O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fecha o primeiro semestre de 2021 com um aumento de quase 20 pontos percentuais na sua taxa de reprovação, ao se comparar o dado com o resultado de pesquisa Datafolha realizada em dezembro do ano passado.
A tendência, observada até o final de 2020, de divisão da opinião pública em três conjuntos que se polarizavam por inércia, em um cabo de guerra entre economia e pandemia, desequilibrou-se nos primeiros meses deste ano a partir do recrudescimento das mortes por Covid-19 e da vulnerabilidade agravada por crise sanitária e auxílio emergencial insuficiente.
Hoje, a avaliação negativa é praticamente o dobro da positiva.
A percepção de descontrole com o colapso no atendimento da saúde em diferentes regiões do país e o ritmo lento da vacinação provocaram já no primeiro trimestre deste ano um acúmulo de 12 pontos percentuais na rejeição ao governo.
Em alguns estratos, principalmente com maior escolaridade e renda, já se observava, em março, avaliação negativa majoritária quanto à gestão do presidente.
Agora, depois da marca de mais de 500 mil mortes pela doença e com denúncias de corrupção no Ministério da Saúde, investigadas pela CPI da Covid no Senado, Bolsonaro tem novos arranhões em sua imagem e passa a ser reprovado pela maioria absoluta da população.
Entre os que tomaram conhecimento da comissão, a taxa de reprovação ao governo é superior em quase 10 pontos percentuais à verificada entre os que a desconhecem.
Esse contraste é ainda mais expressivo entre os que souberam das denúncias de irregularidades na compra de vacinas por parte do Ministério da Saúde e também entre os que acham que Bolsonaro tinha conhecimento do fato.
No primeiro segmento, a avaliação negativa do governo supera a média em sete pontos percentuais e no segundo é maior em 16 pontos.
O reflexo mais simbólico do fenômeno encontra-se na matriz de imagem do presidente que o Datafolha levanta junto aos entrevistados desde sua posse.
Em abril de 2019, a maioria dos brasileiros o considerava muito inteligente, sincero, decidido e preparado, apesar de o enxergarem como defensor dos ricos e autoritário.
Em meio à primeira onda da pandemia, em junho do ano passado, com o discurso negacionista e apoio a atos antidemocráticos, além de reforçar a imagem de autoritarismo, Bolsonaro passou a ser considerado pela maioria como pouco inteligente, indeciso e despreparado, mas era denominado honesto pela maior parte dos entrevistados.
Na pesquisa atual, nem isso. A associação do presidente a atributos negativos se intensificou e ele passa a ser classificado inclusive como falso, aspecto que há um ano dividia opiniões. O estrato que mais cresceu nesse período (12 pontos percentuais) refere-se à parcela que o chama de desonesto (52%).
Entre os que tomaram conhecimento das denúncias de irregularidades na compra de vacinas pelo Ministério da Saúde, esse índice supera a média em oito pontos percentuais e entre os que não ouviram falar das suspeitas, ele é menor em 18 pontos.
Mesmo entre os que o elegeram, há parcela significativa (que se aproxima ou até supera um terço do estrato) que o julga incompetente, despreparado para o cargo, pouco inteligente e autoritário.
Há inclusive aparente refluxo no contingente de bolsonaristas fiéis —o conjunto de devotos do presidente segundo escala elaborada pelo Datafolha (votaram nele, o aprovam e confiam em tudo que ele diz) sempre aparecia nas pesquisas com percentuais próximos a 15%.
Nos últimos dois meses apresenta-se abaixo dessa média de quatro a seis pontos percentuais.
Um dado que ilustra possível queda no grau de afinidade é a baixa taxa de entrevistados que se localiza no extremo positivo de avaliação de Bolsonaro —dos 24 pontos de popularidade que ele alcança, 15 referem-se a brasileiros que o julgam bom e apenas 9 que o consideram ótimo, posição mais frequente em nichos como empresários e evangélicos.
No lado oposto, dentre os 51% que o reprovam, 11% provêm de entrevistados que o chamam de ruim e 40% dos que o classificam como péssimo, postura comum entre mais escolarizados, desempregados e funcionários públicos.
Como uma das principais variáveis na composição do voto em um processo de reeleição é a avaliação que o cidadão faz da gestão do mandatário, o extremo negativo da escala tende a se cristalizar como núcleo de forte rejeição, um índice de difícil conversão em intenção de voto.
Em termos políticos, o tempo que falta para a eleição presidencial de 2022 é uma eternidade, especialmente quando, por estratégia, o sistema eleitoral em si é colocado em xeque.
Mudanças em diferentes cenários do país, do econômico ao social, podem alterar o quadro, mas há fatos e imagens que o eleitor dificilmente esquece, e a CPI no Senado tem os revelado aos montes.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.