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Entidades cobram Supremo para reverter 'grave injustiça' em caso de jornalista ferido em manifestação

Organizações pressionam ministros após decisão anterior que culpou profissional por ter sido atingido por bala de borracha

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Mogi das Cruzes (SP)

A retomada do julgamento pelo STF (Supremo Tribunal Federal) do recurso do repórter-fotográfico Alex Silveira, que perdeu a visão após ser atingido por uma bala de borracha durante cobertura jornalística, tem mobilizado organizações que atuam em defesa do jornalismo e dos direitos humanos.

A corte volta a julgar o caso em 9 de junho.

Já assinada por 16 organizações, entre elas a Artigo 19 e a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) —amicus curiae (amigo da corte) no caso—, uma carta aberta endereçada aos ministros afirma que o julgamento é um momento crucial para corrigir "uma grave injustiça que marca um dos episódios mais emblemáticos de violência contra comunicadores em contexto de protestos no país".

“Quando a polícia extrapola suas prerrogativas e reprime violentamente manifestantes e comunicadores, ignorando direitos consagrados pela Constituição Federal, é dever do Judiciário zelar pela garantia desses direitos, o que passa pela reparação das vítimas e pela responsabilização dos órgãos de segurança pública”, diz o texto.

Alex Silveira, então fotógrafo do jornal Agora, quando foi atingido por uma bala de borracha perto do olho direito durante o protesto de funcionários públicos na avenida Paulista, em São Paulo - Caio Guatelli - 18.mai.2000/Folhapress

A decisão do Supremo terá repercussão geral, o que significa que servirá como base para julgamentos futuros de casos de jornalistas feridos por policiais na cobertura de protestos.

Em maio de 2000, Silveira atuava no jornal Agora —do Grupo Folha— quando cobria uma manifestação de servidores públicos na avenida Paulista. Na ocasião, ele teve o olho esquerdo atingido por um disparo feito por um policial militar.

O profissional, que já tinha o olho direito comprometido por uma doença congênita, ficou com apenas 15% de visão no esquerdo. Em 2020, Silveira falou sobre o episódio à Folha.

“Minha vida mudou absurdamente. Há 20 anos tenho uma cicatriz que vou carregar para o resto da vida, independentemente do dinheiro que eu receba. Hoje enxergo cores e formas, só consigo identificar as pessoas que estão a dois metros de distância de mim”, afirmou.

A busca por reparação na Justiça teve uma decisão favorável em primeira instância, em fevereiro de 2008, quando o estado de São Paulo foi condenado a ressarcir despesas médicas e o pagar 100 salários mínimos por danos morais a Silveira.

Em agosto de 2014, porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo reviu a decisão e afirmou que a culpa pelo acidente foi do próprio Silveira porque ele “permaneceu no local de tumulto” e, com isso, “colocou-se em quadro no qual se pode afirmar ser dele a culpa exclusiva do lamentável episódio do qual foi vítima”.

A decisão foi recebida com protesto por profissionais de imprensa. Na carta aberta aos ministros do STF, as organizações afirmam que a decisão do judiciário paulista "chancela a conduta violenta da polícia no estado, incentivando, assim, a ocorrência de novas violações no contexto de protestos".

"A decisão do TJ-SP, somando-se a outras semelhantes, fomenta a violência policial, a repressão seletiva, as perseguições aos comunicadores e a obscuridade da ação policial, violando garantias intrínsecas a um Estado democrático.”

Desde então, a defesa, que tem na equipe as advogadas Taís Gasparian e Virginia Garcia, tem apresentado recursos às cortes superiores para tentar reverter a decisão, mas sem sucesso. A negativa mais recente é de 2018, dada pela 1ª turma do Superior Tribunal de Justiça, com base no voto do ministro relator Gurgel de Faria.

O julgamento em plenário virtual no STF começou em agosto de 2020, mas foi suspenso após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio Mello, acolheu o recurso e afirmou que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo “viola o direito ao exercício profissional, o direito-dever de informar, conclusão sobre a culpa exclusiva de profissional da imprensa que, ao realizar cobertura jornalística de manifestação pública, é ferido por agente da força de segurança”.

O magistrado afirmou que o momento atual revela a necessidade de assegurar o exercício profissional da imprensa, que deve contar não só de ambiente livre de agressão, “mas também de proteção, por parte das forças de segurança, em eventual tumulto”.

O ministro enfatizou ainda a conduta pacífica do profissional e o desrespeito de padrões internacionais de atuação pelos profissionais de segurança pública no episódio.

“A Polícia Militar deixou de levar em conta diretrizes básicas de conduta em eventos públicos, sendo certo que o fotojornalista não adotou comportamento violento ou ameaçado”.

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