Empresário nega à CPI ter ouvido pedido de propina por vacina em jantar sob suspeita

José Ricardo Santana esteve com então diretor do Ministério da Saúde no dia da assinatura do contrato de compra da Covaxin

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Brasília

Em um depoimento marcado por negativas e “esquecimentos”, segundo os integrantes da CPI da Covid, o empresário José Ricardo Santana negou participação na negociação da vacina indiana Covaxin e que o jantar em Brasília onde teria havido pedido de propina tenha sido para comemorar o contrato, firmado no mesmo dia.

Apontado como amigo do ex-diretor do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, Santana também afirmou não ter ouvido nesse jantar pedido de propina para avançar o negócio de 400 milhões de doses da vacina da AstraZeneca.

Santana depos à CPI nesta quinta-feira (26). Em posse de um habeas corpus, ele não assumiu o compromisso de dizer a verdade durante seu depoimento.

O empresário entrou no radar da CPI por ser um dos participantes do jantar em Brasília em que teria ocorrido pedido de propina.

A Folha publicou denúncia do policial militar Luiz Paulo Dominghetti, que afirmou ter ouvido pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina para avançar negociação no Ministério da Saúde. O pedido teria sido feito por Dias, então diretor de logística da pasta, exonerado no dia em que a reportagem foi publicada.

Inicialmente, o depoente apenas havia afirmado que estava jantando com Dias, quando chegaram Dominghetti e o coronel Marcelo Blanco. Disse não ter “mais lembranças desse encontro”. Questionado diretamente sobre a propina, negou. “Eu não presenciei nenhum pedido de vantagem indevida”, afirmou aos senadores.

Santana havia dito anteriormente que Dias era um amigo. Em mensagens, ele também trata o ex-diretor como “Bob”.

Além de sua participação no jantar, os senadores queriam ouvi-lo porque acreditam que ele seja lobista da Precisa Medicamentos, responsável por intermediar o negócio para a venda da Covaxin ao Ministério da Saúde.

Os senadores apontaram que Santana acompanhou representantes da Precisa em viagem à Índia justamente no período em que a empresa negociava com o laboratório indiano Bharat Biotech, fabricante da Covaxin.

Santana então usou seu habeas corpus e não respondeu perguntas referentes à viagem. No entanto, negou que tivesse participado de negociações referentes à imunização. “Não atuei em negociação da Covaxin."

O depoente também negou que o jantar do dia 25 de fevereiro fosse para comemorar o negócio com o ministério. Os senadores afirmaram que esse era o “chopping” ou “happy hour” da comemoração.

Além das vacinas, os senadores apontaram que Santana atuava em lobby em benefício da Precisa para a venda de testes de Covid-19 a órgãos públicos.

Em uma mensagem veiculada pela CPI —que consta de inquérito no Ministério Público Federal, encaminhado para a comissão— Santana afirma que passou uma madrugada inteira elaborando um plano de testagem junto com a médica Nise Yamaguchi, acusada de integrar um gabinete paralelo, de caráter negacionista. Ainda acrescenta no áudio que entregaria o plano para o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e para o presidente Jair Bolsonaro.

Questionado, ele afirmou que não entregou nenhum estudo ao presidente.

Santana irritou os senadores ao repetir diversas vezes que não se lembrava de episódios específicos. Em particular, ao ser confrontado com áudios enviados por ele próprio, nos quais afirmava estar com pessoas influentes no ministério no ano passado, como o próprio Dias e o coronel Blanco.

Após ser questionado sobre um áudio no qual afirmava que iria se encontrar com um senador para tratar de testes de Covid, por exemplo, também disse não se lembrar quem seria o parlamentar.

O empresário também participou de jantar na residência de Karina Kufa, advogada de Bolsonaro. Santana, no entanto, afirmou não se lembrar de quem estava presente. Apenas acrescentou que não conhece nenhum filho do presidente.

“Você tem um problema de memória sério, porque você não se lembra de nada. Você manda uma mensagem de quase dois minutos para uma pessoa e não lembra para quem foi a mensagem! Foi uma noite agradável. De noites agradáveis a gente sempre se lembra para o resto da vida, porque a gente tem muito mais dias”, afirmou o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM).

Santana ainda reconheceu que foi indicado para uma vaga no Ministério da Saúde por Roberto Ferreira Dias. Atuou durante cinco semanas na pasta, entre o fim de março e o mês de maio de 2020, deixando o cargo porque sua nomeação não foi efetivada.

A ida para o Ministério da Saúde acontece pouco tempo após deixar a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Santana era secretário-executivo da Câmara de Regulação de Mercado de Medicamentos, órgão interministerial, cuja secretaria-executiva fica a cargo da agência.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) então apontou a coincidência de datas, com Santana atuando para a iniciativa privada quando ainda estava atuando "informalmente" no Ministério da Saúde.

O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), informou que Santana será incluído na lista de investigados formais da comissão, deixando a condição de testemunha.

Renan ainda falou que está "trabalhando muito" para concluir o seu relatório na segunda quinzena de setembro.

Na próxima semana, a CPI deve ouvir o empresário e advogado Marcos Tolentino, amigo pessoal do líder do governo Bolsonaro na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR). Ele é apontado como sócio-oculto do FIB Bank, empresa que deu a garantia para a compra da vacina Covaxin.

Outro depoimento será do motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva, que assumiu ter sacado até R$ 4,7 milhões em espécie na boca do caixa para a empresa VTC Log, investigada pela CPI. A comissão também pediu proteção da Polícia Federal para o motoboy.

Randolfe Rodrigues também afirmou que o depoimento do empresário Luciano Hang, dono da Havan, será marcado para depois do feriado de Independência.

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