Para CPI, amigo de Barros é sócio oculto de empresa garantidora da Covaxin

Após depoimento de diretor do FIB Bank, senadores veem confirmação da proximidade de advogado com o líder do governo na Câmara

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Brasília

Em depoimento à CPI da Covid no Senado, o diretor do FIB Bank Roberto Pereira Ramos Júnior não conseguiu explicar as operações da empresa, se calou diante de acusações de uso de "laranjas" e não convenceu os senadores sobre a origem do capital bilionário da companhia.

No entanto, com as informações prestadas nesta quarta-feira (25), os membros da comissão consideram estar provado que é sócio oculto da empresa o advogado Marcos Tolentino —amigo do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara. O depoente mostrou que Tolentino é procurador de uma das empresas acionistas do FIB Bank

O FIB Bank entrou no radar da CPI por ter dado a garantia para a compra da vacina indiana Covaxin. O contrato de compra da imunização tinha valor de R$ 1,6 bilhão, e a empresa —que não é um banco— garantiria R$ 80 milhões. A emissão da carta fiança custou R$ 500 mil para a empresa fornecedora da vacina.

O contrato de compra da Covaxin acabou cancelado após o surgimento de diversos indícios de irregularidades. O negócio foi intermediado no Brasil pela Precisa Medicamentos, que teria negociado a garantia com o FIB Bank.

O diretor disse que a Precisa pagou imediatamente R$ 350 mil do valor da carta fiança.

Em seu depoimento, Ramos Júnior reafirmou que o capital do FIB Bank é de R$ 7,5 bilhões, composto basicamente por dois imóveis em posse da empresa. Apenas um deles teria valor de R$ 7,2 bilhões, o que foi questionado pelos membros da comissão.

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), ironizou que muitos imóveis icônicos no mundo não chegam perto desse valor de mercado, citando o Palácio de Buckingham, residência oficial da família real britânica.

"Uma mensagem que eu recebi é que o Palácio de Buckingham custa US$1,5 bilhão, que, multiplicando por cinco, pode chegar a R$ 7 bilhões. Então, o terreno que o senhor tem dá pra comprar o Palácio de Buckingham, na Inglaterra", afirmou.

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) também questionou que a empresa mudou a matrícula desse imóvel, sugerindo que o imóvel não existe. “O imóvel voador, que saiu de Curitiba e foi para São Paulo, no valor de 7,2 bilhões."

O depoente ainda irritou os senadores ao afirmar não ter conhecimento de informações básicas da empresa que preside. Questionado sobre o endereço, disse apenas o bairro e a rua, mas não sabia o número.

Humberto Costa (PT-PE) também perguntou sobre operações recentes da empresa, que o depoente afirmou desconhecer. “O presidente do banco não sabe que o banco fez 19 transferências bancárias."

Em um dos momentos que os senadores consideram dos mais importantes, o diretor do FIB Bank respondeu que Marcos Tolentino é advogado de Ricardo Benetti e representante de uma de suas empresas, a Pico do Juazeiro.

Essa empresa é uma das que compõem o capital social do FIB Bank, ao lado da MB Guassu.

“O endereço da MB Guassu é o mesmo endereço do senhor Marcos Tolentino, de São Paulo. O mesmo escritório do senhor Marcos Tolentino em São Paulo é da MB Guassu”, afirmou Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI.

Rogério Carvalho (PT-SE) então apontou que há uma coincidência de números de telefone.

“O telefone informado como sendo da FIB Bank Garantia de Fianças Fidejussórias S.A. também seria o do escritório Benetti & Associados, que tem Marcos Tolentino da Silva como membro do conselho do escritório”, afirmou.

Randolfe ainda apontou que o FIB Bank transferiu quase R$ 2 milhões no ano passado para empresas de Tolentino.

"O senhor Marcos Tolentino, por tudo o que está colocado aqui, é o verdadeiro sócio-proprietário do FIB Bank. Temos todos os elementos para isso, temos todas as informações para isso, e as suas contradições acabaram confirmando as certezas que nós temos", afirmou.

Randolfe ainda questionou o depoente sobre mudanças na composição societária da MB Guassu, que ocorreram três anos após a morte de um sócio-majoritário. Neste momento, o diretor fez uso do habeas corpus concedido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e pela primeira vez usou seu direito ao silêncio.

Em outra irregularidade apontada envolvendo o FIB Bank, os senadores exibiram o vídeo de um homem de Alagoas, chamado Geraldo Rodrigues Machado, conhecido como Geraldão, no qual ele denuncia que falsificaram sua assinatura e que ele figura entre os sócios da empresa. A fraude só foi descoberta após Machado ter negado o seu pedido de seguro-desemprego.

O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), afirmou então que o habeas corpus não impede a prisão do depoente e disse que essa medida poderia ser adotada, o que acabou não acontecendo.

O depoimento foi um dos raros momentos na CPI de união entre governistas e oposição. Mesmo senadores próximos ao Planalto questionaram as informações prestadas. O vice-líder do governo Jorginho Mello (PL-SC) chegou a afirmar que "esse cidadão está ofendendo o Senado".

"Eu me sinto envergonhado de estar aqui sapateando em cima de um negócio desse, de uma mentiragem [sic] dessa, de uma picaretagem dessa, que queria dar mais um golpe no governo", disse Mello.

Senadores criticaram duramente o Ministério da Saúde por ter aceitado a garantia cedida por uma empresa, sem verificar ou ignorando todos os indícios de irregularidades que envolvem o FIB Bank.

“A responsabilidade é de quem no Ministério da Saúde avaliou essa garantia”, disse Humberto Costa.

Além disso, os senadores também apontaram que há cartas-fiança do FIB Bank em outros órgãos federais, como na AGU (Advocacia-Geral da União) e no Ministério da Economia.

Também nesta quarta, Renan informou na abertura da sessão que incluiu outras três pessoas na lista de investigados formais pela CPI.

Deixam a condição de testemunha para se tornarem investigados o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias; o sócio-administrador da Precisa, Francisco Emerson Maximiano; e o diretor-presidente da Belcher Farmacêutica, Emanuel Catori.

Reportagem da Folha mostrou denúncia do policial militar Luiz Paulo Dominghetti, que afirmou ter recebido pedido de propina de Roberto Dias, para avançar a compra de 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca pelo Ministério da Saúde. Segundo Dominghetti, Dias pediu US$ 1 dólar de propina por dose da imunização.

Também se tornou investigado o empresário Francisco Maximiano, sócio-diretor da Precisa Medicamentos. A empresa foi intermediária na negociação para a compra da Covaxin pelo Ministério da Saúde. O negócio foi cancelado após o surgimento de uma série de indícios de irregularidades.

O diretor-presidente da Belcher Farmacêutica, Emanuel Catori, também se tornou investigado formal pela comissão.

A Belcher era a representante da empresa chinesa CanSino Biologicals, responsável pelo desenvolvimento da vacina Convidecia contra a Covid-19.

Inicialmente, Catori disse que não houve nenhum facilitador político para que tivesse contatos no Ministério da Saúde. No entanto, confirmou que foi Barros quem marcou a reunião com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, no dia 15 de abril.

Também nesta quarta, os senadores da CPI aprovaram requerimento para convocação do motoboy Ivanildo Gonçalves da Silva. Reportagem do Jornal de Brasília, com base em dados do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), apontou que ele seria o responsável por saques da empresa VTC Log, investigada pela comissão

Ivanildo Gonçalves da Silva teria sacado de uma única vez R$ 4,7 milhões em espécie, na boca do caixa, para a VTC Log.

Nesta quarta, porém, a CPI também sofreu uma derrota no STF. O ministro Dias Toffoli suspendeu a quebra de sigilo fiscal de Frederick Wassef, advogado da família Bolsonaro.

O magistrado atendeu a um pedido da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que afirmou que a medida foi aprovada pelo CPI sem a fundamentação adequada. Os senadores pretendiam apurar a relação de Wassef com a Precisa Medicamentos.

Toffoli, por sua vez, criticou a extensão da quebra, que parte de 2016 até hoje, e citou possível conflito entre a decisão da CPI e a prerrogativa dos advogados previstas na lei que define o Estatuto da Advocacia.

O ministro afirmou que a quebra deve ser contemporânea e proporcional à finalidade e disse que a medida não pode servir como instrumento de devassa da vida privada do investigado.

Colaborou Matheus Teixeira, de Brasília

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