Governo Bolsonaro pagou cachê para ao menos 32 apresentadores e influenciadores

Lideram a lista nomes da Record TV e Rede TV!, emissoras alinhadas ao presidente

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Brasília

Ao menos 32 apresentadores e influenciadores receberam cachês para campanhas do governo de Jair Bolsonaro, mostram planilhas da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) entregues à CPI da Covid no Senado. A comissão apura ações e omissões da gestão federal no enfrentamento da pandemia.

Na televisão, as campanhas foram feitas por apresentadores bolsonaristas ou que trabalham em emissoras com uma linha mais próxima do governo, como a Record TV e a Rede TV!.

Elas falavam sobre "cuidado precoce", agenda positiva, o lançamento da cédula de R$ 200, a violência contra a mulher e outras seis iniciativas.

Sikêra Junior participa do Mega Senha com Marcelo de Carvalho
Sikêra Junior participa do Mega Senha com Marcelo de Carvalho - Divulgação

Na Rede TV! quem faturou ao menos R$ 122 mil foi um dos próprios donos da emissora, o apresentador Marcelo de Carvalho. O pagamento de 11 cachês foi feito por meio das suas empresas New Mídia Serviços e TV Ômega Ltda.

Marcelo de Carvalho é apoiador de Bolsonaro. O apresentador levanta bandeira parecida com a presidente e se tornou uma das vozes mais estridentes contra as políticas de isolamento social, “essa bobagem de quarentena”, como disse no programa Mega Senha de julho do ano passado.

Um mês antes, a RedeTV News, principal telejornal do canal, foi o único entre os seus concorrentes a ignorar a tentativa do governo de maquiar a apresentação dos números da pandemia de coronavírus.

Como a Folha revelou, outros apresentadores da emissora também foram beneficiados por campanhas do governo, como Luciana Gimenez, Sikêra Júnior e Luís Ernesto Lacombe.

Entre os nomes listados também estão apresentadores da Record TV. Eles receberam por meio da empresa Rádio e Televisão Record.

Lidera a lista o apresentador Cesar Filho, do programa Hoje em Dia. Ele recebeu 11 cachês que somam R$ 525 mil. O apresentador chegou a manifestar apoio ao presidente durante campanha eleitoral.

Em seguida, está a apresentadora Ana Hickmann, com nove cachês, que somam R$ 411 mil. A apresentadora chegou a ser criticada nas redes sociais por postar uma foto ao lado de Bolsonaro em 2019. Na legenda, ela escreveu: “Hoje eu tive a honra de conhecer o meu presidente”.

Os apresentadores Ticiane Pinheiro, Luiz Bacci e Marcos Mion, que atualmente foi para a Globo, fazem parte da lista. Ao menos seis apresentadores de afiliadas da Record TV também receberam cachê.

As assessorias de Marcos Mion e Ticiane Pinheiro afirmaram, em nota, que as informações quanto à finalidade das ações correspondem às descritas na lista enviada à CPI.

Mion foi designado pela emissora para gravar campanha sobre o combate ao mosquito Aedes aegypti.

“Importante ressaltar que a negociação de merchandising é feita com a emissora, que determina a seu funcionário a realização da ação, e o artista recebe apenas uma fração do valor", disse o apresentador em nota.

Já a assessoria de Ticiane Pinheiro informou que a apresentadora foi destacada para realizar a ação de combate à violência contra a mulher.

O apresentador Luiz Bacci disse que a reportagem deveria procurar a emissora. Cesar Filho e Ana Hickmann foram procurados, mas não responderam, assim como a Record TV.

Os desembolsos foram feitos pela Secom por meio de subcontratação das empresas PPR Profissionais de Publicidade Reunidos, Calia/Y2 Propaganda e Marketing e Artplan Comunicação. Todas elas têm contratos com o Executivo federal.

A Calia e a Artplan fizeram a contratação de três empresas, responsáveis pela escolha de influenciadores. A reportagem conseguiu mapear ao menos 15 nomes que receberam dinheiro para campanha do governo federal.

A Tubelab Brasil recebeu R$ 190 mil para a realização da campanha sobre o combate ao mosquito da dengue. A empresa repassou R$ 10 mil no total para os influenciadores Adonias e Dayanne Ribeiro, que confirmaram os pagamentos, e Família Jeito Loko de Ser, que não respondeu.

“Trata-se de prática comum o uso de influenciadores em campanhas governamentais, não só no Brasil, como em outros países. Atendemos ao governo federal desde gestões passados”, disse a empresa.

A FKD Comunicação, Propaganda e Marketing recebeu R$ 347 mil para campanha sobre o cuidado precoce. Em nota, a empresa disse que destinou R$ 23 mil para a contratação de Flávia Viana, Pam Puertas, João Zoli e Jessika Taynara.

“É muito importante esclarecer que a campanha não possui qualquer relação com o dito 'tratamento precoce', mas com as ações de cuidados e prevenção à doença, principalmente, no que se refere a procurar atendimento médico aos primeiros sintomas”, afirmou.

Pam Puertas confirmou a participação na campanha, tendo recebido R$ 2.500. Jessika Taynara, Flávia Viana e João Zoli foram procuradas, mas não responderam.

Outras notas fiscais que a Folha teve acesso mostram que a Oroboro Entertainment pagou R$ 287 mil a influenciadores para uma campanha de enfrentamento da violência contra a mulher.

Foram contratados por meio da empresa Taciele Alcolea, Mari Maria, Fabiola Melo, Shantal Verdelho, Juliana Goes, Mariana Felício, Flávia Pavanelli e Nina Secrets.

As seis primeiras confirmaram a participação na campanha. Flávia Pavanelli e Nina Secrets não responderam, assim como a empresa Oroboro.

Somente com essas contratações foram gastos R$ 2,4 milhões. O site The Intercept Brasil também mostrou que o governo federal pagou ao menos R$ 4,3 milhões para apresentadores de TV, radialistas, influencers e uma dupla sertaneja fazerem merchandising de seu governo.

O deputado Elias Vaz (PSB-GO), que mapeou parte dos nomes da reportagem da Folha, enviou um requerimento à Secom para ter acesso a informações mais detalhadas sobre os cachês pagos pela secretaria em 2019 e 2020.

Ele também pede esclarecimentos sobre a existência de direcionamento de recursos a emissoras, artistas, influenciadores, jornalistas aliados do governo.

“Ao analisar as notas fiscais enviadas pela pasta à CPI, observa-se que grande parte das ações de merchandising empreendidas pela Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República foram direcionadas para apresentadores e artistas específicos nos anos de 2019 e 2020.”

A Calia disse que a escolha tanto de influenciadores, radialistas ou apresentadores que realizam ações de merchandising é baseada em cruzamentos de dados de audiência, representatividade e adequação ao público-alvo, horários de veiculação, período da campanha, entre outros critérios técnicos.

“No caso específico destes apresentadores citados em seu questionamento, eles comandam programas exibidos na Rede TV! e Record, esclarecendo também que foram utilizados apresentadores de outros canais como SBT e Band em diversas campanhas governamentais.”

A Artplan disse, em nota, que não procede a informação de contratação de apresentadores somente da Record e Rede TV!. “A Artplan disponibilizou todos os documentos e prestou todas essas informações. Todos esses dados são públicos e estão disponíveis no Portal da Transparência.”

A Secom, a PPR, a Rede TV! e Marcelo de Carvalho foram procurados, mas não responderam até a publicação deste texto.

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