CPI da Covid quebra sigilo de Pazuello, Ernesto e integrantes do 'gabinete paralelo' de Bolsonaro

Comissão foca estrutura de aconselhamento do presidente na defesa de teses negacionistas na pandemia

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Brasília

Os senadores da CPI da Covid aprovaram nesta quinta-feira (10) a quebra de sigilo telefônico e telemático dos ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e de integrantes do chamado "gabinete paralelo", estrutura de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro para temas ligados à pandemia e com defesa de teses negacionistas.

Inicialmente, também estava previsto para essa mesma sessão o depoimento do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), que optou por não comparecer após obter um habeas corpus no STF (Supremo Tribunal Federal). O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), afirmou que vai recorrer da decisão.

“Respeitamos a decisão da ministra Rosa Weber, como temos respeitado todas as outras decisões que aqui foram impetradas contra esta comissão parlamentar de inquérito. Mas acredito que o governador do estado do Amazonas perde uma oportunidade ímpar de esclarecer ao Brasil, mas principalmente ao povo amazonense, o que, de fato, aconteceu no estado do Amazonas”, afirmou Aziz.

Durante a sessão da CPI nesta quinta-feira, os senadores aprovaram requerimentos de convocação, pedidos de informação e quebras de sigilo.

A votação foi tumultuada, com governistas tentando impedir a quebra de sigilos. Marcos Rogério (DEM-RO) afirmou que “perde o Brasil” com o que chamou de medidas extremas e indevidas, provocando um bate-boca. O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), rebateu e disse que o “Brasil perdeu 480 mil vidas”.

As quebras de sigilo telefônicos e telemáticos possibilitam que os senadores tenham acesso aos registros de conversas telefônicas, aos conteúdos de mensagens trocadas por aplicativos de mensagens, ao histórico de pesquisas na internet e eventualmente à localização dos personagens que tenham sido registradas em aplicativos de localização (como Google Maps), entre outras informações.

O presidente Jair Bolsonaro discursa durante evento no palácio do planalto - Pedro Ladeira/Folhapress

Os requerimentos preveem a quebra dos sigilos de abril de 2020 até agora.

No caso de Pazuello, o documento aprovado afirma que se trata de personagem essencial e que, durante sua gestão, o Ministério da Saúde não destinou os esforços necessários para evitar o colapso do sistema de saúde no Amazonas, no início deste ano.

Pazuello já prestou depoimento à comissão, no qual foi acusado pelo relator, Renan Calheiros (MDB-AL), de mentir. O general e ex-ministro deve comparecer novamente à CPI, e os senadores já chegaram a aprovar na semana passada requerimento de reconvocação.

Os senadores aprovaram ainda as quebras de sigilos do ex-chanceler Ernesto Araújo, que também já depôs na CPI.

A CPI EM CINCO PONTOS

  • Foi criada após determinação do Supremo ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG)

  • Investiga ações e omissões de Bolsonaro na pandemia e repasses federais a estados e municípios

  • Tem prazo inicial (prorrogável) de 90 dias para realizar procedimentos de investigação

  • Relatório final será encaminhado ao Ministério Público para eventuais criminalizações

  • É formada por 11 integrantes, com minoria de senadores governistas

Os membros da comissão, principalmente do grupo majoritário, formado por oposicionistas e independentes, querem através do histórico das comunicações obter informações sobre as motivações e eventual participação de nomes próximos a Bolsonaro em ações da diplomacia.

Isso principalmente nos esforços para obter de outros países o fornecimento da hidroxicloroquina, medicamento sem comprovação de eficácia para o tratamento da Covid-19.

Os senadores do grupo majoritário da CPI pretendem dar início a uma grande devassa no que chamam "gabinete paralelo", através das quebras de sigilo, que, acreditam, permitirão deixar clara a articulação do grupo.

Um dos sigilos quebrados é o do virologista Paolo Zanotto, que aparece em um vídeo de evento com a participação de Bolsonaro, defendendo a criação de um “gabinete das sombras”.

Também teve sigilo quebrado o empresário Carlos Wizard, considerado próximo a Bolsonaro e que se tornou um dos principais conselheiros de Pazuello.

O depoimento do empresário à CPI está marcado para a próxima quinta-feira (17). No entanto, ele ainda não respondeu a notificação da comissão e surgiram notícias de que ele está em viagem aos Estados Unidos. O comando da comissão afirma que deve aguardar alguns dias e que então pode determinar a condução coercitiva de Wizard.

Os senadores ainda estão em dúvida se a medida pode ser determinada de ofício por Aziz ou se precisa ser votada pelo colegiado. Outra hipótese aventada é o envio aos Estados Unidos de representantes da comissão para colher o depoimento.

Alvo do Ministério Público Federal por ter feito um gesto considerado racista, Filipe Martins, assessor internacional da Presidência, é outro personagem ligado a esse "gabinete paralelo" que terá seu sigilo quebrado.

A medida atinge ainda o médico Luciano Dias Azevedo. Em depoimento à CPI, a médica defensora da cloroquina e conselheira de Bolsonaro Nise Yamaguchi afirmou que partiu de Azevedo a elaboração de uma minuta de decreto para ampliar o uso da hidroxicloroquina.

Além de Pazuello, os senadores aprovaram a quebra de sigilo de seus principais auxiliares e de alguns dos principais nomes do Ministério da Saúde, alguns ainda no cargo.

Foram atingidos Zoser Plata Bondin Hardman de Araújo (advogado do ex-ministro), Flávio Werneck (ex-assessor de Relações Internacionais do ministério) e Élcio Franco (ex-secretário executivo e atualmente assessor especial da Casa Civil), que prestou depoimento à CPI na última terça-feira (9).

Os membros da CPI também aprovaram requerimento que prevê a quebra de sigilos telefônico e telemático da secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro.

A médica, que já prestou depoimento à CPI, passou a ser chamada de "capitã cloroquina" pela sua enfática defesa do medicamento.

Também foram aprovadas as quebras de sigilo do secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos, Hélio Angotti Neto; do secretário de Vigilância em Saúde, Arnaldo Medeiros; e da diretora do PNI (Programa Nacional de Imunizações), Francieli Fontana Fantinato.

Outro alvo é o auditor Alexandre Figueiredo Costa e Silva, do TCU (Tribunal de Contas da União). O servidor elaborou um relatório paralelo em que apontou supernotificação nos dados de mortes por Covid. O documento foi citado por Bolsonaro, que foi desmentido pelo TCU e depois se retratou.

Os senadores querem saber se o servidor manteve contato com integrantes do governo Bolsonaro ou com pessoas próximas ao presidente, como seus filhos.

Quem teve o sigilo quebrado pela CPI

  • Eduardo Pazuello

    Ex-ministro da Saúde

  • Ernesto Araújo

    Ex-ministro das Relações Exteriores

  • Paolo Zanotto

    Médico e integrante do “gabinete paralelo”

  • Carlos Wizard

    Empresário e um dos principais conselheiros de Pazuello

  • Filipe Martins

    Assessor internacional da Presidência da República

  • Luciano Dias Azevedo

    Médico, de quem teria partido elaboração de minuta de decreto para ampliar uso da hidroxicloroquina

  • Zoser Plata Bondin Hardman de Araújo

    Advogado de Pazuello

  • Flávio Werneck

    Ex-assessor de Relações Internacionais do Ministério da Saúde

  • Élcio Franco

    Ex-secretário-executivo da Saúde na gestão Pazuello

  • Mayra Pinheiro

    Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde

  • Hélio Angotti Neto

    Secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos do Ministério da Saúde

  • Arnaldo Medeiros

    Secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde

  • Francieli Fontana Fantinato

    Diretora do PNI (Programa Nacional de Imunizações)

  • Alexandre Figueiredo Costa e Silva

    Auditor do TCU, elaborou relatório que aponta supernotificação de mortes por Covid

Também foi aprovada a transferência do sigilo bancário e fiscal de empresas de publicidade, que viraram foco após depoimento do ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten. Entre elas estão a PPR Profissionais de Publicidade Reunidos e a Calya/Y2 Propaganda e Marketing.

Os senadores também aprovaram a convocação de Wagner Rosário, ministro-chefe da CGU (Controladoria-Geral da União). O requerimento partiu dos governistas, que querem que Rosário fale sobre os gastos do governo federal e os repasses a estados e municípios —estratégia para desviar o principal foco da CPI.

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