Empresário bolsonarista defende posição antivacina e antimáscara, e CPI vê crimes contra medidas sanitárias

Otávio Fakhoury admite ter financiado material de campanha de Bolsonaro não declarado à Justiça, mas nega propagar fake news

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

Em depoimento à CPI da Covid, o empresário bolsonarista Otávio Fakhoury questionou a eficácia de vacinas, afirmou que máscaras não funcionam e defendeu medicamentos ineficazes contra a Covid-19. E invocou a “liberdade de opinião” como um direito para ter essas posições.

A cúpula da CPI considerou que ele estaria se “autoincriminando” com sua fala na comissão, por declarar publicamente o não cumprimento de medidas sanitárias durante a pandemia.

Fakhoury reconheceu que financiou a produção de material de campanha durante as eleições de 2018, que não foram declarados para a Justiça Eleitoral, e confirmou que deu dinheiro a um instituto que buscou intermediar a negociação de vacinas contra a Covid-19, mas negou ser propagador de fake news.

O empresário bolsonarista Otávio Fakhoury durante depoimento à CPI da Covid
O empresário bolsonarista Otávio Fakhoury durante depoimento à CPI da Covid - Edilson Rodrigues/Agência Senado

O empresário bolsonarista foi convocado porque senadores da CPI afirmam ter indícios e provas de que ele financia a disseminação de fake news. Fakhoury é investigado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) no âmbito dos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos.

Ao contrário de depoentes anteriores, que buscavam amenizar na CPI suas posições em redes sociais, Fakhoury defendeu suas teses negacionistas de enfrentamento da pandemia.

Inicialmente, disse que sua família não se vacinou por avaliar que ainda não há provas de eficácia. “Minha posição em relação a vacinas é que elas têm que ser adquiridas e oferecidas pelo governo, porém elas ainda hoje se encontram em estágio experimental."

“Portanto, a minha posição é que elas não devem ser obrigatórias. Para a minha família e pessoalmente, eu aguardo o término dos testes para que eu possa decidir, então, se imunizo a minha família ou não”, completou.

A informação divulgada pelo empresário, no entanto, é falsa. Já há duas vacinas que receberam o registro definitivo da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a da Pfizer e a da AstraZeneca. Isso significa que ambas concluíram todas as fases de testes clínicos.

O depoente também disse que as máscaras não funcionam e defendeu os medicamentos do "kit Covid" e o tratamento precoce. Afirmou que 14 pessoas da sua família e amigos foram infectados e se curaram com esses remédios.

Fakhoury ainda defendeu a tese da imunidade de rebanho, que prevê que uma proteção natural surge na população após determinada porcentagem dela ser infectada. “No meu rebanho, ela funcionou."

Em todos os momentos em que defendia teses negacionistas, o depoente afirmou que era a sua opinião e invocou a liberdade de expressão e opinião.

“Isso não é liberdade de opinião. Quando a sua decisão, a sua opinião compromete a saúde de todos, isso não é liberdade de opinião. Isso é crime”, rebateu o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Para o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), Fakhoury estaria se autoincriminando.

“Eu queria só comunicar à vossa excelência, considerando que o uso de máscara e o distanciamento são, na maioria dos municípios, medidas sanitárias preventivas, o seu descumprimento configura o crime do artigo 268 do Código Penal”, disse Renan, referindo-se ao crime de infração de medida sanitária.

Fakhoury admitiu que financiou material de campanha nas eleições de 2018, mas disse ter sido uma ação espontânea e sem ligação com a candidatura de Jair Bolsonaro. A iniciativa não está declarada na Justiça Eleitoral.

Renan apontou que a Polícia Federal encontrou no computador do empresário notas fiscais de duas gráficas do Nordeste, que confirmam a impressão de 560 mil itens de propaganda eleitoral para Bolsonaro, como panfletos e adesivos com a foto do candidato e a proposta de campanha para a Presidência.

Fakhoury depois reconheceu a iniciativa, mas disse que não era ligado à campanha de Bolsonaro. "Foi uma campanha que foi feita pelas pessoas, o presidente estava acamado com uma facada. As pessoas, por livre e espontânea vontade, imprimiam o seu material, saíam nas ruas."

"Este valor que foi relatado no inquérito foi um valor que eu fiz de ajuda para grupos, nada tem a ver com a campanha, que estavam imprimindo o próprio material. Grupos em estados do Nordeste que estavam imprimindo o próprio material para distribuir na rua [...]. E eles me pediram se eu podia ajudá-los e assim eu fiz. Cada um imprimiu seu material, ninguém deles, nenhum deles é ligado à campanha", acrescentou.

O empresário também disse ter financiado manifestações pró-Bolsonaro que defendiam a reforma da Previdência, realizadas na avenida Paulista em 2019.

Ele ainda confirmou que financiou o Instituto Força Brasil, que entrou no radar da CPI por ter tentado intermediar a negociação de vacinas contra a Covid-19. O empresário é vice-presidente do órgão, mas alegou ser uma posição simbólica, sem atividades de gerenciamento. Estaria ocupando o cargo apenas por causa das doações que realizou.

"O [coronel] Helcio [Bruno] já o tinha [conhecimento] de forma informal. No ano passado, ele me procurou porque queria formalizar o instituto e me apresentou os estatutos."

"Eu combinei, prometi fazer um aporte no instituto para custear, custear o instituto por um período até que ele estivesse operando e estivesse com a captação, estivesse com os membros para que ele pudesse andar por conta própria", completou.

Fakhoury declarou não saber quem seriam os responsáveis no instituto por publicações negacionistas. "O Instituto Força Brasil, a executiva, os executivos que o comandam ficam em Brasília. Eu tinha uma posição institucional em São Paulo, então eu não participava da gestão de nada ou do dia a dia do instituto."

Ele negou que tenha financiado disseminação de fake news e se diz vítima de campanhas difamatórias.

"Fui acusado injustamente e caluniado como propagador de fake news, sem jamais ter produzido uma única notícia falsa. Aliás, eu não produzo notícia, eu não sou jornalista; eu sou um cidadão com opinião."

"Também fui injustamente acusado de financiador de discurso de ódio, sem jamais ter pago por qualquer matéria ou notícia, tudo porque eu ousei acreditar na liberdade de expressão e defender que os conservadores e os cristãos merecem um espaço no debate público; que os conservadores e os cristãos devem ter voz na mídia e espaço para defender suas ideias, suas opiniões e suas perspectivas", disse.

Fakhoury negou diversas vezes que tivesse relação com Bolsonaro e sua família. “Eu não tenho relação pessoal com o presidente da República. Eu sou um apoiador e não tenho relação pessoal." Segundo ele, isso está provado porque a Polícia Federal apreendeu seus celulares e não encontrou vínculos.

Os senadores então o questionaram sobre contatos com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para a criação de uma rádio conservadora. O depoente disse que apenas pediu indicação de rádios ao filho do presidente e não que tenha articulado com ele uma parceria.

Em mensagens no âmbito do inquérito das fake news, Fakhoury aparece perguntando sobre uma possível ajuda do BNDES no negócio. À CPI ele apenas afirmou que queria mais detalhes sobre linhas de crédito oferecidas pelo banco de maneira genérica e não se tratou de um pedido de ingerência.

Ele também negou que participasse do gabinete do ódio, cuja existência foi revelada pela Folha em 2019. Fakhoury disse que havia um grupo para discutir política, mas que nunca houve a intenção de denegrir adversários ou adotar táticas antidemocráticas. "Eu desconheço a existência de um gabinete do ódio. Pra mim isso é um meme, é uma piada."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.