Zero problema com Lira, diz Bolsonaro um dia após ameaça de presidente da Câmara

Líder do centrão havia cobrado mudança de rumos do governo na pandemia; nesta quarta se encontrou com Bolsonaro

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Brasília

Um dia após o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ter cobrado uma mudança de rumos do governo na pandemia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou que não existe "problema nenhum" entre ele e o parlamentar, principal líder do centrão e eleito para o comando da Casa com apoio do Planalto.

Na quarta-feira (24), Lira subiu o tom contra o governo federal e afirmou que a crise atual pode resultar em "remédios políticos amargos" a serem usados pelo Congresso, alguns deles fatais. Foi a primeira vez que Lira faz menção, mesmo que indireta e sem especificar, à ameaça de CPIs e de impeachment contra o presidente da República.

Já nesta quinta-feira (25) Bolsonaro se reuniu com Lira no Palácio do Planalto. Após a conversa, o presidente fez algo incomum. Acompanhou o líder do centrão até seu carro e, depois, quando retornava ao seu gabinete, passou pelo térreo do Planalto, local em que raramente transita.

Neste momento, foi abordado por jornalistas, que lhe perguntaram sobre a fala de Lira na véspera.

"Eu conversei com o Lira, não tem problema nenhum entre nós, zero problema. Conversamos sobre muitas coisas: o que nós queremos juntos é buscar maneira de contratarmos mais vacinas. Na ponta da linha, fazer que chegue as informações de que as vacinas estão sendo realmente aplicadas. Isso que nós queremos."

Nessa rápida entrevista, Bolsonaro também se referiu a Lira como um "velho amigo de Parlamento".

No dia anterior, Lira subiu o tom contra o governo em discurso durante sessão para votar projeto que autoriza deduções no Imposto de Renda a empresas e pessoas físicas que contratarem leitos privados para que o SUS use para tratar pacientes de Covid-19.

O presidente da Câmara falou no risco de uma "espiral de erros de avaliação", disse que não estava “fulanizando” e que se dirigia a todos os que conduzem órgãos diretamente envolvidos no combate à pandemia. “O Executivo federal, os Executivos estaduais e os milhares de Executivos municipais também”, afirmou.

Apesar de dizer não ser justo colocar toda a culpa em Bolsonaro, ele cobrou correção de rota, fez críticas ao trabalho do ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e falou em tom de ultimato.

"Estou apertando hoje um sinal amarelo para quem quiser enxergar", disse Lira, afirmando que o caos na saúde gerado pela crise de Covid-19 precisa ser um fator de conscientização das autoridades envolvidas no sentido de "que o momento é grave” e que “tudo tem limite”.​

Segundo Lira, é preciso buscar a “união de todos” e esgotar “todas as possibilidades deste caminho antes de partir para as responsabilizações individuais”.

“Os remédios políticos no Parlamento são conhecidos e são todos amargos. Alguns, fatais. Muitas vezes são aplicados quando a espiral de erros de avaliação se torna uma escala geométrica incontrolável”, afirmou.

“Não é esta a intenção desta presidência. Preferimos que as atuais anomalias se curem por si mesmas, frutos da autocrítica, do instinto de sobrevivência, da sabedoria, da inteligência emocional e da capacidade política”, disse Lira.

Um episódio de desgaste na relação de Lira com Bolsonaro envolveu a troca do general Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde. O nome chancelado pelo presidente da Câmara era o da cardiologista ​Ludhmila Hajjar, mas Bolsonaro optou pelo cardiologista Marcelo Queiroga.

A aliança Bolsonaro-centrão, buscada pelo presidente no ano passado diante de uma série de pedidos de impeachment que se acumulavam na Câmara, enterrou de vez o discurso bolsonarista, explorado à exaustão durante a campanha eleitoral, de que não se renderia ao que chamava de a velha política do “toma lá, dá cá”.

Para atender o centrão e ajudar na eleição de Lira para o comando da Câmara, o governo faz promessas de liberação de bilhões em emendas parlamentares e chegou a cogitar até a recriação de ministérios, contrariando outro discurso da campanha, o do enxugamento da máquina pública.

Na segunda-feira (22), sem citar nominalmente Bolsonaro, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), criticou duramente quem adota uma postura negacionista frente à pandemia, argumentando que esse tipo de comportamento se tornou uma “brincadeira de mau gosto, macabra e medieval”.

No discurso desta quarta, Lira propôs adotar um esforço concentrado para a pandemia por duas semanas, atrasando a tramitação de outros projetos para votar textos que tenham como objetivo ajudar no enfrentamento da Covid.

“E CPIs ou lockdowns parlamentares, medidas com níveis decrescentes de danos políticos, devem ser evitados. Mas isso não depende apenas desta Casa”, afirmou o líder do centrão. “Depende também, e sobretudo, daqueles que fora daqui precisam ter a sensibilidade de que o momento é grave, a solidariedade é grande, mas tudo tem limite.”

Aliados de Lira leram o discurso como uma forma de o presidente da Câmara apertar o botão amarelo em relação às atitudes de Bolsonaro. Isto é, o mandatário assumiu o compromisso de tomar as rédeas e comandar o combate ao novo coronavírus. Caso o presidente falhe na missão e reforce teses negacionistas, o Congresso poderia tomar "remédios amargos", "alguns, fatais".

A pessoas próximas , porém, Lira minimizou o teor do pronunciamento e disse que se referiu à gestão "tripartite" da saúde e da pandemia para demonstrar que seu objetivo não era cobrar somente Bolsonaro.

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