Absolvido no mensalão é suspeito em outro esquema de propina e questiona investigação

Márcio Alaor está no centro de apuração sob suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro a operadores políticos

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São Paulo

Um executivo que chegou a ser denunciado no mensalão está novamente no centro de uma investigação sob suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro para operadores de políticos com altos cargos, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e o ex-ministro e ex-senador Romero Jucá, ambos do MDB.

Márcio Alaor de Araújo, ex-vice-presidente do BMG, foi alvo no ano passado de fases da Operação Descarte, uma investigação da Receita Federal, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal em São Paulo.

A Procuradoria considera Alaor um dos pivôs de um esquema de lavagem de dinheiro que envolve o banco mineiro, doleiros, empresas de fachada, operadores políticos e um escritório de advocacia que forjava serviços jurídicos para transformar em propinas recursos saídos da instituição financeira.

​Em petições apresentadas à Justiça, seus advogados têm afirmado que não há corroboração de provas nas delações que o mencionam.

Sua defesa é comandada pelo advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que disse em manifestação ao TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) que a delação que acusa Alaor foi adaptada enquanto estava em curso porque "nada foi encontrado que corroborasse a versão dos delatores" e que a acusação usa elementos "apreendidos com o próprio colaborador”.

O Ministério Público Federal contesta e apresenta emails e relatórios financeiros apreendidos antes de ele firmar delação que, mesmo sem o depoimento do delator, já serviriam para serem usadas contra os investigados.

"Temos emails contendo negociações, notas fiscais e contratos simulados apreendidos na 1ª fase da operação, informações fiscais da Receita Federal e RIF (relatório de informações financeiras) do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), que formam conjunto probatório robusto suficiente para a decretação das medidas de busca e apreensão, sequestro de bens e valores e afastamento da atividade econômica, deferidas pela 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo", diz o procurador da República Vicente Mandetta, responsável pela investigação.

O ex-vice-presidente do banco BMG, Márcio Alaor de Araújo - Leticia Moreira - 11.jan.2012/Folhapress

Em 2012, Marcio Alaor chegou a ser condenado em primeira instância por gestão fraudulenta em uma ação de desdobramento do mensalão, mas foi absolvido pelo TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região). A Procuradoria recorreu.

No julgamento da Descarte, Alaor teve uma vitória parcial no TRF-3 no último dia 1º: ele conseguiu reverter uma medida cautelar que o afastava de atividades econômica e financeira. Mas ficou decidido que ele não pode atuar no BMG.

Também foi considerada prematura a discussão a respeito das provas da investigação e delações.

A Operação Descarte investiga esquemas de lavagem de dinheiro relacionados ao advogado Luiz Carlos D'Afonseca Claro, também conhecido como Lulli Chiaro, e seu filho Gabriel Claro. Ambos firmaram acordo de delação em 2019.

As apurações das fases contra o BMG contemplam alvos de outras grandes operações, como da Lava Jato do Rio de Janeiro, que investiga elos com o ex-governador Sérgio Cabral (ex-MDB), e da Acrônimo, que envolve suspeitas relacionadas ao ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel (PT).

O esquema com os Claros funcionava assim: interessados em dinheiro vivo firmavam contratos fictícios com empresas ligadas a Luiz Carlos e Gabriel. Então, pai e filho providenciavam recursos em espécie por meio de doleiros.

As investigações apontam que os Claros atuaram para empresas ligadas ao BMG e seus executivos de 2014 a 2016. Os operadores do esquema eram Milton Lyra e Daniel Peixoto, ligados a políticos da cúpula do MDB.

Segundo a delação de Gabriel Claro, as empresas ligadas ao BMG firmaram contratos de fachada com empresas ligadas aos Claro. Parte do dinheiro em espécie, dizem os investigadores, teria sido entregue ao próprio Márcio Alaor na sede do BMG.

Ao avançar nas investigações, a PF chegou à conclusão que houve serviços de fachada não só nos contratos com os Claros, mas também com outras empresas. Para isso, usaram como provas os emails, relatórios da Receita Federal e depoimentos de colaborações.

No total, o volume de recursos suspeitos movimentado no esquema é de aproximadamente R$ 140 milhões.

Entre os citados como pessoas que firmaram contratos fictícios estão o chefe da Casa Civil de Minas Gerais durante o governo Pimentel (2015-2018), Marco Antônio de Rezende Teixeira. Em 2014, poucos meses antes de assumir o cargo, uma empresa ligada ao BMG pagou a seu escritório de advocacia R$ 200 mil.

O Ministério Público diz que não há comprovação de prestação de serviços.

Outro investigado é Georges Sadala, cuja empresa que administrava recebeu R$ 8 milhões. Sadala, um dos participantes da famosa “farra dos guardanapos” com Cabral, chegou a ser preso pela Lava Jato.

O banco BMG foi contratado pelo governos de Minas e do Rio para a concessão de crédito consignado aos servidores desses estados.

Márcio Alaor renunciou ao cargo de vice-presidente do BMG após a operação.

Os advogados de Luiz Carlos Claro e Gabriel Claro, Danyelle Galvão e Ortélio Marrero, afirmam em nota que "todas as declarações prestadas estão corroboradas por elementos da investigação, inclusive colhidos em busca e apreensão anterior à prisão".

OUTRO LADO

O advogado Kakay, que defende Márcio Alaor, afirma que seu cliente está tranquilo em relação à investigação, mas que acompanha seu andamento com cuidado. Segundo ele, não há nada nos autos que leve a entender que realmente existia um esquema de lavagem de dinheiro.

De acordo com Kakay, Alaor aparece apenas "em um determinado email que o setor jurídico encaminhou para algumas pessoas e também encaminhou para ele, como vice-presidente, em relação a uns contratos que haviam sido feitos".

"Eles afirmam que os contratos foram regulares, que não há absolutamente mais nada que os preocupe. Houve uma primeira delação que o nome dele não aparece. Numa segunda delação a mesma pessoa diz que esteve com o Márcio", afirma o advogado.

Em nota, o BMG informa que criou em novembro do ano passado um comitê especial dedicado ao levantamento dos fatos, cujos trabalhos estão em andamento.

O banco diz que Márcio Alaor "renunciou espontaneamente ao seu mandato de diretor executivo vice-presidente". "O Banco BMG segue à disposição para contribuir para o esclarecimento dos fatos junto às autoridades responsáveis", diz a nota.

Marco Antônio de Rezende Teixeira disse que desconhecia a intervenção do MPF sobre o assunto e que já fez defesa junto à Receita Federal sobre o caso, ainda sem decisão.

O advogado de Georges Sadala, Adriano Vanni, afirma que o empresário "não é e nem nunca foi operador financeiro do ex-governador Sérgio Cabral" e que seu processo no Rio ainda pende de decisão definitiva.

Segundo ele, todos os valores recebidos pela empresa que Sadala administrava "são efetivamente devidos e foram contabilizados e tributados, não havendo saques de valores em espécie ou transferência de recursos para terceiros: ao contrario disso, todos os valores foram reinvestidos nos negócios de Georges Sadala e de suas empresas".

Milton Lyra não quis comentar pois não teve acesso à investigação.

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