Ofensiva de entidades e especialistas tenta barrar retrocessos na lei eleitoral para 2022

Câmara abriga três comissões que debatem grandes alterações para valer já na disputa do próximo ano

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Brasília

Diante do avanço de três comissões que debatem várias alterações nas regras eleitorais e políticas para valer já na disputa de 2022, um grupo de 35 entidades e especialistas promove uma campanha pública para tentar barrar retrocessos na lei.

Entre as propostas discutidas na Câmara estão a implantação da impressão do voto eletrônico, a substituição do atual modelo eleitoral (o proporcional) para o distritão e a volta do financiamento empresarial das campanhas.

O distritão é a regra pela qual nas eleições para deputados e vereadores são eleitos os mais votados. No atual sistema, o proporcional, a distribuição das cadeiras é feita com base na votação recebida por todos os candidatos do partido, eleitos e derrotados, além do voto na legenda.

Além de enfraquecer os partidos, o distritão torna sem efeito a maior parte dos votos dados pelos eleitores (os direcionados aos derrotados, além dos dados em excesso aos vencedores). Esse modelo já foi rejeitado por duas vezes pela Câmara.

Sob o mote "Freio na Reforma, política se reforma com democracia", as entidades pedem mais tempo para discussão de propostas de grande monta, que não haja mudanças a toque de caixa e que sejam garantidas e ampliadas medidas de transparência, de fiscalização, de redução de legendas de aluguel e de estímulo à participação de negros e mulheres, entre outros.

"Macro reformas não podem ser discutidas na pandemia e votadas até outubro. Reforma pontual, sim, reforma tsunami, não", diz texto do site montado para a campanha.

Como tem ocorrido sempre em ano pré-eleitoral (as regras das disputas têm que estar em vigor ao menos um ano antes do pleito), o Congresso se mobiliza para alterar a lei, em boa parte com medidas que afrouxam fiscalização, transparência e punição sobre partidos e candidatos.

Em 2019, por exemplo, a Câmara tentou aprovar a jato projeto com vários retrocessos na legislação, o que só foi amenizado após pressão pública liderada por boa parte das entidades que, agora, voltaram a se mobilizar.

Assinam manifesto contra o encaminhamento que vem sendo dado pela Câmara entidades como Transparência Partidária, Associação Brasileira de Ciência Política, Transparência Brasil, Instituto de Tecnologia e Sociedade, Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), Associação Contas Abertas e os movimentos Livres, Acredito e Renova BR.

"Nós, organizações da sociedade civil e especialistas que subscrevemos este manifesto, vimos a público para defender que alterações nas regras de funcionamento do sistema político brasileiro sejam realizadas com transparência e ampla participação social", começa o manifesto, que lista alguns princípios.

"Que todos os interessados sejam ouvidos e tenham demandas consideradas, que nenhuma mudança seja votada de forma açodada, que audiências públicas sejam realizadas após a divulgação pública dos detalhes dos projetos e que a posição de cada parlamentar e cada partido seja tornada pública de forma clara."

Entre os pontos específicos defendidos estão a preservação e aprimoramento das regras de estímulo à participação de "mulheres, negros e demais grupos sub-representados na política institucional", manutenção das leis que visam reduzir a sopa de letrinhas partidárias no país (cláusula de desempenho e fim das coligações), preservação do sistema eletrônico de votação, além da ampliação das regras de transparência dos gastos dos partidos e dos candidatos.

O texto pede ainda que alguns debates, como a mudança do sistema eleitoral para o chamado distritão, ocorram após a pandemia.

"A legislação eleitoral precisa de fato de uma série de ajustes, mas as alterações que estão em discussão podem ter impacto sobre o funcionamento de todo o sistema político. Além do mais, a condição na qual nos encontramos, seja pelas dificuldades impostas pela pandemia, seja pelas disposições autoritárias que se verificam frequentemente, deveria fazer com que esse debate ocorresse com uma dose a mais de transparência e participação social.", diz Marcelo Issa, diretor-executivo do Transparência Partidária.

"Não é uma tarefa simples, especialmente no contexto atual, mas não me parece exagero dizer que disso pode depender o próprio futuro da democracia no Brasil."

Secretário-executivo da Associação Brasileira de Ciência Política, Bruno Bolognesi destaca como principais pontos de preocupação justamente a possibilidade de aprovação do distritão e a pressão de partidos médios e pequenos para que haja retrocessos na legislação que visa coibir legendas de aluguel ou sem representação popular significativa.

O debate para alterações na legislação eleitoral foi colocado em marcha pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

Uma das comissões, relatadas por Margarete Coelho (PP-PI), aliada de Lira, visa revogar toda a legislação eleitoral e substitui-la por um único código eleitoral e processual eleitoral.

Entre as propostas estudadas está a flexibilização da Lei das Inelegibilidades —que foi tornada mais rigorosa pela Lei da Ficha Limpa, em 2010— e um freio ao poder do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de editar resoluções.

Outra comissão, relatada por Renata Abreu (Podemos-SP), discute alterações na Constituição, que precisam ser avalizadas por pelo menos 60% dos deputados e senadores, em dois turnos de votação em cada Casa.

A terceira debate a volta do voto impresso, bandeira do governo Bolsonaro, que tem levantando suspeitas jamais comprovadas contra o atual sistema de urnas eletrônicas.

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