Senadores da CPI querem sessão secreta para apurar suspeitas em compra de testes pela gestão Bolsonaro

Deputado afirmou à Folha que corrupção pode ser muito maior, indicou fraudes na compra de testes e pediu uma sessão secreta

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Brasília

Os senadores que integram a CPI da Covid afirmam que as novas denúncias trazidas pelo deputado federal Luís Miranda (DEM-DF) são graves e serão investigadas, inclusive com a realização de uma sessão secreta para ouvir o parlamentar e o seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde Luís Ricardo Miranda.

No entanto, os membros da comissão adotam também um tom de cautela, para não desvirtuar um caminho da investigação —de irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin— que consideram já estar bem delineado.

Em entrevista à Folha neste domingo, o parlamentar afirmou que os casos de corrupção podem ser “muito maior” do que vem sendo divulgado até o momento, envolvendo a compra da vacina indiana Covaxin.

A existência de denúncias de irregularidades em torno da compra da vacina indiana Covaxin foi revelada pela Folha no dia 18, com a divulgação do depoimento sigiloso de Luis Ricardo ao Ministério Público Federal. Desde então, o caso virou prioridade da CPI no Senado.

"Se existir algo realmente ilegal, não é só nessa vacina [Covaxin], é na pasta toda. O presidente [Jair] Bolsonaro demonstra claramente que não tem controle sobre essa pasta", disse o deputado neste domingo (27).

Miranda levantou pela primeira vez suspeita sobre a compra de testes para detectar a Covid-19, indicando como possível participante um indicado do líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR).

O deputado denunciante também indicou que seu irmão pode apresentar novos fatos, desde que seja em uma sessão secreta da CPI da Covid, para garantir sua segurança.

Nesta segunda-feira (28), após a publicação da entrevista pela Folha, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) informou que vai apresentar requerimento para a realização de uma sessão secreta para ouvir as novas denúncias e colher as provas que eventualmente serão apresentadas, como indicou o deputado Luís Miranda.

“A CPI não pode ignorar este tipo de informação, mas deve ter o cuidado de não cair em especulações sem provas”, afirmou o senador.

As novas denúncias serão um dos temas discutidos na reunião semanal do grupo majoritário da CPI, formado por independentes e oposicionistas, na noite desta segunda-feira.

Um senador da cúpula da comissão afirmou que os novos fatos são importantes e precisam ser apurados. No entanto, o grupo majoritário vai analisar com cautela como proceder. Há o temor de que as novas denúncias, envolvendo a compra de testes Covid a as eventuais que possam surgir, desvirtuem o foco da questão da Covaxin.

Posição parecida tem Humberto Costa (PT-PE). O senador considera “graves” as novas denúncias e pede que sejam apurados, possivelmente numa sessão secreta.

“Se realmente isso tem correspondência com a realidade, são fatos graves que precisam ser apurados. Nós vamos conversar na CPI e podemos tratar desse assunto também. Se de fato o deputado tem coisas que sejam relevantes, não há nenhuma dificuldade em fazer uma sessão reservada”, disse.

Por outro lado, Costa também defende cautela na apuração dessas denúncias, evitando pré julgamentos, para que a comissão não perca seu foco.

“Não vamos ignorar, mas vamos ver qual é a consistência disso, até para não correr o risco de se perder no caminho. Nós temos um bom caminho que foi aberto com os indícios envolvendo a Covaxin”, completou.

O também petista Rogério Carvalho (PT-SE) acredita que a cúpula da CPI deve em breve se reunir com o deputado Luís Miranda, para apurar quais informações podem ser trazidas e então avaliar a possibilidade de uma sessão secreta.

“Eu acho que eles devem procurar o presidente da CPI [Omar Aziz]. o relator [Renan Calheiros], e mostrar o que podem apresentar. E aí com certeza a CPI não vai deixar de ouvi-los se ele tiver informações a apresentar”, afirmou.

"É um caminho sem volta. A partir do momento que traz uma pessoa do governo e faz uma denúncia, é preciso aprofundar, investigar. Mas tem que se assentar sobre bases consistentes”, completou o senador.

A CPI entrou numa nova fase de investigações na semana passada, após a publicação pela Folha do depoimento do servidor Luís Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal. Miranda apontou pressão de superiores para liberar a importação da vacina indiana Covaxin.

Trata-se da imunização mais cara, ao custo de R$ 80 por dose. O contrato ainda levanta suspeita por ser o único com um intermediário, a empresa brasileira Precisa Medicamentos, por ter sido fechado em tempo recorde e porque se exigiu adiantamento para uma terceira empresa, com sede em paraíso fiscal.

Em depoimento na CPI na sexta-feira (25), os irmãos Miranda confirmaram que o presidente Jair Bolsonaro foi alertado e trouxeram para o centro das suspeitas o nome do deputado Ricardo Barros.

Também nesta segunda-feira, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou requerimento para prorrogar as atividades da comissão por um novo período de 90 dias.

A iniciativa já era esperada e foi anunciada pelo próprio Randolfe na semana passada. Além disso, há consenso entre os membros do grupo majoritário da comissão de que será preciso prorrogar as atividades, para aprofundar as investigações do caso Covaxin.

O colegiado foi instalado no dia 27 de abril e portanto deveria ser encerrado entre o fim de julho e o início de agosto - a depender se a comissão vai parar as atividades com o recesso parlamentar, previsto inicialmente para começar em 17 de julho.

Para ser prorrogada, são necessárias as assinaturas de 27 senadores, o que correspondem a um terço do total de integrantes do Senado.

Ao justificar o requerimento, o senador escreveu que nenhuma outra CPI da história teve importância e responsabilidade tão singular.

O parlamentar lembra as omissões que foram apontadas nos depoimentos e a defesa da tese de imunidade de rebanho e de medicamentos sem eficácia para o tratamento da Covid-19, por integrantes do governo e no âmbito do gabinete paralelo.

O senador também afirma que houve um "boicote às vacinas", que poderiam salvar milhares de vidas. Por fim, Randolfe também menciona as apurações recentes, referentes à compra da vacina indiana.

"Em paralelo, a CPI tem desvendado esquemas de corrupção e de favorecimentos de determinadas empresas com recursos destinados ao combate à pandemia da Covid-19", escreveu no requerimento.

"Servidores sofreram pressões não republicanas para flexibilizar a importação da Covaxin. Depoentes apontaram que até o presidente da República foi alertado das irregularidades e, ao invés de apurá-las, as creditou ao próprio líder do governo na Câmara dos Deputados. É um escândalo que precisa ser apurado com a gravidade correspondente", completa.

O QUE ACONTECEU APÓS A REVELAÇÃO DO CASO PELA FOLHA

Reportagem aponta pressão atípica (18.jun)
Em depoimento mantido em sigilo pelo MPF (Ministério Público Federal) e obtido pela Folha, Luís Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, afirmou ter sofrido pressão de forma atípica para tentar garantir a importação da vacina indiana Covaxin

'É bem mais grave' (22.jun)
Irmão do servidor do Ministério da Saúde, o deputado federal Luís Miranda (DEM-DF) disse à Folha que o caso é "bem mais grave" do que a pressão para fechar o contrato

Menção a Bolsonaro (23.jun)
Luis Miranda afirmou ter alertado o presidente sobre os indícios de irregularidade. "No dia 20 de março fui pessoalmente, com o servidor da Saúde que é meu irmão, e levamos toda a documentação para ele"

CPI aprova depoimentos (23.jun)
Os senadores da comissão aprovaram requerimento de convite para que o servidor Luís Ricardo Miranda preste depoimento. A oitiva será nesta sexta-feira (25) e o deputado Luis Miranda também será ouvido.
Os parlamentares também aprovaram requerimento de convocação (modelo no qual a presença é obrigatória) do tenente-coronel Alex Lial Marinho, que seria um dos autores da pressão em benefício da Covaxin. A CPI também decidiu pela quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico e telemático de Lial Marinho

Denúncia grave (23.jun)
Presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que as denúncias de pressão e a possibilidade de que o presidente Jair Bolsonaro tenha tido conhecimento da situação talvez seja a denúncia mais grave recebida até aqui pela comissão

Bolsonaro manda PF investigar servidor e deputado (23.jun)
O presidente mandou a Polícia Federal investigar o deputado Luis Miranda e o irmão dele, Luis Ricardo Fernandes Miranda. O ministro da Secretaria-Geral, Onyx Lorenzoni, e Elcio Franco, assessor especial da Casa Civil e ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, foram escalados para fazer a defesa do presidente. Elcio é um dos 14 investigados pela CPI

Empresa diz que preço para Brasil segue tabela (23.jun)
A Precisa Medicamentos, representante no Brasil do laboratório indiano Bharat Biotech, afirmou que o preço de US$ 15 por dose da vacina oferecido ao governo segue tabela mundial e é o mesmo praticado com outros 13 países

Governistas dizem que Bolsonaro repassou suspeitas a Pazuello (24.jun)
Senadores governistas da CPI afirmaram que o presidente pediu que Pazuello verificasse as denúncias envolvendo a compra da Covaxin assim que teve contato com os indícios

'Acusação é arma que sobra' (24.jun)
Bolsonaro fustigou integrantes da CPI, repetiu que não há suspeitas de corrupção em seu governo e afirmou que a acusação sobre a vacina é a arma que sobra aos seus opositores. "Me acusam de quase tudo, até de comprar uma vacina que não chegou no Brasil. A acusação é a arma que sobra", disse o presidente na cidade de Pau de Ferros, no Rio Grande do Norte

'Foi o Ricardo Barros que o presidente falou' (25.jun)
Em depoimento à CPI da Covid, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que é irmão do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, afirmou ter alertado Bolsonaro. “A senhora também sabe que foi o Ricardo Barros que o presidente falou", disse o parlamentar à senadora Simone Tebet (MDB-MS). Segundo ele, Bolsonaro afirmou: "Vocês sabem quem é, né? Sabem que ali é foda. Se eu mexo nisso aí, você já viu a merda que vai dar, né? Isso é fulano. Vocês sabem que é fulano"

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