Pazuello tentou demitir em 2020 suspeito de pedir propina, mas Bolsonaro manteve diretor por pressão política

Intervenção para impedir exoneração de Roberto Dias em outubro teria partido do então presidente do Senado, Davi Alcolumbre

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Brasília

O general Eduardo Pazuello pediu a demissão de Roberto Ferreira Dias da Diretoria de Logística do Ministério da Saúde em outubro de 2020, quando ainda comandava a pasta. Mas, por pressão política, o presidente Jair Bolsonaro barrou a exoneração.

A informação foi divulgada pela rádio CBN e confirmada pela Folha com fontes da Saúde.

O despacho chegou a ser enviado para a Casa Civil, mas, de acordo com auxiliares de Bolsonaro na Saúde e no Palácio do Planalto, o ato foi brecado pelo chefe do Executivo depois de o então presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), interceder.

Pessoas próximas a Alcolumbre negam que o senador tenha protegido Dias, mas, procurado, o senador não quis se manifestar.

Dias acabou exonerado na última terça-feira (29), depois que a Folha revelou que o representante de uma vendedora de vacinas afirmou ter recebido dele pedido de propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato para compra de imunizante da AstraZeneca.

A exoneração de Dias foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (30).

O nome do diretor exonerado já havia sido citado em entrevista à Folha pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) que, com o irmão Luis Ricardo Miranda, chefe de importação do Ministério da Saúde, denunciou suspeita de irregularidade no contrato de compra da vacina indiana Covaxin.

Segundo o deputado, Dias era quem dava as cartas na Saúde.

"Eu acho assim, nada ali acontece se o Roberto não quiser. Tudo o que aconteceu, inclusive a pressão sobre o meu irmão, é sob a aprovação dele. Sem ele, ninguém faz nada. Isso é uma das únicas certezas que tenho", afirmou o Luis Miranda na entrevista.

A suspeita sobre a compra de vacinas veio à tona em torno da compra da Covaxin, quando a Folha revelou no dia 18 de junho o teor do depoimento sigiloso de Luis Ricardo Miranda ao Ministério Público Federal, que relatou pressão "atípica" para liberar a importação da vacina indiana. Desde então, o caso virou prioridade da CPI da Covid no Senado.

Na última terça-feira, Luiz Paulo Dominguetti Pereira, que se apresenta como representante da empresa Davati Medical Supply, disse à Folha que Dias cobrou a propina em um jantar no dia 25 de fevereiro, em Brasília.

A empresa Davati buscou a pasta para negociar 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca com uma proposta feita de US$ 3,5 por cada (depois disso passou a US$ 15,5).

Nesta quarta-feira, a Folha revelou que emails mostram que o Ministério da Saúde negociou oficialmente venda de vacinas com representantes da Davati.

As mensagens da negociação foram trocadas entre Roberto Dias, Herman Cardenas, que aparece como CEO da empresa, e Cristiano Alberto Carvalho, que se apresenta como procurador dela.

As suspeitas sobre irregularidades na contratação de vacinas têm preocupado servidores da Saúde, que, com receio de terem seus nomes envolvidos em escândalos, passaram a analisar cada vírgula de documentos que assinam.

Auxiliares de Bolsonaro discutem nos bastidores como blindar o presidente das recentes denúncias contra seu governo em relação a contratos de vacinação. As crises constantes têm atingido uma de suas bandeiras eleitorais: a de que não haveria irregularidades em sua gestão.

Nesta quarta-feira, Bolsonaro ignorou a denúncia de oferta de propina na compra de vacina e afirmou que mentiras não vão tirá-lo do Planalto, referindo-se ainda à CPI da Covid no Senado como "CPI de bandidos".

“Não conseguem nos atingir. Não vai ser com mentiras ou com CPI, integrada por sete bandidos, que vão nos tirar daqui. Temos uma missão pela frente: conduzir o destino da nossa nação e zelar pelo bem-estar e pelo progresso do nosso povo”, disse em discurso de improviso durante visita a Ponta Porã (MS).

Reservadamente, assessores presidenciais criticam a demora do Planalto em reagir a turbulências, sobretudo as que envolvem a CPI. Um exemplo é a queda de Dias, que só foi exonero após a denúncia de pedido de propina.

O mesmo tem ocorrido em relação ao líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), apontado como um dos fiadores da indicação de Dias. Bolsonaro resiste em tirá-lo do posto, à espera de que o próprio deputado abra mão.

Diante do agravamento da crise envolvendo a compra das vacinas, o presidente passou a evitar até mesmo seus apoiadores, que às vezes o colocam em saia-justa com perguntas delicadas. Desde terça-feira (29), os eleitores bolsonaristas não estão sendo autorizados a entrar no Palácio da Alvorada.

Ao mesmo tempo, Bolsonaro sofre pressão no Congresso. Em um aceno no dia em que um superpedido de impeachment contra ele foi protocolado na Câmara, o presidente agradeceu a parceria na aprovação de projetos a quem chamou de "amigos do Poder Legislativo".

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