recondução, mas afirmaram que, a partir da próxima legislatura, que começa em 2023, deve haver o limite de uma única reeleição.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro Gilmar Mendes, em evento no Planalto
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro Gilmar Mendes, em evento no Planalto - Alan Marques - 24.ago.2016/Folhapress

O julgamento ocorre no plenário virtual da corte e começou nesta sexta-feira. O relator incluiu seu voto no sistema e foi acompanhado por Toffoli, Lewandowski e Moraes, que não disponibilizaram seus votos.

Em 63 páginas, Gilmar sustenta que a vedação prevista na Constituição "requer sua devida harmonização sistemática com o princípio da autonomia organizacional das Casas do Congresso Nacional".
Kassio Nunes fez um paralelo com o Executivo para sustentar a tese em favor da reeleição.

"Se o presidente da República pode ser reeleito uma única vez —corolário do princípio democrático e republicano— por simetria e dever de integridade, este mesmo limite deve ser aplicado aos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal", argumentou.

Já Marco Aurélio afirmou que a vedação é "peremptória" e pretende alcançar a alternância de poder, "evitando-se a perpetuação, na mesa diretiva, de certos integrantes", enquanto a ministra disse que "a norma é clara, o português direto e objetivo".

Cármen Lúcia acompanhou a divergência e afirmou que permitir a reeleição é descumprir "fragorosa e frontalmente" a Constituição. Para ela, a alteração na regra só poderia ocorrer via PEC.

A ministra argumenta que "não há sequer duas opções" sobre como interpretar o trecho da Constituição que trata do tema.

Cármen Lúcia afirmou que a redação do dispositivo é clara e objetiva. "Em norma jurídica —mais ainda, em dispositivo da Constituição da República—, onde tenha o constituinte se utilizado do verbo vedar, vedado está. Pode-se ter por lógica e fácil essa conclusão."

A decisão do STF é considerada peça fundamental no xadrez da disputa pela sucessão no Congresso.

Está em julgamento uma ação apresentada pelo PTB, que pede para o Supremo "afastar qualquer interpretação inconstitucional" que permita a reeleição.

O partido é aliado de Bolsonaro e tenta ajudar o Palácio do Planalto a vetar qualquer chance de Maia de se manter no comando da Câmara. A ação, porém, pode ter o efeito contrário e dar tração às articulações do presidente da Casa para continuar na função.

O que a Constituição diz sobre o caso

Veto à recondução 
O artigo 57, no parágrafo 4º da Carta Magna, afirma: “Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.

A atual legislatura começou em fevereiro de 2019 e se estenderá até fevereiro de 2023

Julgamento no STF 
A corte começou a decidir na sexta-feira (4) se permite a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e de Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado.

A simpatia de ministros com a postura dos dois nos enfrentamentos do presidente Jair Bolsonaro com o STF, mudanças constitucionais recentes e as articulações políticas nos bastidores têm alimentado a esperança de ambos de continuarem à frente do Congresso.

Gilmar Mendes (relator), Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes votaram a favor da recondução dos dois. Kassio Nunes, que assumiu vaga na corte neste ano, após indicação de Bolsonaro, defendeu a possibilidade de reeleição apenas de Alcolumbre. Eles defenderam que a reeleição pode ser autorizada por mudança no regimento, “questão de ordem” ou “qualquer outro meio de fixação de entendimento próprio à atividade parlamentar”.

Já Marco Aurélio defendeu a proibição, assim como as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.

O julgamento poderá se estender até o próximo dia 14. O processo, porém, ainda pode ser retirado da pauta online se qualquer ministro indicar preferência em analisar a questão em sessão presencial, atualmente realizada por videoconferência. Caso isso ocorra, a matéria vai para as mãos do presidente da corte, ministro Luiz Fux, que deve escolher uma data para análise no plenário físico

Visão do Planalto 
A decisão do Supremo em relação à possibilidade de reeleição aos comandos da Câmara dos Deputados e do Senado também será acompanhado de perto pelo Planalto.

O governo simpatiza com a manutenção de Alcolumbre à frente do Senado, mas trabalha para eleger Arthur Lira (PP-AL), réu no Supremo sob acusação de corrupção passiva, e derrotar Maia ou o candidato apoiado por ele para presidir a Câmara dos Deputados

Posição da PGR e da AGU  
Em parecer de setembro enviado ao Supremo, a Procuradoria-Geral da República, comandada por Augusto Aras, alinhado a Bolsonaro, defendeu que a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado é um assunto a ser tratado pelo próprio Legislativo.

A Advocacia-Geral da União, ligada ao governo Bolsonaro, tem o mesmo posicionamento, expresso em documento também de setembro deste ano.

A leitura política é a de que, com isso, o governo federal acenou positivamente à recondução de Alcolumbre ao comando do Senado

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