Huck compreende os problemas do Brasil, mas candidatura é decisão difícil, diz fundador do RenovaBR

Segundo Eduardo Mufarej, escola de políticos é independente, e apresentador é um membro entre tantos

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São Paulo

Buscando afastar desconfianças e minimizando a vinculação da entidade com o apresentador Luciano Huck, o empresário Eduardo Mufarej diz que o RenovaBR tem provado ser uma iniciativa independente e pluripartidária.

"A gente está querendo sair dessa discussão: 'Ah, o Renova tem o partido A, tem o partido B'. É o eleitor quem escolhe. Não somos nós", afirma à Folha.

Mufarej diz que, se Huck concorrer à Presidência da República em 2022, como se especula, ele terá que se afastar do conselho consultivo da organização, que prepara pessoas para a política, independentemente de filiação partidária.

Para o fundador da escola, a possível candidatura do comunicador está "longe de ser uma decisão fácil", mas Huck está estudando para ter "compreensão dos problemas brasileiros e suas soluções".

O empresário Eduardo Mufarej na formatura dos alunos do RenovaBR em 2019, na Sala São Paulo - Mathilde Missioneiro - 7.dez.2019/Folhapress

O Renova elegeu 153 pessoas em 2020, entre vereadores, vices e prefeitos. Os partidos com mais eleitos foram Novo e PP (ambos com 15), Cidadania (14) e PSD (11). A lista completa inclui 25 legendas, de PSOL e PC do B até PSL e PTB.

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O Renova lançou 1.032 candidatos e elegeu 14,8% deles. Era o que esperavam? A gente ficou feliz com os resultados, mas mais importante foi o volume de candidatos. Com um bom volume de concorrentes preparados, aumenta a chance de ter uma renovação qualificada. O papel do Renova é fazer com que as pessoas se candidatem e não desistam do projeto político.

Concorda com a leitura de que a política saiu fortalecida da eleição de 2020, enquanto a de 2018 foi marcada pelo sentimento antipolítica? Não sei. A sociedade não queria aventuras incertas. Nessa troca de política nos últimos governos, teve muita gente despreparada [eleita].

A tendência da população, como acho que ocorreu em 2020, é ficar com aquilo que conhece, no lugar mais seguro. Em 2018, talvez tenha havido uma anomalia, com um candidato a presidente da República que se dizia como antipolítica.

Esse discurso não é uma contrapropaganda do Renova, que prega oxigenação? Não, é um fato. A gente acredita que o eleitor, se tiver boas opções, vai se dar, em algumas circunstâncias, o benefício da dúvida. Mas não é sempre.

A onda da renovação é duradoura? A necessidade das pessoas de quererem entrar na política e fazerem um bom trabalho é uma tendência que veio para ficar. A outra questão, que é difícil de identificar, é onde vai estar a cabeça do eleitor.

Sua expectativa de que esta eleição seria baseada em pautas e menos polarizada se concretizou? Quem focou em município, nos problemas da cidade, teve mais sucesso do que quem ficou falando de pauta nacional.

O resultado dos eleitos do Renova foi divulgado por meio de um mapa no site, em vez de uma listagem que permita ver nome, cidade, cargo e partido. Por que não informar de maneira mais clara, transparente? Não sei responder. Achei que tinha sido divulgada como uma lista inteira.

No site, de acesso público, só é possível ver um mapa com informações por local. Não é contraditório, para uma escola que prega transparência? A gente tem uma lista de todos os alunos por cidade. O Renova tem controle de uma coisa: os alunos e os candidatos. O Renova se propõe a preparar pessoas para serem candidatas. Se vão ganhar ou não, isso está completamente fora do meu controle.

Existe um questionamento sobre viés, ideologia, preferência partidária [na seleção dos participantes]. A gente está querendo sair dessa discussão: "Ah, o Renova tem o partido A, tem o partido B". É o eleitor quem escolhe. Não somos nós. [Após a entrevista, o site foi atualizado e a assessoria enviou à Folha uma listagem detalhada.]

Desde 2019, partidos como Novo, PDT e PSOL tentaram dificultar e até impedir candidatos vinculados a movimentos de renovação e qualificação. O Renova fez algo? Nossa formulação é a de apoiar o cidadão comum que quer entrar na política. A gente não tem a ambição de ocupar espaço de partido.

Aquele momento mais agudo de críticas, após o caso de Tabata Amaral [ex-aluna e deputada federal], em que o PDT chamou o Renova de partido clandestino, passou? Não sei se passou ou não, sei o que nós somos. Somos uma instituição de portas abertas para quem quer participar. Se os partidos acham que isso é importante, façam seus programas, incentivem, deem formação. A fórmula está dada.

Filipe Sabará, ex-aluno do Renova, era candidato a prefeito de São Paulo e informou patrimônio de R$ 15 mil e depois corrigiu para R$ 5 milhões. Foi expulso do Novo por inconsistências no currículo. Isso provoca alguma autocrítica no processo seletivo do Renova, que analisa pontos como integridade? A gente sempre soube que ia errar em processo seletivo. A quem se propõe fazer um processo com 45 mil inscritos, é impossível imaginar que todas as pessoas vão ser absolutamente fiéis a tudo o que disseram.

Em dezembro de 2019, o sr. apontou "falta de consideração e equívoco" em uma manifestação pró-Lula de alunos na formatura do Renova. Como fica o direito à liberdade de expressão? O que considerei um equívoco foi uma foto com máscaras [de Lula] na frente da marca do Renova. Parece que está colocando a organização, ou seja, todos os outros alunos, dentro dessa mesma ilustração. A manifestação, "Lula livre", ou "viva o Novo", tudo isso é livre para cada um.

E se fossem alunos fazendo arma com a mão, um gesto associado a Bolsonaro? Mesma reação, exatamente a mesma reação.

O Renova saiu de 508 doadores individuais em 2018 para 1.478 em 2019, mas a receita diminuiu de R$ 18,5 milhões para R$ 11,4 milhões. Ficou mais difícil obter doações para política? A gente precisa reverter a percepção estigmatizada na sociedade brasileira de que o investimento na política é algo que não vale a pena, que as pessoas têm receio.

De uma certa forma, o investimento em uma instituição de formação política, como é o Renova, fica resguardado. A queda de orçamento foi porque tínhamos um superávit e não havia necessidade de promover um esforço de captação tão elevado. Com o curso online, não tivemos elevação de custos.

O apoio de Luciano Huck, tido como pré-candidato à Presidência, pode afetar a imagem de independência e pluripartidarismo que a escola busca transparecer? O Luciano é membro do nosso conselho consultivo e, se resolver seguir por um caminho eleitoral, tem que sair do conselho. A gente não vai fazer vinculação a candidatura majoritária, seja de membro do conselho ou não. O Luciano é uma pessoa importante na construção do Renova, mas é um membro, como tantos outros.

Como amigo dele, o sr. incentiva a candidatura? Para qualquer pessoa, se candidatar é difícil pra burro. Principalmente quem não vem da política ou de uma trajetória óbvia. A política infelizmente virou um ambiente que a sociedade não valoriza e vê como um lugar contaminado.

Se ele resolver ir, vai estar longe de ser uma decisão fácil, porque vai ter que deixar muita coisa na mesa, tem uma carreira, tem que escancarar a vida pessoal.

Ele está preparado para a função? O Luciano é muito estudioso, tem gastado um tempo grande em compreensão dos problemas brasileiros e suas soluções. Caso tome essa decisão, ele tem hoje muito mais informações e elementos para poder avançar e evoluir.

O sr. declarou voto em Bolsonaro em 2018. Como avalia o governo? O Brasil na pauta externa, na questão ambiental, vem cometendo alguns erros que vão custar caro, em termos de reputação e imagem. Ao mesmo tempo, é curioso porque a popularidade da Presidência está alta, e muito por conta do auxílio emergencial, o que mostra que o Brasil é um país ainda muito suscetível a apoios sociais básicos.

Eu, por princípio, sempre quero ajudar, mas acho que a gente está numa posição frágil. Com uma sociedade meio dividida, sem pensar no que a une, e já pensando nas eleições de 2022. Fico frustrado. É uma repetição do que a gente vê há 30 anos.

Ficou arrependido? Como eleitor, não me arrependo de nenhuma votação que já fiz na vida, porque tomei a decisão com base nas informações que eu tinha naquele momento. É fácil falar agora, como se fosse engenheiro de obra pronta.

Estou preocupado com o Brasil, de modo geral, por causa da atividade [econômica] estagnada, sem modernização da mão de obra, com a educação em um cenário péssimo, com troca de ministros, falta de clareza.

Pretende se candidatar? Não penso. Não é meu perfil. Acho que ajudo muito mais assim [no Renova].

Na sua visão, em que medida diversidade na política, uma questão muito demandada hoje, e qualidade se relacionam? A diversidade permite enxergar o outro, compreender as múltiplas facetas da sociedade. O Renova, mais do que na questão racial e de gênero, considera que o trabalho começa por colocar lado a lado pessoas que pensam diferente. Dos nossos eleitos em capitais, 48% foram mulheres.

A escola já trabalha para a eleição de 2022? Vamos abrir processo seletivo para uma nova turma, com ênfase em preparar pessoas para os próximos ciclos. Muita gente que participou do curso optou por não se candidatar, mas poderá fazer isso no futuro.

Enxerga o Renova como uma instituição perene? Vai depender muito da necessidade, né? Se essa necessidade deixar de existir, ou o Renova vai ter que encontrar uma nova vocação ou vai ter que fechar. Mas acho que a gente não está lá ainda.

RAIO-X

Eduardo Mufarej, 43
Empreendedor e executivo, fundou em 2017 o RenovaBR, uma associação privada sem fins lucrativos que prepara gratuitamente cidadãos interessados em participar da política. Ex-filiado ao Novo, obteve o apoio de outros empresários e personalidades para criar a entidade, que ajudou a eleger candidatos de vários partidos nas eleições de 2018 e 2020. Foi CEO da Tarpon Investimentos e da Somos Educação e, em 2020, lançou o fundo de impacto social GK Ventures

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