Pacheco vê erros e acertos do governo na pandemia e trata como infeliz frase de Bolsonaro sobre eleição

Presidente do Senado diz à Folha que até bravata contra democracia é inaceitável e não descarta disputar Planalto em 2022

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Brasília

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), diz que o risco à democracia deve ser "eternamente vigiado" e considera inaceitáveis tanto bravatas para agradar a uma base política como "pensamentos concretos" que possam representar uma ruptura.

Em entrevista à Folha, ele evitou dirigir críticas a Jair Bolsonaro, mas afirmou que a declaração do presidente da República sobre a possibilidade de não haver eleições foi "infeliz" e sujeita a uma "retificação".

Segundo Pacheco, que vê erros e acertos do governo na pandemia, serão considerados "inimigos da nação" todos os que defenderem retrocessos, "frustrando eleições, defendendo intervenção militar ou rememorando Atos Institucionais".

Homem de máscara, terno e gravata sentado em sofá branco
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), durante entrevista à Folha na residência oficial, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

As falas ocorrem após dias conturbados, que tiveram início com uma nota do Ministério da Defesa afirmando que não aceitaria "ataques levianos".

Tratou-se de resposta a uma fala do presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), que havia citado o fato de alguns militares aparecerem ligados a suspeitas no governo.

O presidente do Senado repetiu que as tensões estão superadas, acrescentou que a passagem de um general pelo Ministério da Saúde o torna um "personagem político" e afirmou esperar que a CPI apure responsabilidades.

Cogitado como nome para disputar o Palácio do Planalto em 2022, ele afirma não ser o momento de discutir cenários políticos, mas garante que não se fecha "para nenhuma das opções".

Pacheco disse esperar a pronta recuperação de Bolsonaro, que foi internado com uma obstrução intestinal, e afirmou que o diálogo com o presidente é importante para o que chamou de "pacificação". A seguir, os principais trechos da entrevista.

A semana que passou foi tumultuada, começando pela nota do Ministério da Defesa. O sr. se manifestou em defesa da democracia, mas evitou comentar o conteúdo da nota. Considerou uma ameaça? Toda instituição ou pessoa que se julgar ofendida tem o direito de se manifestar no sentido de que não aceita aquilo. Isso cabe às Forças Armadas e a qualquer instituição. Quando vem das Forças Armadas, gera especulações.

Considerando que o próprio senador Omar Aziz disse que não teve a intenção de ofender as Forças, considerando a conversa que tive com o ministro Braga Netto no sentido de que ele também não generalizou sua fala em relação ao Senado, eu considerei o assunto encerrado. Não considerei ameaçadora.

Em entrevista ao jornal O Globo, o comandante da Aeronáutica disse que a nota deveria ser lida como alerta e que não era uma ameaça, porque "homem armado não ameaça". O sr. considera os comentários adequados? É fundamental que as pessoas que ocupam determinadas posições sejam o mais claras possível naquilo que desejam dizer. E considero que o comandante da Aeronáutica tem esse papel de ser claro naquilo que diz.

Não recebi como ameaça. Considero que aquilo ocorreu num momento de uma semana recheada de desentendimentos.

Analisando os episódios recentes, incluindo a participação do general Eduardo Pazuello em um ato do presidente, o sr. acha que os militares entraram demais na política? Com a eleição do presidente Bolsonaro, cuja convivência é com militares, é natural que a composição de seu governo se dê por militares.

A discussão em relação à participação de militares ativos [no governo] é uma discussão existente no Congresso, muito em torno desse episódio do ex-ministro Pazuello.

Fato é que o militar que se tornou ministro da Saúde no ápice da pandemia, que acabou sendo alvo de uma investigação na CPI, ele tornou-se, para além de militar, um personagem político.

A grande reflexão que fica é se os militares da ativa devem participar de governos ou não. E esta definição deve se dar ouvindo-se as Forças Armadas. Até porque tenho absoluta certeza, honradas como são, éticas como são, não querem ter esse contato permanente com a política.

Na último dia 9, o sr. disse que quem defender um retrocesso da democracia será considerado um "inimigo da nação". Por que não citou o presidente Bolsonaro? Porque não é meu papel criticar a postura pessoal. Meu papel é criticar posturas institucionais. O que eu digo ali é muito mais amplo do que uma crítica pessoal ou sobre a fala de alguém, inclusive do presidente da República.

O que eu quis dizer para o país foi que todo aquele que pretenda algum tipo de retrocesso à democracia, frustrando eleições, defendendo intervenção militar ou rememorando Atos Institucionais, vai ser considerado pela história como inimigo da nação. É uma mensagem muito clara a todos.

Mas estamos falando do presidente, que influencia a política e a população. E esses exemplos de retrocessos foram praticados por ele. A interpretação que se tem é que o presidente vai ser reconhecido como um desses inimigos. Não, eu não disse isso. Eu estabeleci uma mensagem de não admitir retrocessos, considerando que a duras penas conquistamos a democracia e é nosso papel defendê-la. Eu serei intransigente.

Todas as especulações, menções, ações e fatos concretos que constituam uma ofensa à democracia devem ser repudiados, de quem quer que seja. Gostaria de tratar esse assunto no campo da ideia, sem fulanizar.

É evidente que o presidente, ao falar da perspectiva de frustração de eleições, foi infeliz. Quero crer que ele próprio reconheça que sua intenção não deve ter sido dizer que não terá eleições em 2022 [e sim] mais um exercício de argumentação para defender sua tese do voto impresso.

O sr. poderia comentar especificamente a fala "ou fazemos eleições limpas no Brasil ou não temos eleições"? Eu considero uma declaração infeliz, sujeita a um esclarecimento e a uma retificação. E gostaria muito de acreditar que, quando se diz algo assim, é no sentido conotativo de que, sem eleições limpas, isso afetaria a legitimidade das eleições de um modo geral.

As falas que atentam contra a democracia são retórica para manter uma base fidelizada ou o sr. considera que representam um mínimo de ameaça? Essa é uma avaliação que temos de fazer a todo momento, em razão de cada circunstância.

Obviamente, tudo é inaceitável, desde a bravata retórica que seja um proselitismo para aderência de base eleitoral, seja algum pensamento concreto que culmine numa preparação nesse sentido [de atentar contra democracia]. Tudo isso deve ser rechaçado, repudiado e eternamente vigiado.

O sr. dizia em abril que não era oportuno instalar a CPI da Covid durante o combate da pandemia. Mantém essa opinião? Mantenho. Considero que aquele era o momento mais agudo da crise. Morriam mais de 4.000 pessoas [por dia]. Os números exigiam convergência, uma unidade de ações entre Executivo e Legislativo. Eu considerava que a CPI valorizaria as divergências e não os pontos de unidade.

De qualquer forma, ela foi instalada e isso é um passado que não se reescreve. Teve nesses 90 dias todo o meu apoio para que pudesse trabalhar da forma mais independente possível.

Eu considero que ela tem realizado o seu trabalho e tenho uma grande expectativa de que ela possa, ao final, propor soluções e apurar responsabilidades.

O sr. concorda com a cúpula da CPI, que diz acreditar estar clara a omissão do governo na aquisição de vacinas? É preciso esgotar a investigação, ouvir todos os personagens e ter uma conclusão ao final, sob pena de ser precipitada uma conclusão parcial, de modo que eu não gostaria de comentar.

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) disse que levou ao presidente denúncias de irregularidades na compra da Covaxin, mas Bolsonaro não se pronuncia sobre isso. Qual é a sua visão sobre esse silêncio? Seria bom que houvesse o esclarecimento por parte do presidente ou toda figura pública sobre a qual houvesse algum tipo de dúvida. Mas a CPI está em curso, há sempre o tempo das coisas e eventualmente pode o presidente se manifestar a respeito desse ponto e de outros tantos que ali sejam merecedores de esclarecimento.

Em março, quando houve a criação de um comitê de enfrentamento da Covid, o sr. disse esperar que o presidente exercesse papel de liderança. Ele cumpriu suas expectativas? O presidente teve o reconhecimento desse pedido e participou de todas as reuniões. Eu louvo essa participação do presidente.

Eu reconheço os erros do governo. Porém reconheço acertos também, sobretudo do último ministro da Saúde, que tem buscado acertar em respeito à ciência, à medicina, ouvindo o Congresso.

Houve um avanço considerável na vacinação e uma grande expectativa de que ao final de 2021 nós tenhamos toda a população vacinada.

Isso significa que terá sido uma grande conquista? Não necessariamente, porque há um passado que ficará, de pessoas que morreram, de pessoas que sofreram, de uma demonstração de que nós podíamos ter acertado ao invés de errado em relação a alguns pontos.

Quais são as perspectivas para a sabatina e a votação do advogado-geral da União, André Mendonça, para o STF? O sr. trabalha a favor da aprovação dele? Nós faremos um esforço concentrado, buscando todas as regras de segurança para apreciar essas [indicações de] autoridades.

Meu papel deve ser de imparcialidade, permitindo que haja normalidade na apreciação do nome do ministro André Mendonça, que sob o ponto de vista pessoal e funcional considero uma pessoa preparada. Tenho com ele uma relação muito amistosa e cordial.

No início de agosto, vamos deliberar quando convocaremos o esforço concentrado no Senado.

O governo está enfraquecido no Congresso, em particular no Senado? Temos um Senado independente, que busca contribuir naquilo que interessa ao Brasil e que diverge das pautas do governo em alguns momentos. O que eu valorizo no Senado é a independência, que não é uma hostilidade ao governo, mas certamente não é subserviência.

O sr. vem sendo citado como nome da terceira via à Presidência ou como vice de algum candidato em 2022. O sr. aceitaria uma dessas posições? Não tenho essa avaliação. É algo que nesse momento eu não tenho me ocupado de tratar.

A institucionalidade da presidência do Senado me impõe essa prudência na análise política de 2022. Mas naturalmente eu tratarei de política em 2022, seja no meu estado, seja na política nacional, porque é meu papel fazê-lo.

O sr. está fechado às possibilidades envolvendo seu nome? Não estou fechado a absolutamente nada. Tenho de estar aberto a tudo. Tenho meu pensamento em relação ao país.

Um Brasil mais justo, com um Estado presente na vida das pessoas naquilo que realmente precisa estar, um Estado mais enxuto e atento às políticas públicas essenciais. Uma reforma tributária que seja realmente uma reforma tributária, uma reforma administrativa que discuta o tamanho do Estado, um investimento maciço em educação.

Em algum momento nós vamos identificar o caminho que nós devemos seguir para que essa realidade aconteça. Mas isso tem o momento certo.

Eu não me fecho para nenhuma das opções. As opções se apresentarão, e o povo vai ter a sua oportunidade de escolher.

O sr. vai deixar o Democratas para se filiar ao PSD? Considero que essa questão de mudança de partido não deve ser tratada agora. Estou feliz no meu partido, mas igualmente tenho grande apreço e fico lisonjeado com o convite feito pelo PSD.

RODRIGO PACHECO, 44

Nascido em Porto Velho (RO), mas criado em Passos (MG), é advogado criminalista. Foi eleito deputado federal em 2014, sendo durante o seu mandato escolhido para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça, a mais importante da Câmara. Eleito senador em 2018, atuou como líder da bancada do DEM no Senado, Casa que preside desde 1º de fevereiro deste ano

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