Bolsonaro é internado para exames após dores abdominais, e reunião com chefes de Poderes é cancelada

Há 11 dias, manifestações do presidente são interrompidas por contrações involuntárias do diafragma

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro deu entrada para exames na madrugada desta quarta-feira (14) no HFA (Hospital das Forças Armadas) com dores abdominais. Segundo nota da Presidência da República, Bolsonaro seguiu orientação de sua equipe médica para a realização de exames para investigar a causa dos soluços".

Ainda de acordo com o Planalto, "por orientação médica, o presidente ficará sob observação, no período de 24 a 48 horas, não necessariamente no hospital. Ele está animado e passa bem".

O cirurgião Antônio Luiz Macedo, que operou Bolsonaro após a facada que levou no abdome, em setembro de 2018, foi chamado para ir a Brasília.

A reunião do Comitê de Coordenação Nacional para Enfrentamento da Pandemia da Covid-19, que estava prevista para as 8h, foi cancelada. O STF (Supremo Tribunal Federal) divulgou nota informando também o cancelamento da reunião entre os chefes de Poderes.

"Foi cancelada a reunião entre os presidentes dos Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo que aconteceria nesta quarta-feira (14). O encontro será oportunamente reagendado", diz o comunicado.

Ministros ouvidos sob reserva disseram à Folha que, no início da tarde, Bolsonaro estava sedado por causa dos exames que havia feito. Eles esperavam uma avaliação do médico, mas defenderam que o presidente seja logo submetido a uma cirurgia para corrigir eventuais problemas decorrentes da facada.

"O presidente está no HFA em repouso, foi medicado. Falei com o ajudante de ordem dele, ele está bem. Teve fortes dores às 4h, mas nada de grave até o momento. Então, graças a Deus, ele está muito bem. Repousando, que é o que ele precisa", disse o ministro da Casa Civil, general Luiz Eduardo Ramos.

Na noite anterior, Bolsonaro demonstrava certo abatimento quando se queixou a apoiadores na porta do Palácio da Alvorada sobre os 11 dias de uma crise de soluço.

Além disso, o mandatário já havia dito a seus seguidores que teria que passar por uma nova cirurgia para corrigir uma hérnia, herança da facada que levou durante a campanha de 2018. O próprio presidente abordou a crise de soluços com apoiadores e em uma entrevista na semana passada.

"Peço desculpa a todos que estão me ouvindo, porque eu estou com soluço já tem cinco dias. Eu fiz uma cirurgia para implante dentário no sábado [3], já aconteceu comigo no passado, talvez, em função dos remédios que eu estou tomando, eu estou 24 horas por dia com soluço", disse Bolsonaro à rádio Guaíba, do Rio Grande do Sul.

Ao ser aconselhado pelo âncora a levar um susto para se livrar dos soluços, o presidente disse que, "por enquanto, não estou assustado com nada que acontece no governo".

Depois da conversa que teve com o presidente do STF, Luiz Fux, nesta segunda-feira (12), Bolsonaro concedeu uma entrevista de cerca de 30 minutos, mas só soluçou no começo.

Já na terça-feira (13) conseguiu fazer um discurso inteiro sem interrupções. Mas, pouco depois da cerimônia no Palácio do Planalto, chegou de motocicleta ao Palácio da Alvorada e voltou a soluçar diante dos eleitores.

"Eu estou sem voz, pessoal. Se eu começar a falar muito, volta a crise de soluço" alertou o presidente. "Já voltou o soluço", disse logo em seguida. Posou para fotos e gravou vídeo para um apoiador. "Está ruim de falar", reclamou.

Ao longo da manhã desta quarta, o ministro Paulo Guedes (Economia) foi visto no hospital. O comboio de carro com a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, chegou ao HFA no início da tarde. Logo depois, o ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, deixou a unidade de saúde. Por volta das 14h40, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, chegou ao hospital.

Mais cedo, o vice-presidente Hamilton Mourão disse que enviou mensagem para Bolsonaro, mas que ainda não recebeu resposta por conta da internação.

"Mandei a mensagem para ele, porque ele está no hospital, um problema intestinal. Fazendo um procedimento lá, sem maiores problemas", disse o vice.

Mourão embarca nesta quarta para Angola, onde participa de reunião da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa).

Auxiliares do presidente mobilizaram as redes sociais em uma corrente por Bolsonaro. "Força, presidente! Fique bom logo, o Brasil precisa de você!", escreveu Fábio Faria, ministro das Comunicações.

"Graças a Deus, nosso presidente está bem. Ele vai ficar apenas em observação depois de alguns exames. Agradeço o carinho dos brasileiros e me junto a eles nas frequentes orações por Jair Bolsonaro. Força, presidente! Nosso Brasil precisa e muito da sua coragem e liderança!", manifestou-se Ramos.

"Ele passa bem, graças a Deus! Tudo isso são consequências da facada de 2018 que alguns impiedosos insinuam ter sido simulada", diz a mensagem da deputada Bia Kicis (PSL-DF).

Ao longo do dia, carros passaram com motoristas gritando em frente ao hospital contra e a favor do presidente.

O que é soluco?

"Soluço é uma contração abrupta do diafragma, que é o músculo da respiração, seguido de fechamento abrupto da glote, que é como uma tampinha que impede que a comida entre na traqueia. O fechamento abrupto da glote é que dá o ruído tradicional do soluço", afirma o médico gastroenterologista clínico Ricardo Barbuti.

Entender esse processo ajuda a entender possíveis causas, diz o especialista.

"Qualquer músculo do nosso corpo precisa de um estímulo para contrair, e o diafragma não foge à regra, Quem dá estímulo para esse músculo contrair é o nervo frênico, que é um ramo de outro nervo importante, o nervo vago. Qualquer coisa que irrite o nervo frênico ou vago nesse trajeto até o diafragma pode dar soluço."

Segundo Barbuti, um dos fatores mais comuns é a doença do refluxo gastroesofágico, em que há uma irritação do esôfago. Bolsonaro já afirmou sofrer de refluxo. Outras causas também podem estar relacionadas, como um estímulo direto sobre o diafragma.

"Processos em que têm distensão muito grande do estômago podem fazer com que o fundo do estômago encoste no diafragma e isso gera soluço. É muito comum, por exemplo, soluço depois que come e bebe muito."

Ingerir líquidos muito gelados também pode levar a soluço, lembra o médico ao comentar os casos mais simples.

Estresse emocional, mudança de temperatura, aerofagia (quando a pessoa engole muito ar ao consumir alguns alimentos), consumo de bebidas com gás e álcool, por exemplo, também podem levar ao quadro, geralmente temporário, diz o otorrinolaringologista Geraldo Druck Sant’Anna, membro da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia.

Ele explica que o quadro costuma durar pouco tempo —às vezes, uma crise pode durar 48 horas. "E tem pessoas com soluço por mais tempo, o que faz com que tenha que entrar em investigação."

Nesse caso, diz ele, o soluço pode estar ligado a um quadro maior, como alterações no pescoço, no esôfago ou tireoide, além de alterações no sistema nervoso, metabólicas (como diabetes), problemas renais, uso de alguns medicamentos, entre outros.

"É uma série de situações que podem acontecer. Às vezes a pessoa faz uma anestesia geral e acorda com soluço, que pode ficar por algum tempo", exemplifica.

Barbuti concorda. "As pessoas acham que o problema é sempre no estômago, e não é. Pode ser até algo longe do estômago. Problemas cardíacos, neurológicos, sistêmicos, tudo isso pode levar a soluços."

O caso deve ser avaliado em conjunto com o médico, por meio do exame do paciente e análise do histórico de saúde, dizem os especialistas, que evitam comentar o caso específico do presidente.

"De forma geral, após 48 horas, as pessoas procuram seu médico", afirma Sant'Anna, segundo quem a conduta e diagnóstico dependem de cada caso. "Não é uma receita de bolo, igual para todo mundo."
Para Barbuti, há possibilidade de haver relação com o uso de medicamentos, como citado por Bolsonaro, mas é difícil avaliar sem detalhes.

Segundo ele, alguns remédios podem ser usados para tratar o soluço ou o fator principal que levou a ele. "Se são secundários a uma doença, como refluxo, tratamos a doença e o soluço melhora."

CIRURGIAS BOLSONARO

  • 6 de setembro de 2018 - Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora (MG): Operação de urgência após ser atacado por uma facada de Adélio Bispo em ato de campanha
  • 12 de setembro de 2018 - Hospital Albert Einstein, em São Paulo: Cirurgia de emergência em razão de uma complicação causada pela aderência das paredes do intestino
  • 28 de janeiro de 2019 - Hospital Albert Einstein, São Paulo: Retirada da bolsa de colostomia
  • 8 de setembro de 2019 - Hospital Vila Nova Star, São Paulo: Cirurgia para correção de uma hérnia incisional na região da área atingida pela facada
  • 30 de janeiro de 2020 - Hospital das Forças Armadas (HFA), Brasília: Vasectomia
  • 25 de setembro de 2020 - Hospital Vila Nova Star, São Paulo: retirada de cálculo na bexiga

CRONOLOGIA DA CRISE

7.jul
Omar Aziz fala em 'lado podre' das Forças
O presidente da CPI da Covid, Omar Aziz (PSD-AM), afirma que há muitos anos o Brasil "não via membros do lado podre das Forças Armadas envolvidos com falcatrua dentro do governo"

7.jul
Reação da Defesa a Omar
O ministro da Defesa, Braga Netto, e os comandantes das Forças Armadas divulgam nota em que repudiam declarações de Omar. "Essa narrativa, afastada dos fatos, atinge as Forças Armadas de forma vil e leviana, tratando-se de uma acusação grave, infundada e, sobretudo, irresponsável"

8.jul
Ameaças golpistas de Bolsonaro
Presidente faz ameaças sobre pleito de 2022. "Eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições"

8 e 9.jul
Reação de Pacheco aos militares e a Bolsonaro
O presidente do Senado escreve em uma rede social, na quinta (8), sobre o atrito entre militares e Omar: "Deixei claro [em conversa com Braga Netto, ministro da Defesa] o nosso reconhecimento aos valores das Forças Armadas (...) e afirmei, também, que a independência e as prerrogativas de parlamentares são os principais valores do Legislativo".

No dia seguinte, em relação às ameaças de Bolsonaro, afirma: "Todo aquele que pretender algum retrocesso ao Estado democrático de Direito esteja certo que será apontado pelo povo brasileiro e pela história como inimigo da nação (...)"

9.jul
Reação de Barroso a Bolsonaro
O presidente do TSE afirma, em nota: "Qualquer atuação no sentido de impedir a sua ocorrência [eleições de 2022] viola princípios constitucionais e configura crime de responsabilidade"

10.jul
Lira e partidos se manifestam sobre crise
"Importante dizer que a presidência [da Câmara] (...) não tem compromisso algum com nenhum tipo de ruptura política, institucional democrática, com qualquer insurgência de boatos, com qualquer manifestação desapropriada", diz Arhur Lira em entrevista à CNN Brasil. No mesmo dia, mais cedo, presidentes de DEM, MDB, PSDB, Novo, PV, PSL, Solidariedade e Cidadania afirmam, em nota, que "nenhuma forma de ameaça à democracia pode ou deve ser tolerada"

12.jul
Boicote de 'gente importante'
Em meio à tensão, o presidente afirma a apoiadores: "Sabia que ia ser difícil, mas esperava contar com mais gente importante do meu lado. Lamentavelmente, muita gente importante aí boicota"

12.jul
Reunião dos Três Poderes
O presidente do STF, Luiz Fux, afirmou que acertou com Bolsonaro um encontro entre os chefes dos Três Poderes para fixar "balizas sólidas para a democracia"​

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