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Coronavírus CPI da Covid

Protestos nas ruas servem a Lula e abrem nova frente contra Bolsonaro

Movimentação de nicho mobiliza mais do que nunca no governo fragilizado do presidente

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São Paulo

Os protestos deste sábado (29) contra Jair Bolsonaro abrem mais uma fissura no dique do Planalto, já bastante abalado por uma sucessão de problemas puxada pela CPI da Covid.

Ato contra Bolsonaro na avenida Paulista, principal palco de protestos em São Paulo
Ato contra Bolsonaro na avenida Paulista, principal palco de protestos em São Paulo - Mathilde Missioneiro/Folhapress

Afinal de contas, não se via gente na rua de forma tão notável contra o mandatário desde meados de 2020, no auge do ensaio de crise institucional promovida pelo presidente, só arrefecida com a prisão do amigão Fabrício Queiroz em junho daquele ano.

Desde então, apenas bolsonaristas davam as caras de forma mais assertiva, como os protestos motociclísticos e as aglomerações incentivadas por Bolsonaro nas últimas semanas deixaram mais claro.

Isso dito, os atos foram inequívocas expressões da estratégia de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visando 2022, a despeito da óbvia justificativa da pauta em questão. Isso é significativo do momento político, mas limita naturalmente o efeito de longo prazo dos protestos.

Que há muita gente irritada com a condução do país sob a pandemia por Bolsonaro, os 54% de rejeição apontados pelo Datafolha deixam claro.

Que elas concordem em associar isso a uma agenda de promoção da candidatura de Lula, como se viu em vários pontos, os 36% que rejeitam liminarmente o ex-presidente são eloquentes sobre a asserção.

Há um valor político intrínseco em protestos com alguma densidade, como o fermento dos atos de 2013 que degeneraram em Bolsonaro demonstram. Como qualquer senador da CPI vai dizer, "a rua" muda tudo.

Essa entidade é vista como parte do tripé sagrado dos impeachments, ao lado da crise econômica e da perda de sustentação congressual. A piora da inflação da vida real e do desemprego estão aí, mas por ora o centrão segura as pontas de Bolsonaro no Legislativo.

Assim, as ruas se mostram como novo ingrediente no desgaste do presidente, que viu até o risco sugerido de um apagão ou ao menos de aumento certo na conta da energia adicionados à sua fatura nesta semana.

Por óbvio, nada que enseje hoje ideias de impeachment. A teoria adotada pela oposição a Lula em 2005, de deixá-lo sangrar durante o mensalão pensando numa derrota no ano seguinte, que se mostrou falha, agora é utilizada pelo PT.

São ruas à esquerda, sim, com forte participação de setores que eram orgânicos do campo, como sindicatos e afins. Mas havia público também, no sentido de sociedade civil, ainda que pertencente ao nicho.

Em pontos como Rio e São Paulo, o tiro no pé foi óbvio: houve aglomeração, apesar da prevalência de máscaras.

Como se sabe, Lula não pode mais contar com os exércitos de João Pedro Stédile, por assim dizer, até porque essa é metade do caminho para perder a eleição.

O Brasil ainda é fortemente antipetista, ainda que o antibolsonarismo esteja numa ascensão forte, que remonta às divisões da direita no pós-impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Essa classe média incomodada já havia sinalizado vida nos atos contra cortes na educação em 2019, mas foi naturalmente abandonando as ruas com a progressão do Sars-CoV-2. Sua fatia à esquerda foi a primeira a se manifestar, mas é incerto que o restante tem ânimo e organização para o mesmo.

Para Bolsonaro, como sempre, há vantagens no ocorrido. A profusão de foices e martelos e slogans que soam mal à maioria conservadora do país jogam, ao fim, a seu favor.

E a velha tática de cantar o medo do caos, temperada por gritos de "meu Exército", está sempre à mão. Mas como incidentes mais complicados só ocorreram pontualmente, como nos conflitos em Recife, por ora isso não cola.

Bolsonaro está mais impopular do que nunca. Lula claramente acredita que não há candidatura de João Doria e sua vacina ou terceira via inaudita prontas a tomar o seu lugar contra Bolsonaro: o risco para o petista é alguém ocupar o lugar do presidente e retomar o papel de anti-Lula em 2022.

Mas esse é um jogo que não está jogado, e as placas tectônicas políticas que tremeram no sábado, e só quem não sabe ler uma fotografia da avenida Paulista nega isso, são apenas movimentos iniciais dele.

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