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Controladoria da União confirma ida de vendedor de vacina à Saúde e abre apuração sobre denúncia de propina

Luiz Paulo Dominguetti Pereira afirmou à Folha que recebeu pedido de propina de ex-diretor do ministério

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Brasília

O ministro da CGU (Controladoria-Geral da União), Wagner Rosário, disse nesta quarta-feira (30) que abrirá investigação sobre suposto pedido de propina feito em negociação do governo Jair Bolsonaro por vacinas, revelado pela Folha, e confirmou que Luiz Paulo Dominguetti Pereira esteve no Ministério da Saúde.

Dominguetti se apresenta como representante da Davati. Ele afirmou em entrevista à Folha que recebeu de Roberto Ferreira Dias, então diretor de Logística do ministério, pedido de propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato por doses da AstraZeneca.

"Verificamos que no dia 26 de março (emails e Dominguetti sustentam que a reunião ocorreu, na verdade, em 26 de fevereiro), às 13h39, esse Luiz Paulo Dominguetti Pereira esteve no Ministério da Saúde. Não sei ainda com quem ele se reuniu, mas ele esteve", afirmou Rosário à CNN Brasil.

O ministro disse que ainda não há confirmação de que Dominguetti e Dias se encontraram em um restaurante em Brasília, na noite de 25 de fevereiro, onde o então chefe da área de compras da Saúde teria feito o pedido de propina.

Segundo o ministro, a oferta de Dominguetti por vacinas não está registrada no sistema do Ministério da Saúde. Emails obtidos pela Folha, porém, mostram que a pasta negociou a venda com os representantes da Davati.

"Temos de verificar agora os emails trocados pelo servidor Roberto Dias, que foi o que em princípio se reuniu com ele. Nós não temos a confirmação", disse Rosário à CNN Brasil.

O ministro afirmou que há registro no sistema do Ministério da Saúde apenas de proposta apresentada em 9 de março pelo advogado Júlio Caron, em nome da Davati. Ele ofereceu 300 milhões de doses da AstraZeneca.

Em 28 de abril, a área técnica da Saúde disse que a oferta de Caron era "improcedente", pois a AstraZeneca já havia dito que só realizava negociações diretamente com o governo.

O advogado confirmou à Folha que procurou o ministério, mas disse que desistiu das negociações após a Davati não responder a questionamentos sobre número de lote e outras características das vacinas prometidas.

Segundo Rosário, a Saúde mostrou, ao barrar a oferta enviada pelo advogado, que tem mecanismos de "controle interno" que impedem fechar contrato com empresas não autorizadas pelas farmacêuticas para a venda das vacinas.

O diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias
O diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias - Marcello Casal Jr.-29.jun.2021/Agência Brasil

Roberto Dias, exonerado do cargo na noite desta terça (29), foi indicado ao cargo pelo líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Sua nomeação ocorreu em 8 de janeiro de 2019, na gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta.

Na negociação que envolveu Dominguetti, feita em fevereiro, a empresa Davati ofereceu a Saúde 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca por US$ 3,5 por cada unidade (depois disso passou a US$ 15,5).

Em nota enviada à Folha, a AstraZeneca afirmou que “não disponibiliza a vacina por meio do mercado privado ou trabalha com qualquer intermediário no Brasil. Todos os convênios são realizados diretamente via Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e Governo Federal".

Segundo Dominguetti, Dias cobrou a propina em um jantar no restaurante Vasto, no Brasília Shopping, região central da capital federal, no dia 25 de fevereiro.

O empresário Herman Cardenas, dono da Davati Medical Supply, disse à Folha que não houve pedido para aumentar o preço do produto nem ocorreram negociações com o governo do Brasil.

Os emails obtidos pela Folha, porém, mostram trocas de mensagens entre Dias, Herman Cardenas e Cristiano Alberto Carvalho, que se apresenta como procurador da Davati.

“Prezados, este ministério manifesta total interesse na aquisição das vacinas desde que atendidos todos os requisitos exigidos. Para tanto, gostaríamos de verificar a possibilidade de agendar uma reunião hoje, às 15h., no departamento de Logística em Saúde”, diz email enviado pelo departamento de logística a Cardenas no dia 26 de fevereiro.

Em outro email, Dias pede a Cardenas que, como discutido na primeira reunião, “precisamos de uma carta do representante ou algum documento que mostre a Davati Medical como representante da AstraZeneca. Depois disso, podemos ir em frente, uma vez que essa proposta comercial parece boa diante de outras recebidas até agora.”

Cardenas envia até um modelo de carta de intenções que deveria ser preenchida pelo ministério, para fazer o pedido à AstraZeneca, além de uma lista de procedimentos a serem adotados.

Um dos emails foi trocado às 8h50 do dia 26 de fevereiro deste ano, por meio do endereço funcional de Dias, "roberto.dias@saude.gov.br", e "dlog@saude.gov.br" —"dlog" é como o departamento de logística é chamado.

Na conversa, Cardenas informa da oferta de 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca, citando Luiz Paulo Dominguetti Pereira como representante da empresa. "Fico no aguardo para ajudar a obter vacinas para seu país", diz.

A Davati Medical Supply foi aberta em junho de 2020 e funciona no mesmo endereço que uma incorporadora imobiliária e uma representante de produtos de construção em Austin, no estado americano do Texas.

Apesar da fala de Cardenas, a Davati reconheceu, em nota que tentou vender as doses ao Brasil, mas que não é uma distribuidora autorizada da AstraZeneca. “Embora não estejamos distribuindo nenhuma vacina contra Covid-19 como linha de produto atual, fomos procurados por alguns clientes pelo mundo para localizar vacinas contra Covid-19", disse a empresa.

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