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Justiça de Roraima censura reportagem sobre comércio ilegal de ouro extraído da Terra Indígena Yanomami

Decisão provisória obriga Repórter Brasil a retirar menções a fisioterapeuta do Ministério da Saúde

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Manaus

Em decisão liminar (provisória), o juiz Air Marin Junior, do 2º Juizado Cível de Boa Vista, determinou que a ONG Repórter Brasil retire trecho de uma reportagem sobre o comércio de ouro extraído ilegalmente da Terra Indígena Yanomami.

A decisão faz parte de uma ação movida pela fisioterapeuta Thatiana Nascimento Almeida, que trabalha no Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena) Yanomami, do Ministério da Saúde.

Segundo relato da reportagem intitulada “Compro tudo: ouro yanomami é vendido livremente na rua do Ouro, em Boa Vista”, no final de abril, ela entrou em uma joalheria e perguntou ao atendente se o local comprava “ouro de garimpo”.

A cena foi presenciada pela reportagem, que identificou Almeida por meio da placa do carro. Antes da publicação do texto, em 24 de junho, a fisioterapeuta foi procurada via telefone, rede social e WhatsApp, mas não respondeu aos pedidos de entrevista.

A reportagem é da agência de jornalismo Amazônia Real, de Manaus, não incluída na decisão judicial e que, por isso, mantinha a publicação em seu site até a publicação deste texto. Trata-se de uma série investigativa coproduzida pela Repórter Brasil e pela Amazônia Real sobre a mineração ilegal de ouro em território yanomami.

Na ação de indenização por danos morais, a fisioterapeuta afirma que foi procurada por uma repórter a respeito de garimpo ilegal em terras indígenas. Ela alega ter respondido “que não tinha informações acerca do assunto, que apenas trabalha na saúde indígena” e que foi pega de surpresa pela publicação da reportagem.

Em boletim de ocorrência, Almeida afirma que esteve na joalheria para pedir um orçamento para a diminuição de uma aliança.

Na decisão, o juiz concedeu um prazo de 48 horas para a retirada das menções à fisioterapeuta e determinou a realização de uma audiência de conciliação entre as partes.

Ao justificar a liminar, o magistrado diz que a documentação e as alegações indicam “alta probabilidade” de que a fisioterapeuta “tenha razão”. Caso a decisão seja contrária a ela, a Repórter Brasil “poderá incluir novamente as informações acerca da requerente”.

De acordo com o advogado André Ferreira, “foram dadas inúmeras oportunidades para a autora se manifestar antes de entrar com ação judicial". "Ela optou por não se manifestar e simplesmente entrou com essa ação judicial", afirma.

“Em segundo lugar, a autora não contesta os fatos descritos na matéria. Ela própria fez um boletim de ocorrência confirmando que foi até a loja, perguntou se havia compra de ouro. E ali, em local público, a equipe a filmou indo até o carro, pegando um pacote e voltando à loja. Não houve atribuição de fato criminoso à autora, houve o relato de um fato que ocorreu em local público e que tem relevância.”

Ferreira é do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos, que presta assessoria jurídica gratuita para a Repórter Brasil.

Ele afirma que a reportagem foi produzida pela Amazônia Real, e que a Repórter Brasil se limitou a divulgar. “Estamos alegando uma ilegitimidade de parte. A ação não poderia ter sido proposta contra nós.”

Em nota sobre o caso, a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) criticou a censura.

"O juiz nem sequer ouviu os sites citados na ação. A decisão, embora prevista no ordenamento jurídico brasileiro, causa estranheza porque a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão deveriam receber preferência em relação à proteção da honra, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal."

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