Vamos brigar para aprovar cota de 30% para mulheres, diz presidente de movimento de formação de candidatas

Talita Nascimento encabeça o Vamos Juntas, que em 2020 apoiou 51 mulheres nas eleições

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Brasília

A reforma política deve aprovar cotas de ao menos 30% das cadeiras do Legislativo para mulheres, defende Talita Nascimento, presidente do Vamos Juntas, movimento de formação de candidatas criado em 2019.

O Congresso discute o estabelecimento de cotas de 15%. Hoje, os partidos são obrigados a destinar 30% dos recursos eleitorais para candidatas mulheres.

“É claro que 15% de cota é melhor do que nada e a gente vai defender isso, mas 30% é o que faz mais sentido considerando a regra do financiamento”, afirma Talita, que é também chefe de gabinete da deputada Tabata Amaral (PDT-SP) —a congressista é presidente de honra do Vamos Juntas.

Uma mulher branca, de cabelos castanhos, veste uma blusa rosa e vermelha e está sentada em um pufe preto e um salão de carpete verde
Talita Nascimento, presidente do Vamos Juntas, que atua na formação de candidaturas femininas e apoio a parlamentares mulheres, no salão verde da Câmara dos Deputados - Pedro Ladeira/Folhapress

O Vamos Juntas formou 51 candidatas e elegeu 11 em seu projeto piloto, com trabalho voluntário. Agora, o movimento quer se institucionalizar para ampliar as candidaturas para 400 em 2022.

O financiamento se dá por meio de editais, como o do Instituto Update, voltado para inovação política, e também campanhas de arrecadação online.

A presidente do movimento afirma que é importante que as candidatas “entendam o papel da mulher na política”, mas diz que mesmo no espectro conservador o aumento de mulheres é importante.

“A bancada feminina aqui na Câmara é bastante diversa, tem mulheres mais à direita e mais à esquerda, mas que em temas que envolvem principalmente participação da mulher na política acabam sendo unidas”, diz. “Entre um homem conservador e uma mulher conservadora, eu prefiro a mulher.”

Como surgiu o Vamos Juntas? Surgiu no final de 2019 como uma pauta da deputada Tabata Amaral, que tinha essa ideia de que a gente precisava eleger mais mulheres para a política. Para isso, a gente precisava enfrentar barreiras de financiamento, comunicação, suporte mesmo. E além da capacitação técnica, era preciso montar uma rede.

Como é o processo de seleção de candidatas? Em 2020, tivemos mais de 2.000 inscritas e selecionamos 51 candidatas, porque o trabalho era 100% voluntário. A gente não tinha uma estrutura para fazer mais do que isso e, como era um projeto piloto, queríamos formar um número menor, mas fazer bem feito.

A diversidade é um critério importante. Tivemos candidatas de todas as regiões do Brasil, na ideia de tentar furar a bolha e não formar só aquelas pessoas do Sudeste que a gente já conhece.

Outro critério foi a diversidade partidária, para ser um movimento suprapartidário, mas tinha um requisito: mulheres que entendessem o seu papel de mulher na política, mulheres que sabiam da importância do feminismo, sabiam da importância da igualdade de gênero. Esse foi um ponto que a gente levou muito em consideração porque a gente entende que é isso que faz diferença uma vez estando lá.

E o que planejam para a próxima eleição? Elegemos 11 mulheres, o que é uma taxa bem alta considerando outros movimentos parecidos. E agora? Não adianta só a gente ter uma questão de justiça representativa, elas estarem lá, se a gente não conseguir apoiá-las para fazerem um bom trabalho.

O que a gente tem trabalhado ao longo desse ano são cursos pensando em política de gênero, abordando também temas que são geralmente restritos aos homens. Fizemos um painel específico de Orçamento, que a gente quer que as mulheres participem mais, porque no fundo é ali que se consegue ter política de combate à violência doméstica, política de igualdade de gênero e por aí vai.

E precisamos expandir a rede. Para 2022 a gente quer expandir para 400 líderes. Não queremos criar candidatas, tirar da cartola, queremos pegar mulheres que já são lideranças políticas em suas comunidades, mas falar para elas “olha você pode ser uma deputada federal, uma vereadora”.

A sra. falou que buscam candidatas que entendam o feminismo. Na Câmara, em 2018, as mulheres de direita foram parte das responsáveis pelo aumento de representatividade feminina. Como veem isso? A nossa preocupação não é se pessoa é de direita ou de esquerda. A nossa preocupação é a mulher saber que o papel dela enquanto mulher na política é diferenciado.

E aí eu sempre brinco que a mulher conservadora não está pegando espaço de uma mulher de esquerda, ela está pegando o espaço de um homem conservador. Eu acho que isso já é uma diferença.

A bancada feminina aqui na Câmara é bastante diversa, tem mulheres mais à direita e mais à esquerda, mas que em temas que envolvem principalmente participação da mulher na política acabam sendo unidas.

Claro que temos as mulheres mais extremas, como temos também homens assim, e isso pode prejudicar algum debate. Mas no geral eu vejo isso como algo positivo. Entre um homem conservador e uma mulher conservadora, eu prefiro a mulher.

Na discussão de reforma política há a possibilidade de criar cotas de 15% das cadeiras para as mulheres. Há quem considere retrocesso. Como o Vamos Juntas se posiciona? A nossa preocupação com isso é que temos hoje uma cota de 30% de financiamento, e para nós faz sentido que essa seja a cota de mulheres. É claro que 15% de cota é melhor do que nada e a gente vai defender isso, mas 30% é o que faz mais sentido considerando o financiamento do TSE [Tribunal Superior Eleitoral]. É isso que a gente vai se organizar para tentar aprovar.

Em 2018, as mulheres foram 15% das eleitas para a Câmara. Faz sentido criar uma cota nesse percentual? Hoje nós temos 15%, mas foi uma questão circunstancial, não sabemos se vai continuar. Quando a gente garante a cota é um avanço com certeza, mas é claro que a gente gostaria de um avanço maior. Se for por uma linha mais radical, o ideal seria respeitar a proporção da população, em que as mulheres são mais da metade.

Algum outro ponto da reforma política é importante para a paridade de gênero? Nós somos contra o distritão, que ainda não é uma posição oficial do grupo da reforma política, mas há rumores de que pode entrar.

Por quê? O Movimento Acredito fez uma análise com as eleições de 2018, aplicando o distritão. E o número de mulheres diminui consideravelmente [pelos resultados, quatro deputadas teriam sido substituídas por homens]. O número de candidaturas negras também diminui [nove deputados seriam substituídos por brancos]. O distritão é uma forma de manter as mesmas pessoas na política.

Como impedir as candidaturas laranjas no caso das cotas de 30% de financiamento? O principal ponto da candidatura laranja é a fiscalização. E outro ponto de fiscalização que falta está na questão dos 5% para formação. Os partidos têm hoje um recurso do TSE que estão obrigados a utilizar na formação de candidaturas mulheres, mas que não são utilizados na prática.

Em 2020, apenas uma mulher foi eleita prefeita em uma capital. Há mais barreiras no Executivo? É uma candidatura mais cara, e que geralmente as pessoas têm uma preocupação maior na hora do voto e acabam tendo mais preconceito. E aí eu acho que os ataques também são maiores.

Uma candidata a prefeita do Vamos Juntas recebeu muito ataque sempre com conotação sexual, falaram que ela estava tendo um caso com o antigo prefeito. Esse preconceito no âmbito do Executivo fica mais forte porque tem mais visibilidade. Incomoda mais uma mulher prefeita que vereadora, governadora do que deputada.

Essas barreiras estão nos partidos também? Existe um falso mito de que tem poucas mulheres nos partidos ou que as mulheres não participam da política partidária. A gente tem um número alto de mulheres que fazem política partidária. Eu acho que aí é mais a barreira de novo preconceito dentro do partido.

A gente vê isso muito no financiamento, o doador acha que o candidato homem tem mais chance de ganhar as eleições que a mulher, então financia mais os homens do que as mulheres. E é a mesma coisa no partido, que acha que ter uma candidatura masculina tem mais chances na eleição e aí é isso mesmo que acontece.

Raio-X

Talita Nascimento, 34
Nascida em São Paulo (SP), é formada em direito pela USP e mestre em políticas educacionais pela Universidade Columbia (EUA). Foi coordenadora geral no Ministério da Educação, consultora da Unesco, gerente do Instituto Sonho Grande e pesquisadora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV. Atualmente, é chefe de gabinete da deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP) e presidente do Instituto Vamos Juntas

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