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Saiba quais crimes Daniel Silveira pode ter cometido e qual a pena somada pelo ataque ao Supremo

Parlamentar cometeu delitos previstos na Lei de Segurança Nacional e no Código Penal, segundo o STF e a Procuradoria

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Mogi das Cruzes (SP)

Em quase 20 minutos de um vídeo publicado na terça-feira (16), o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) cometeu uma série de crimes previstos na Lei de Segurança Nacional e no Código Penal, segundo decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes, que determinou a prisão em flagrante do parlamentar já referendada pela corte.

A ordem de Moraes foi tomada no âmbito do inquérito das fake news, do qual é relator. A investigação foi aberta em março de 2019 pelo então presidente do Supremo, Dias Toffoli, para investigar ataques contra os ministros da corte.

Já a denúncia apresentada contra o parlamentar nesta quarta-feira (17) pela Procuradoria-Geral da República foi feita dentro da investigação sobre manifestações antidemocráticas, aberta em 2020 após uma sequência de atos em Brasília prestigiados pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

A pedido da Folha, Raquel Scalcon, professora de direito penal da FGV-SP, advogada criminalista e doutora em direito penal, avaliou a lista feita pela reportagem de crimes que poderão ser imputados ao parlamentar.

​Se condenado por todos eles, a pena de Silveira pode variar de 9 a 42 anos de prisão, além de multa.

Confira abaixo por quais crimes o deputado poderá responder.

1) Tentar mudar o Estado de Direito

O que disse o deputado: “Lá em 64, na verdade em 35, quando eles perceberam a manobra comunista, de vagabundos da sua estirpe, 64 foi dado então um contragolpe militar, é que teve lá os 17 atos institucionais, o AI-5 que é o mais duro de todos, como vocês insistem em dizer, aquele que cassou 3 ministros da Suprema Corte, você lembra? Cassou senadores, deputados federais, estaduais. Foi uma depuração, um recadinho muito claro: se fizerem, a gente volta”

O que diz a lei: Art. 17 da Lei de Segurança Nacional - Tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito.

Pena: reclusão, de 3 a 15 anos.

  • Segundo a decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou o crime descrito na Lei de Segurança Nacional

Avaliação da professora Scalcon sobre o uso do artigo: Não vislumbro prima facie a consumação do delito por dois motivos: (a) questionável se tratar de "grave ameaça" e (b) questionável que o agente efetivamente pretenda, com sua conduta, "tentar mudar" —concretamente— o regime vigente. As falas que são chamadas de ameaça dependem de competências que não são exclusivas do deputado.

2) Exercício dos Poderes

O que disse o deputado: "É claro que vocês vão me perseguir pelo resto da minha carreira política, mas eu também vou perseguir vocês. Não tenho medo de vagabundo, de traficante, de assassino, vou ter medo de onze que não servem pra porra nenhuma para esse país? Não, não vou ter"

O que diz a lei: Art. 18 da Lei de Segurança Nacional - Tentar impedir, com emprego de violência ou grave ameaça, o livre exercício de qualquer dos Poderes da União ou dos Estados.

Pena: reclusão, de 2 a 6 anos.

  • Segundo a decisão de Moraes, feita com base no teor completo do vídeo, o deputado praticou o crime descrito na Lei de Segurança Nacional. O artigo também é citado na denúncia feita pela PGR, que considera também vídeos gravados por Silveira em novembro e dezembro de 2020.

Avaliação da professora Scalcon: Novamente, penso ser questionável a existência de "grave ameaça" no caso, porque não há uma ameaça concreta, específica, mas uma fala um pouco genérica. Violência física não houve. Questionável se a pretensão seria a de impedir o "livre exercício" de qualquer dos Poderes, até pela baixa aptidão da conduta do deputado para tanto. Seria crível achar que o STF deixaria de atuar livremente por causa dessa fala?

3) Propaganda de processos violentos ou ilegais

O que disse o deputado: "Eu concordo completamente com o Abraham Weintraub quando falou quando falou eu por mim colocava esses vagabundo na cadeia, aponta para trás, começando pelos ministro do STF. Ele estava certo. Ele está certo. E com ele pelo menos 80 milhões de brasileiros corroboram com esse pensamento"

O que diz a lei: Art. 22 da Lei de Segurança Nacional - Fazer, em público, propaganda:
I - de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social;
IV - de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

Pena: detenção, de 1 a 4 anos.
§ 1º - A pena é aumentada de um terço quando a propaganda for feita em local de trabalho ou por meio de rádio ou televisão.

  • Segundo a decisão do ministro Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou o crime descrito na Lei de Segurança Nacional

Avaliação da professora Scalcon: Aqui o problema reside nas expressões "processos violentos ou ilegais" e o "para alteração da ordem política ou social". Questionável se o deputado realmente estava fazendo propaganda de "processos violentos ou ilegais" (quais seriam exatamente?). Questionável se buscava alterar a "ordem política" (para qual ordem queria alterar?).

4) Incitar subversão e animosidade entre Poderes e Forças Armadas

O que disse o deputado: “Quantas vezes eu imaginei você [Fachin] na rua levando uma surra. O que você vai falar? Que estou fomentando a violência? Não, só imaginei. Ainda que eu premeditasse, ainda não seria crime. Você é um jurista pífio, mas sabe que esse mínimo é previsível. Então, qualquer cidadão que conjecturar uma surra bem dada nessa sua cara com um gato morto até ele miar, de preferência após cada refeição, não é crime"

“Vá lá prende o Villas Bôas, pâ, seja um homem uma vez na tua vida, vá lá e prende o Villas Bôas. Fala para o Alexandre de Moraes, homenzão, né, o fodão, vai lá e manda ele prender o Villas Bôas. Manda, vá lá e prende o general do Exército, quero ver, eu quero ver Fachin, você, Alexandre de Moraes, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes, o que solta os bandidos o tempo todo, né”

O que diz a lei: Art. 23 - Incitar:
I - à subversão da ordem política ou social;
II - à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis;
(...)
IV - à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.

  • Segundo a decisão de Moraes, com base no teor completo do vídeo, o deputado praticou o crime descrito na Lei de Segurança Nacional. O artigo também é citado na denúncia feita pela PGR, que considera também vídeos gravados por Silveira em novembro e dezembro de 2020.

Avaliação da professora Scalcon: É claro que a conduta é muito grave. O problema são as expressões vagas da LSN, própria de outra época. É preciso considerar que estamos usando um remédio amargo neste caso, pois essa lei já serviu para o oposto do que se pretende aqui (garantir a ordem democrática x impedir a democracia).

Novamente não se pode ignorar a alta gravidade do que foi dito. Este trecho me parece um dos mais graves e acho plausível o enquadramento no art. 23 da LSN, pois o verbo é "incitar", diferente de outros crimes anteriores. No mínimo se enquadraria, prima facie, em crime contra a honra dos ministros do STF.

5) Caluniar ou difamar o presidente de um dos Poderes

O que disse o deputado: “Você [Fachin] e os seus dez amiguinhos aí não guardam a Constituição. Vocês defecam sobre a mesma Constituição, que é uma porcaria. Ela foi feita para colocar canalhas sempre na hegemonia no poder. E claro, pessoas da sua estirpe devem ser perpetuadas para que protejam o arcabouço dos crimes do Brasil"

O que diz a lei: Art. 26 da Lei de Segurança Nacional - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação.

Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.

  • Segundo a decisão do ministro Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou o crime descrito na Lei de Segurança Nacional

Avaliação da professora Scalcon: Aqui penso que há subsídios para a denúncia, porém ainda pode haver a discussão se a fala está ou não coberta pela imunidade parlamentar e direito à liberdade de expressão. Avalio que não.

6) Calúnia

O que disse o deputado: “Aí Fachin, quando foram levar o meu celular, poderia. Podia, na verdade. Ninguém falou nada, ninguém mandou um ofício dizendo não é relacionado ao mandato. Mas quando foram apreender o do José Serra, rapidamente quase que num estalar de dedos Toffoli foi lá e de ofício não pode apreender o celular do José Serra, não pode apreender, né, o notebook do José Serra, são relacionados ao mandato. Dois pesos e duas medidas não dá né, chefe? Você vai lá e coloca que um pode e outro não pode. Acontece que no meu celular, não teria o conluio do crime com vocês. No do José Serra, ia ser muita coisa, né? A Polícia Federal vai aca em um impasse gigantesco. la ter a prova da materialidade dos crimes que vocês cometem”

“Seria um pouco diferente, mas eu sei que tem muita gente aí na mão de vocês, e vocês na mão de muita gente. Lá no Senado tem muito senador na mãozinha de vocês. E vocês estão nas mãos de muitos senadores”

O que diz a lei: Art. 138 do Código Penal: Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime.

Pena: detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

  • Segundo a decisão do ministro Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou crimes contra a honra dos ministros da corte, mesma opinião de especialistas ouvidos pela Folha

Avaliação da professora Scalcon: Considero plenamente viável a denúncia, porém ainda pode haver a discussão se a fala está ou não coberta pela imunidade parlamentar e direito à liberdade de expressão. Avalio que não.

7) Difamação

O que disse o deputado: "Barroso, o que ele gosta é de culhão roxo, mas não tem culhão roxo. Fachin covarde, e Gilmar Mendes [faz gesto de dinheiro com as mãos] é isso que tu gosta, né Gilmarzão"

O que diz a lei: Art. 139 do Código Penal: Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena: detenção, de três meses a um ano, e multa.

  • Segundo a decisão do ministro Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou crimes contra a honra dos ministros da corte, mesma opinião de especialistas ouvidos pela Folha

Avaliação da professora Scalcon: Considero plenamente viável a denúncia, porém ainda pode haver a discussão se a fala está ou não coberta pela imunidade parlamentar e direito à liberdade de expressão. Avalio que não.

8) Injúria

O que disse o deputado: "Fachin, seu moleque, seu menino mimado, mau caráter, marginal da lei"

"O que acontece, Fachin, é que todo mundo está cansado dessa cara de vagabundo que tu tem"

O que diz a lei: Art. 140 do Código Penal: Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro

Pena: detenção, de um a seis meses, ou multa.

  • Segundo a decisão do ministro Moraes, que considera o teor completo do vídeo, o deputado praticou crimes contra a honra dos ministros da corte, mesma opinião de especialistas ouvidos pela Folha

Avaliação da professora Scalcon: Considero plenamente viável a denúncia, porém ainda pode haver a discussão se a fala está ou não coberta pela imunidade parlamentar e direito à liberdade de expressão. Avalio que não.

9) Desacato

O que disse o deputado: "E se eu não quiser botar? Se a senhora falar mais uma vez eu não boto. Respeito que não está falando com vagabundo, não. A senhora é policial civil, eu também sou polícia, e aí? Sou deputado federal, e aí?", disse. "Folgada pra caralho."

O que diz a lei: Art. 331 do Código Penal: Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela.

Pena: detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

  • As falas do deputado foram dirigidas para uma policial civil que pediu para que ele usasse a máscara no IML (Instituto Médico Legal), do Rio de Janeiro. O deputado elevou a voz e apontou o dedo para a policial, reação que foi gravada e publicada por ele

Avaliação da professora Scalcon: Considero que a denúncia seria viável, embora o desacato seja um crime cuja constitucionalidade vem sendo questionada, em razão do contexto autoritário da sua criação. Me alinho a essa crítica.

10) Coação no curso do processo

O que disse o deputado: "Por mim, claro, se vocês forem retirados daí, seja por nova nomeação, seja por aposentadoria ou por pressão popular ou seja lá o que for, claro que vocês serão presos porque vocês serão investigados, porque vocês não terão mais essa prerrogativa"

"Eu só quero um ministro cassado, para os outros dez idiotas pensarem: eu não sou intocável"

O que diz a lei: Art. 344 do Código Penal - Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral:

Pena: reclusão, de um a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

  • Segundo a denúncia apresentada pela PGR, que considera também vídeos gravados por Silveira em novembro e dezembro de 2020, o deputado cometeu o crime previsto no artigo três vezes.

Avaliação da professora Scalcon: Não há violência física. A grave ameaça aqui novamente é questionável. A fala beira o delírio.

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