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Eduardo Leite governa o RS com acenos do bolsonarismo à esquerda

Governador, que disputa prévia tucana, mantém canais abertos com governo federal

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São Paulo

Líder do governo de Eduardo Leite (PSDB) na Assembleia Legislativa gaúcha, o deputado estadual Frederico Antunes (PP) passou a última quarta-feira (20) em Brasília, onde se encontrou com os ministros Onyx Lorenzoni (Trabalho) e Marcelo Queiroga (Saúde), entre outros compromissos.

"O Onyx é meu amigão, o filho dele foi meu colega [na Assembleia]. Temos uma relação de amizade, vim trazer alguns prefeitos da minha região para falar com ele", disse Antunes.

A conversa com Queiroga, relatou o deputado, também foi cordial. "Eu me dou bem com o Queiroga, ele fez questão de me atender. Nem tocamos em diferenças de trato da Covid".

Pré-candidato a presidente pelo PSDB, Leite tem mantido abertos canais com o governo de Jair Bolsonaro, prática que contrasta com a atitude de confronto aberto de seu adversário na prévia tucana, o governador de São Paulo, João Doria.

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, durante encontro com filiados do PSDB em São Paulo, no último dia 17 - Bruno Santos/Folhapress

A atitude maleável de Leite, acusado de falta de firmeza pelos aliados de Doria, é uma marca do estilo do gaúcho.

Isso se manifesta na forma como ele administra o estado. Desde que assumiu, em janeiro de 2019, o governador tem se esmerado na arte de fazer acenos políticos em várias direções, o que pode ser comprovado pela vasta amplitude ideológica de seu secretariado.

Ao tomar posse, por exemplo, ele transformou em colegas o filho de Onyx, Rodrigo Lorenzoni (DEM), nomeado para a pasta que cuida da articulação com municípios, e José Stedile (PSB), irmão do líder sem-terra João Pedro Stedile, que ficou com a secretaria de Obras.

Rodrigo Lorenzoni atualmente é secretário municipal em Porto Alegre.

No mesmo governo que tem o irmão do coordenador nacional do MST, a pasta da Agricultura é tocada como um negócio de família por um clã de ruralistas. Começou com o deputado federal Covatti Filho (PP), que posteriormente cedeu o lugar à mãe, a deputada estadual Silvana Covatti (PP).

No total, dez partidos passaram em algum momento pelo primeiro escalão, da centro-esquerda, representada por Cidadania e Rede, ao PTB de Roberto Jefferson, o que se traduziu numa maioria confortável no Legislativo gaúcho para Leite, com 40 dos 55 parlamentares fiéis a ele.

A oposição se restringe a 15 deputados de PT, PSOL, PDT e Novo (que se diz independente).

A construção de base tão ampla, segundo o líder do governo na Assembleia, foi necessária para que o governador conseguisse aprovar reformas econômicas que levassem ao saneamento financeiro do estado.

Sempre que pode, Leite recita suas conquistas: privatização das estatais das áreas de energia e mineração, aceleração do processo de concessões de estradas e reformas administrativa e previdenciária.

Todas foram medidas aprovadas sem muitos sustos pelos deputados estaduais, que permitiram ao governo colocar em dia o salário do funcionalismo estadual. E sempre buscando a conciliação, diz Antunes.

"É um governo que fez uma evolução, não uma ruptura com o antecessor [José Ivo Sartori, do MDB]. A missão que o governador me passou foi dar continuidade aos projetos que não puderam ser concluídos no governo anterior, iniciando pelas privatizações", afirma o líder do governo.

Leite também teve embates com Bolsonaro, sobretudo na condução da pandemia, em que restringiu a atividade econômica para reduzir a circulação do vírus, além de promover o uso de máscaras.

Em redes sociais, até hoje ele é alvo de bolsonaristas, embora com agressividade bem menor do que a recebida por Doria. Mas isso não foi suficiente, dizem partidários do governador gaúcho, para obstruir a relação com Bolsonaro.

"O que a União tem nos ajudado, ótimo, é respeitado e dado crédito. No que temos pontos de vista divergentes, divergimos, a democracia permite isso", diz Antunes.

Leite tem mais um argumento que repete para reforçar suas credenciais antibolsonaristas. O gaúcho nunca criou um "Bolsoleite", embora tenha apoiado o presidente no segundo turno de 2018, enquanto o paulista gestou o "Bolsodoria", pelo qual é cobrado até hoje.

"Identifico muito o Eduardo com o ex-presidente [Michel] Temer, nessa capacidade dele de conversar, de ter diálogo com respeito a posições ideológicas divergentes. Ele tem a habilidade que a política requer, deixando cada um no seu quadrado", diz a ex-senadora Ana Amélia Lemos (PP), que exerce a pasta das Relações Federativas.

A presença de Ana Amélia no secretariado é mais uma prova do ecumenismo da gestão Leite.

Um dos colegas de partido dela é o senador Luiz Carlos Heinze (PP), eleito na chapa do tucano em 2018 e hoje membro da tropa de choque do presidente Bolsonaro, com atuação destacada em defesa do governo federal na CPI da Covid.

Já os cinco secretários ligados ao PTB dizem que vão deixar o partido após se desentenderem com o presidente da legenda, Roberto Jefferson.

"A relação do governador com o presidente é republicana, cada um defende aquilo em que acredita. Ele [Leite] tem uma forma diferente de fazer política. Não é porque pensa diferente que vai deixar de conversar [com o governo federal]. É uma visão bem avançada, diferente do que muitos estão acostumados a ver", diz o deputado federal Daniel Trzeciak, um dos dois representantes do PSDB gaúcho na Câmara, em indireta a Doria.

Em agosto, ele e seu colega Lucas Redecker (PSDB-RS) foram cobrados por aliados de Doria por terem votado a favor da implantação do voto impresso, o que seria um indício de governismo dos tucanos gaúchos.

Trzeciak nega que tenha seguido orientação de Leite nesse tema. "No Rio Grande do Sul não tem voto de cabresto. Cada um tem seus posicionamentos e suas convicções", diz ele, que afirma que o voto impresso não é uma pauta "bolsonarista", mas sim uma medida para ampliar a transparência do sistema eletrônico.

Interessado em vestir os figurinos de centrista, moderado e reformista, Leite tem tomado alguns cuidados para não correr o risco de ficar demasiadamente associado aos pólos ideológicos.

Em relação à direita, tem demarcado alguma distância de pautas muito identificadas com esse campo. Um exemplo foi a decisão de vetar projeto aprovado pela Assembleia que criava a modalidade do ensino domiciliar no estado.

Além disso, seu governo mostra resistência à regulamentação dos serviços de aplicativo para ônibus intermunicipais, conhecido como "uber do transporte coletivo", um tema bastante caro aos liberais.

Neste mês, projeto que regulamenta esse serviço recebeu parecer contrário na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia. O autor foi o deputado Antunes, embora ele tenha dito que agiu em caráter individual nesse caso, e não como líder do governo.

Autor dos projetos do ensino domiciliar e do "uber dos ônibus", o deputado estadual Fábio Ostermann (Novo) diz que a oposição do governador a estas pautas mostra incoerência.

"Estou confiante no bom senso do governador em compreender que esta inovação veio para ficar e que o interesse do consumidor precisa ser resguardado", afirma Ostermann.

Na esquerda, também há críticas por uma suposta falta de firmeza. Pré-candidato do PT ao governo estadual, o deputado estadual Edegar Pretto critica Leite por "não levantar a voz" para Bolsonaro. "Não quero um governador brigão, mas alguém que defenda o nosso estado, e isso não acontece", diz.

Segundo ele, o governador dividiu seu secretariado pelo maior número possível de partidos, gerando uma situação de extremos ideológicos convivendo na mesma equipe.

"Ele fatiou o governo para agradar à base aliada, é o governo que mais tem base na história do Rio Grande do Sul. As reformas que fez são uma política muito velha, já testada e que não deu certo, apesar de o governador tentar se mostrar como um jovem e confiável candidato", diz Pretto.

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