Impeachment de Bolsonaro é perda de tempo; vamos ganhar no voto, diz Paes

Prefeito do Rio defende pré-candidatura de Eduardo Leite e oferece DEM para abrigar o projeto presidencial

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Rio de Janeiro

Mobilizar um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro é “perda de tempo”, e os partidos de centro devem construir consensos mínimos para oferecer uma alternativa em 2022 e “vencer no voto”, afirma o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (DEM).

O voto de Paes, neste momento, está direcionado para o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB). Ele inclusive ofereceu o DEM para abrigar o projeto presidencial do gaúcho caso o embate interno com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), não se solucione.

“Tem um dever de casa do DEM, de modernizar o partido, se colocar como uma alternativa no projeto nacional a partir de 2022 e, eventualmente, atrair o Eduardo Leite. Não tenho problema em apoiá-lo no PSDB, mas as circunstâncias dele lá não conheço”, afirmou.

À Folha ele afirmou não ver crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente, classificando seus atos como “verborragia”. Ele comparou as tentativas de tirar Bolsonaro do cargo ao processo contra a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), cujo afastamento ele considera um erro.

“Não acho que temos de fazer, como fizeram com a Dilma, ficar todo dia pedindo impeachment. Vamos ganhar no voto. A não ser que seja um motivo que junte o crime de responsabilidade com a dimensão política que um processo desse deve ter”, declarou, em entrevista, na última quarta-feira (14).

Por que o sr. decidiu apoiar a pré-candidatura de Eduardo Leite? Tem uma premissa importante: estamos falando de um quadro da política. Chega de invencionices.

A ideia é buscar dentro da política quem tem mais capacidade de representar essa adaptação entre uma visão diferente na forma de fazer política, trazendo novas práticas, modernizando a gestão, e a qualidade inerente aos políticos que é construir pontes, estabelecer consensos e entender o sofrimento dos outros. Não quero um CEO para o meu país.

Os últimos candidatos que venceram a eleição presidencial trabalharam esse projeto por muitos anos. Um nome que surge um ano e meio antes vai ter viabilidade eleitoral? Tenho certeza porque ele é político. Tem uma história para contar, uma narrativa. História de mandato parlamentar, de assumir muito jovem uma prefeitura, conduzir muito bem ela e não disputar a reeleição. Elegeu a vice dele e venceu a disputa para governador. Não há mais espaço para invenção de um nome de fora da política que tem que inventar uma história.

O sr. se refere ao [apresentador Luciano] Huck? Me refiro a todos. O Huck tem uma dimensão pública, mas ele é candidato?

Por que Doria não tem a mesma capacidade de agregar? Sou um admirador do governador Doria. Mas ele não deixa nem tempo para a gente elogiá-lo. Todo dia a gente acorda com a foto dele junto com a vacina.

Ele tem um serviço prestado ao Brasil e todos seremos eternamente gratos em relação à vacina. Mas a política precisa juntar essa capacidade de fazer, que ele tem, escolher as políticas corretas, construir consensos, dialogar muito e não ter preconceitos.

De uma forma educada, o sr. está chamando ele de marqueteiro. Não. Se fosse marqueteiro, talvez estivesse numa situação de mais gratidão da população em relação ao belo trabalho que ele fez. Talvez não seja tão bom marqueteiro assim.

Por que esse comportamento dele desagrega? Não tenho críticas ao Doria. Quero falar a favor do Eduardo Leite. Vejo nele essa capacidade de gestão e de construir consenso que o Brasil precisa, que dialogue com todos os campos. Prefiro me focar nas qualidade do governador Eduardo Leite do que nos eventuais defeitos do Bolsonaro, Ciro [Gomes], Lula, Doria. Todos personagens que, em algum grau, merecem meu respeito.

O que há no governo de Eduardo Leite para agregar a essa narrativa em seu favor? Ele fez um super ajuste no Rio Grande do Sul. Conseguiu construir consensos políticos para essas reformas, o que é muito difícil com a política polarizada que o estado tem.

O PSDB é o maior partido na Assembleia gaúcha? Não. E ele consegue maioria. Loteou o governo para isso? Não. Ele acena de outro jeito. Será que ele acena dizendo não ser candidato à reeleição e, portanto, o permite reconstruir o estado? Isso é um desprendimento fantástico.

O sr. acha que ele vai demonstrar isso como candidato a presidente? Não é um tema. É uma decisão dele de entender, se achar o melhor caminho, de dizer que é candidato por um mandato. É difícil acreditar nisso entre políticos. Todo mundo começa com essa conversa, mas muda de opinião. No caso da experiência pregressa dele, dá até para acreditar. Ele tem autoridade suficiente para isso. Mas é uma decisão dele.

O sr. é o primeiro nome de fora do PSDB a se colocar enfaticamente na defesa dele. Ainda fala como membro do DEM? Eu manifesto minhas opiniões. Rodrigo Maia é minha referência na política nacional. Quero manter assim. Ele está discutindo a situação partidária dele, e ouço muita gente que quer que ele permaneça [no DEM].

Tem um dever de casa do DEM, de modernizar o partido, se colocar como uma alternativa no projeto nacional a partir de 2022 e, eventualmente, atrair o Eduardo Leite. Não tenho problema em apoiá-lo no PSDB, mas as circunstâncias dele lá não conheço.

Meu esforço vai ser para que as desavenças pessoais se resolvam, como é o caso de Rodrigo Maia e ACM Neto. Mas precisamos criar no partido condições para que o projeto nacional seja claro.

No momento dessa cisão, Maia disse que o DEM estava indo para a extrema direita. É o que temos que evitar. Se for por esse caminho, nem Rodrigo Maia nem eu gostaríamos. O ACM Neto não é um sujeito da extrema direita.

Eduardo Leite tem evitado fazer uma oposição frontal ao presidente Bolsonaro, diferente do Doria. Que posicionamento o DEM deve ter em relação ao governo? Não acho que ninguém pode ser oposição a tudo. Eu sou, por princípio, contra essa conversa de impeachment. O Brasil tem que parar com essa mania de querer “impichar” todos os presidentes.

Todo presidente que entra é um “fora”. Não dá. Ele ganhou a eleição, tem uma mandato até 2022. Deixemos ele governar e a avaliação popular mostrar se ele merece continuar ou não. Aliás, era o que deveriam ter feito com a presidente Dilma.

O DEM tem que ter uma posição de independência. Se tiver boas propostas, vota a favor. Mas não deve ser base de qualquer coisa desse governo.

Me relaciono bem com o governo federal institucionalmente. Ninguém vai ver da minha parte uma agressão ao presidente ou ao mandato que ele conquistou pelo voto popular, gostemos ou não.

O sr. acha que ele não cometeu nenhum crime de responsabilidade? Não sou especialista. Digno de um impeachment, retirar um sujeito eleito, como as contas da Dilma não eram... Impeachment é um processo político, precisa de algo muito forte para isso.

Vamos ao último fato. O presidente da República trabalhando contra a instalação de uma CPI contra o seu governo é algo absolutamente normal, que todos os chefes de Executivo fazem. A diferença é que o dele foi gravado [em conversa com o senador Jorge Kajuru].

E estimular processos de impeachment contra ministros do STF? Ele fala isso abertamente. Esse é o erro dele. Mas aí é o seguinte: o Brasil deseja um presidente que confronte as instituições? Eu não desejo. As instituições são fortes o suficiente para não se enfraquecer de uma verborragia dessas.

É um absurdo o presidente falar daquela maneira. Mas ali é uma verborragia. Qual o gesto concreto? Não acho que temos de fazer, como fizeram com a Dilma, ficar todo dia pedindo impeachment. Vamos ganhar no voto. A não ser que seja um motivo que junte o crime de responsabilidade com a dimensão política que um processo desse deve ter.

350 mil mortos? Se perguntar para mim se há uma péssima gestão da Covid-19, é claro que há. São absurdos que aconteceram no Brasil. Esse é um motivo para enfraquecê-lo muito e deixá-lo numa situação muito ruim. Vai se apurar as responsabilidades, vai ter a CPI.

O que quero dizer é: não esperem de mim alguém que vá querer desestabilizar o governo. Quero estar atento para que o governo não desestabilize as instituições. Não me parece que elas estejam fracas para isso.

Para mim, essa conversa é perda de tempo. Temos que tratar de como construir consensos, como diminuir pobres, como gerar empregos, como voltar a crescer. São seis anos de crise econômica.

Lula não tem essa capacidade de reunir o centro? Lula é de centro. Nunca achei que ele fosse de esquerda. Governei com o Lula. Líder político excepcional que fez o Brasil avançar enormemente, com uma visão federativa. É um superquadro da política. Fico feliz que esteja de volta na disputa eleitoral.

Por que ele não pode, então, ser esse nome de centro? Estou dizendo o nome que mais me agrada. Falta um ano para a eleição começar. O nome que eu quero é Eduardo Leite. Isso não quer dizer que sou contra o Lula. Pelo contrário, dialogo com o PT aqui.

No Rio o sr. tem participado de discussões sobre uma aliança envolvendo até o [deputado Marcelo] Freixo. Aqui o sr. defende uma aliança mais ampla? O Rio precisa de uma aliança mais ampla. Aqui eu não parto de um nome, mas de uma necessidade. A situação é muito crítica e é inaceitável que o Rio continue vivendo o que tem vivido. São necessários consensos mínimos, pautados principalmente na segurança pública. No dia seguinte a gente briga sobre outras coisas. Se o Freixo, o [deputado Alessandro] Molon, o [ex-prefeito de Niterói] Rodrigo Neves, o [presidente da OAB] Felipe Santa Cruz, o [secretário] Chicão Bulhões conseguirem fazer essa reunião… Há um conjunto de boas figuras, das quais algumas penso muito diferente, para reconstruir o Rio.

Tanto no plano nacional como no regional seus movimentos podem ser lidos como uma articulação antibolsonarista. A única exigência que faço nessa aliança é que o nosso candidato a governador dessa frente ampla no Rio receba em seu palanque todas as candidaturas presidenciais que fizerem parte dela. Porque precisamos de consensos mínimos. Eu jamais vou me unir em frente anti alguma coisa. É frente pró alguma coisa.

Cláudio Castro não pode ser esse nome? Ele é um sujeito excepcional. Cumpre uma missão quase heróica. Mas estamos falando de um projeto de resgate do Rio de Janeiro. Acho que o Cláudio tem muita dificuldade de juntar essas forças políticas todas. Se tiver…

Embora não queira se colocar como anti nada, o sr. tem tido conflitos políticos claros com o vereador Carlos Bolsonaro. Ele é um vereador como tantos outros. Não tenho costume de deixar qualquer coisa sem resposta. O argumento que ele usou para o meu líder de governo [ao votar contra o projeto de lei para aumentar taxação de servidores aposentados] foi: “O Eduardo está muito próximo da esquerda, parecendo um comunista”. E aí é ele quem vota com os comunistas. Foi ele quem acompanhou o PSOL.

É a opinião dele, mas não posso deixar de destacar. Tem uma incoerência familiar. Mas é normal. Deve ter sido duro para ele o período em que o pai fazia um rolo compressor em Brasília para fazer a Reforma da Previdência.

RAIO-X

Eduardo Paes (DEM), 51
Está em seu terceiro mandato como prefeito do Rio de Janeiro. Administrou antes a cidade entre 2009 e 2016. Ex-vereador e ex-deputado, Paes perdeu a eleição para o governo estadual para Wilson Witzel (PSC) em 2018. É formado em direito pela PUC-Rio. Casado, tem dois filhos

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