Ato contra Bolsonaro no Anhangabaú tem gritos de 'fascista' e pedido de impeachment

PM diz que 15 mil pessoas participaram do protesto no centro de São Paulo; organização estima 50 mil

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São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília

A poucos quilômetros do ato de raiz golpista realizado nesta terça (7) na avenida Paulista, milhares se reuniam para protestar contra Jair Bolsonaro (sem partido) e pedir o impeachment do presidente.

O protesto no Anhagabaú, centro de São Paulo, teve gritos de "fascista", "genocida" e críticas à condução da pandemia pelo governo federal. Também foi marcado por cobranças pelo combate à fome e contou com arrecadação de alimentos. Foi realizado em conjunto com o Grito dos Excluídos, promovido tradicionalmente na data por alas da Igreja Católica.

Embora o vermelho ainda predominasse, as cores da bandeira brasileira, marca das manifestações da direita, foram resgatadas pela esquerda no protesto contra Bolsonaro.

Uma faixa verde e amarela de 100 metros de comprimento e 9 de largura ocupou todo o calçadão que liga a Avenida São João ao Vale do Anhangabaú, região central da cidade. Com tinta preta, dezenas de manifestantes pintaram a frase "Fora Bolsonaro Impeachment Já".

"Essas cores são do país, não são deles", disse Annebelle Rene Ambria, membro do Juventude Pátria Livre, que confeccionou a faixa. Segundo ela, o movimento "quer disputar as cores da bandeira, da qual os bolsonaristas se apropriaram".

​O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), disse em discurso no final do ato que Bolsonaro conseguiu dividir os brasileiros no dia da Independência.

"Temos um ato na Paulista de gente defendendo o fascismo e a tortura. Depois de três anos de destruição dos empregos, da vida e da esperança, o que essas pessoas estão fazendo na Paulista? Por que não estão aqui com a gente?", disse.

Ex-candidato à Presidência e à prefeitura, Guilherme Boulos (PSOL) disse que a rua é do povo, não dos fascistas. Ele criticou falas de Bolsonaro que põem dúvidas na lisura do processo eleitoral e defendem o armamento da população.

"O Brasil não quer saber de ataques às urnas eletrônicas. O Brasil quer saber do combate à fome, do preço do feijão, e não do fuzil.", disse.

Boulos também condenou falas autoritárias e de apoio à ditadura. "Nós somos herdeiros de uma geração que deu a vida pela democracia, de uma geração que foi torturada, que foi perseguida, que foi censurada e foi assassinada. E nós não vamos entregar a nossa liberdade pra eles. Nós não vamos entregar e nem desistir da nossa luta e dos nossos sonhos".

Citando Guimarães Rosa, disse que a vida exige coragem. "E é com coragem que nós vamos derrotar o genocida. Aqui tem um povo sem medo. Fora, Bolsonaro", completou.

O protesto reuniu partidos de esquerda, como PSTU, PSOL, PCO e PT, além de representantes dos movimentos negro e feminista. Participaram os deputados federais Orlando Silva (PCdoB), Paulo Teixeira (PT) e Gleisi Hoffmann (PT), o vereador Eduardo Suplicy (PT-SP) e a deputada estadual Isa Penna (PSOL). A presença do ex-presidente Lula (PT) chegou a ser cogitada, mas não se concretizou.

A organização dos atos foi marcada por desencontro entre os opositores a Bolsonaro. Alas à esquerda e à direita convergiram no discurso de que era preciso dar uma resposta também nas ruas à manifestação bolsonarista, mas, fragmentadas por interesses ligados às eleições de 2022, travaram na falta de uma reação unificada.

Apesar dos acenos para fora, a participação na capital paulista dos diretórios municipais de PSDB e PDT foi atacada por integrantes do PCO. Militantes do partido chegaram a agredir tucanos na avenida Paulista em 3 de julho. Apoiadores de Ciro Gomes também relataram hostilidades.

A manifestação começou a ganhar mais força no início da tarde, pouco depois das 14h, e estava programada para encerrar antes das 19h. Segundo organizadores, 50 mil pessoas participaram da manifestação no Vale do Anhangabaú. A Polícia Militar estimou 15 mil pessoas.

O local foi escolhido após uma disputa pela avenida Paulista, que está reservada para os bolsonaristas, e um embate judicial com a gestão João Doria (PSDB), que chegou a proibir a realização no mesmo dia de protestos contra Bolsonaro, mas recuou.

Nesta terça, no Anhangabaú, muitas mulheres se reuniram em um bloco de carnaval. A canção "Bella Ciao", símbolo da esquerda recentemente revivido pela série espanhola "La Casa de Papel", virou "Bozo Tchau".

Grupos de percussão espalharam-se por todo o ato, com paródias carnavalescas que incluíram hits do funk e da MPB. "Eu só quero é ser feliz, derrubar o presidente e salvar o meu país" releu, por exemplo, famosa com posição de Cidinho e Doca sobre as favelas.

A Polícia Militar contou com dezenas de homens portando armas de fogo e cacetetes e realizou revistas não apenas em pontos de acesso à manifestação contra Bolsonaro, mas também em pontos de concentração.

Um tenente da Polícia Militar apreendeu uma lata de tinta spray do programador Bruno, 27 (ele não quis passar seu sobrenome para a reportagem). O policial, chamado Farina, justificou a apreensão dizendo que a tinta era inflamável, conforme registrado no rótulo da lata.

"É para a segurança dos manifestantes", disse. Bruno definiu a ação como "tirana e abusiva".

Segundo organizadores, houve protestos contra o governo em 200 cidades. No Rio de Janeiro e Brasília, as manifestações ocorreram na parte da manhã, terminando por de 12h.

No Rio, após concentração na rua Uruguaiana, os manifestantes seguiram às 11h em direção à Praça Mauá, centro da cidade, e se reuniram em frente ao MAR (Museu de Arte do Rio).

No trajeto, chamaram o presidente de genocida e entoaram gritos de fora Bolsonaro.

Preocupado com o que considera um risco real de ruptura da democracia, Leandro Lanfredi, 38, disse que participar do ato é uma forma de defender os interesses dos trabalhadores.

"A única resposta a isso pode ser dada pela massa na rua. Não vão ser essas instituições que fizeram parte do impeachment e de vários avanços autoritários que vão frear isso. Vai ser o povo na rua", diz ele.

Roberto Salimeni,59, disse que, "além de Bolsonaro não ter proposta alguma para a economia, existe uma ameaça grave à democracia".

Quando o ato chegou à Praça Mauá, representantes de movimentos sociais e de partidos de esquerda, como PT e PCO, subiram em um trio elétrico para discursar contra o mandatário.

Segundo os organizadores, o ato reuniu 25 mil pessoas. A PM ainda não divulgou números. Pelo menos 20 policiais acompanharam a manifestação.

Em Brasília, manifestantes que protestavam contra o presidente se reuniram em torno da Torre de TV até por volta das 11h.

O ato ocorreu a aproximadamente 3 km da Esplanada dos Ministérios, onde grupos bolsonaristas se manifestavam a favor do governo.

Segundo os organizadores, a manifestação contra Bolsonaro reuniu cerca de 3 mil participantes. A Polícia Militar estima que 400 pessoas estiveram no protesto.

Durante o ato em Brasília, os manifestantes gritaram palavras de ordem contra o governo Bolsonaro e em defesa da democracia. Eles também pediram a prorrogação do auxílio emergencial e a vacinação em massa contra a Covid-19.

Apoiadores do presidente Bolsonaro passavam a poucos metros de onde os manifestantes da oposição estavam. Apesar da proximidade entre os grupos, não houve atritos.

No entanto, após o fim dos protestos, apoiadores do governo e um pequeno grupo de pessoas que participara mais cedo do protesto organizado pela esquerda se desentenderam próximo à Torre de TV.

Manifestantes que apoiam o governo gritaram palavras como "Lula ladrão" e "vai para Cuba" e recebiam como respostam "Fora Bolsonaro, fora genocida".

A poucos metros das manifestações organizadas na capital, indígenas que estão em Brasília para pressionar o STF (Supremo Tribunal Federal) a vetar o marco temporal para demarcação de terras decidiram cancelar os atos que realizariam no mesmo dia.

Segundo a líder indígena Lua Ayrè, os cerca de 2 mil indígenas que estão no local não se envolveriam em nenhum dos dois protestos desta terça.

MBL e VPR anunciaram em julho um protesto contra Bolsonaro para 12 de setembro, o domingo pós-feriado. Nos últimos dias, a mobilização ganhou conotação de apoio a uma terceira via para 2022, ancorada no mote "nem Lula nem Bolsonaro".

"Sempre deixei claro que sou a favor da ampliação, mas o que ouço de muita gente [na Campanha Fora Bolsonaro] é que há um desconforto de andar ao lado de quem está contra o Lula", diz Raimundo Bonfim, coordenador da CMP (Central de Movimentos Populares) e filiado ao PT.

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