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Coronavírus CPI da Covid

Líder de Bolsonaro ganha round contra CPI com show de despudor político

Barros explorou limites da comissão, mas agora terá de ir ao Supremo para poder calar

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São Paulo

Jogue um tubarão num lago com peixes menores e o resultado será previsível. Faça o mesmo com adoráveis peixes-palhaço numa piscina com vorazes cações e o cenário será igual, com sinal trocado.

Desta forma, o embate antecipado entre o líder do governo Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), e a CPI da Covid permitiria um caso raro de incerteza do placar.

Aziz aponta em direção ao deputado Ricardo Barros durante o depoimento do líder na CPI
Aziz aponta em direção ao deputado Ricardo Barros durante o depoimento do líder na CPI - Pedro Ladeira/Folhapress

Seguindo a analogia píscea, era tubarão contra tubarão, ainda que tanto oposição quanto governo tenham em suas fileiras notórios seres aquáticos de menor calibre.

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), admoestou Barros a não ser um tucunaré e morrer pela boca, na enésima tirada amazônica que usou para sair bem na foto das redes sociais, mas não conseguiu dobrar o homem de Maringá.

Com uma exibição exuberante de cinismo e despudor político, Barros venceu. Ciente dos limites da CPI e se aproveitando da mudança de sua condição para a de convidado, não convocado, o deputado manobrou com habilidade.

Mostrou disposição de colaborar e de responder ao colegiado, exibindo conhecimento de quem já foi ministro da Saúde e viu seu nome envolvido em suspeitas diversas nos meandros da máquina. Só não manteve o compromisso com a verdade.

Para ficar em dois momentos exemplares, disse que o presidente nunca confirmou ter dito ao deputado Luis Miranda (DEM-DF) que o rolo da compra da Covaxin era assunto de Barros. Pois é, mas também nunca negou.

O caso, ao lado de outras traficâncias suspeitas apuradas posteriormente, ajudou a colar em Bolsonaro a pecha de corrupto, erodindo uma das pernas de seu apoio desde a campanha de 2018.

Em outro ponto, o deputado disse de forma desassombrada que a CPI atrapalhou a chegada de novas vacinas para o Brasil. Ora, tudo o que está sendo apurado sobre o tema imunizantes ocorreu antes da instalação da comissão, com a evidente culpa de Bolsonaro em atrapalhar o processo em 2020.

Barros ainda citou o caso da vacina chinesa da CanSino, mas ela foi vetada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em junho, e não desistiu do Brasil porque a comissão do Senado estava ativa

Barros apelou, apoiado pela tropa de choque governista na CPI. No grito, conseguiu ver a sessão suspensa, protagonizando a seguir uma cena inusitada.

Toda comissão do gênero é dividida entre os que acusam e os que protegem, mas pareceu excessivo mesmo para o padrão frouxo de Brasília ver o depoente concedendo uma entrevista coletiva ao lado de seus integrantes.

Em outros episódios, Barros encarnou ainda melhor o tubarão e apontou fragilidades evidentes da CPI. Mostrou falhas técnicas e criticou o caráter de inquisição visando responsabilizar o governo Bolsonaro.

Isso tem ressonância em parte do público, mesmo não entusiasta do governo. Na prática, contudo, Barros sabe que é um jogo perdido: a CPI conseguiu organizar diversas linhas discursivas e trouxe novidades inauditas ao longo de sua primeira temporada, antes do recesso parlamentar.

Por isso mesmo resolveu tentar jogar na confusão, talvez estabelecendo um padrão para o segundo tempo da partida.

Como Aziz e Renan Calheiros (MDB-AL) estão longe de serem peixes-palhaços, haverá certamente uma dosimetria para tentar evitar isso, e ela pôde ser vista com a retomada da sessão. Aziz encerrou os trabalhos e disse que Barros teria de voltar como convocado.

Logo, sujeito a prisão e afins se mentir. Mas também com a chance de ele ir ao Supremo Tribunal Federal e sair um um direito de sair calado, gerando impasse, apesar de sua atitude de confronto.

Ainda assim, o alerta para a CPI está dado, e o tempo corre para que a comissão monte seu caso antes que o fastio natural com esse tipo de apuração seja engolido pela cacofonia que parece ser a ênfase dos governistas a partir de agora.

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