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CPI da Covid congresso nacional

CPI lança peso adicional sobre Bolsonaro em cenário de crise econômica duradoura

Relatório torna gestão da pandemia ponto vivo do debate político em momento de dificuldades para a população

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Brasília

Aliados de Jair Bolsonaro duvidavam dos impactos políticos da CPI da Covid. Quando a investigação começou, em abril, os governistas diziam que o avanço inevitável da vacinação daria um alívio ao país na pandemia e neutralizaria o peso dos fatos que seriam explorados pela comissão.

Para esses operadores do governo, ainda que o presidente tivesse feito uma campanha aberta contra os imunizantes, as doses seriam aplicadas, os recordes de mortes ficariam para trás e a economia voltaria a rodar. Bolsonaro, segundo essa lógica, poderia ser absolvido pelo tribunal da opinião pública.

O fim da CPI deve lançar o presidente no cenário oposto. O Brasil imunizou mais de 110 milhões de pessoas, mas o trabalho da comissão reforçou as marcas do fracasso do governo em múltiplos aspectos da gestão da pandemia e agora encontra um país com todos os sinais de uma economia em crise.

O relatório final da CPI forma uma combinação incômoda para Bolsonaro. O texto da comissão indica a responsabilidade direta do governo pela catástrofe sanitária no momento em que a população aponta o dedo para o presidente pelo sufoco da economia.

O presidente Jair Bolsonaro, em Brasília
O presidente Jair Bolsonaro, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

O pedido de indiciamento de Bolsonaro por nove crimes tende a dormir nas gavetas de Brasília antes de dar origem a processos contra ele, mas terá um efeito político.

Os depoimentos e fatos apresentados pela CPI, organizados no relatório, devem se tornar pontos vivos do debate público, inclusive no ano eleitoral.

O texto final da comissão desmonta algumas das distorções que Bolsonaro costuma apresentar em busca de proteção —como os argumentos de que o governo comprou milhões de imunizantes, respeitou a autonomia de médicos que receitavam medicamentos ineficazes e foi impedido pelo STF (Supremo Tribunal Federal) de agir durante a crise.

A CPI, porém, apontou que o governo ignorou contatos de fabricantes de vacinas, apoiou ativamente a distribuição de hidroxicloroquina e investiu numa estratégia deliberada de contaminação pelo coronavírus.

Esses tópicos representam um custo adicional para Bolsonaro numa arena política cada vez mais carregada pelos efeitos das dificuldades econômicas.

O avanço da inflação e as incertezas sobre a recuperação do emprego tendem a cobrar um preço do governo até a corrida pela reeleição em 2022.

Atualmente, o Datafolha aponta que 41% dos eleitores veem "muita responsabilidade" da gestão Bolsonaro na alta de preços, e outros 34% enxergam "um pouco de responsabilidade".

O peso duplo recai sobre um presidente que tentou, a todo custo, se livrar dos danos políticos que poderiam ser causados tanto pela má gestão sanitária como pela desaceleração econômica.

Bolsonaro investiu contra medidas de proteção porque acreditava que a interrupção das atividades durante as fases mais dramáticas da pandemia drenaria seu poder.

O presidente até conseguiu segurar os índices de aprovação na primeira onda da crise, quando o país passou dos 100 mil mortos. Ainda expandiu sua popularidade no momento em que o auxílio emergencial de R$ 600 segurou a barra da população de baixa renda.

O que se viu depois, no entanto, sugere que um governante pode até preservar força quando há muitas mortes e muito dinheiro em circulação, mas passa por maus bocados se as vítimas se acumulam e o bolso fica vazio.

A primeira queda significativa de popularidade de Bolsonaro na pandemia ocorreu em janeiro, com a interrupção do pagamento do auxílio. A aprovação ao trabalho do presidente caiu de 37% para 31%.

O segundo baque foi registrado em maio, depois que o valor do benefício foi reduzido e o Brasil enfrentou uma violenta segunda onda da pandemia. A popularidade de Bolsonaro desabou para 24% e, meses depois, foi a 22%.

Desde o início da crise, o presidente agiu com convicção para se livrar dos prejuízos que poderiam ser provocados pela freada na economia e para abrir mão da responsabilidade pela tragédia da doença. Os sinais disponíveis até agora sugerem que um problema pode potencializar o outro.

A situação econômica é um fator-chave dos humores da população. Uma crise com impacto direto no bem-estar do eleitorado costuma levantar dúvidas sobre a permanência dos governantes no poder por mais um mandato.

Tudo o que um presidente não quer, numa hora dessas, é que outros questionamentos se somem à inquietação principal. O resultado trágico do país na pandemia, formatado no relatório da CPI, já se tornou um fator adicional nesse ambiente.

Bolsonaro ainda busca algum resguardo. O consórcio entre o presidente e o núcleo político liderado pelo centrão trabalha por um alívio na pressão econômica com o aumento temporário do Bolsa Família. A medida pode ajudar, mas será insuficiente para cobrir todos os segmentos vulneráveis que receberam o auxílio emergencial.

Mais difícil será se livrar do histórico que o governo construiu no enfrentamento à doença. O próprio Bolsonaro faz questão de reforçar as conclusões da CPI. O presidente mostrou que continuará usando como armas o ataque aos adversários, a desinformação e o desestímulo à vacinação.

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