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Exército alega risco a Bolsonaro e impõe sigilo a processo de Laura até fim do mandato

Força nega acesso a documentos da autorização para que filha do presidente entre em Colégio Militar sem seleção

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Brasília

O Exército apontou risco à segurança de Jair Bolsonaro e da filha Laura, 11, para impor sigilo aos documentos que embasaram a autorização para matrícula excepcional da caçula do presidente no Colégio Militar de Brasília.

Ela ganhou uma vaga na escola sem passar pelo processo seletivo a que são submetidos meninos e meninas interessados no ensino militar das unidades do Exército.

A Folha pediu, por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação), cópias do pedido apresentado por Bolsonaro; do parecer favorável do Decex (Departamento de Educação e Cultura do Exército); e da decisão do comandante, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira.

A Força negou entregar os documentos e os classificou como reservados, com sigilo decretado até o término do mandato em exercício de Bolsonaro "ou do último mandato, em caso de reeleição". A possibilidade está prevista na LAI.

"As informações solicitadas são classificadas como reservadas, em virtude da possibilidade de colocarem em risco a segurança do presidente da República e respectiva filha", afirmou o Exército ao negar a entrega dos documentos, citando os incisos e artigos da lei.

A reportagem apresentou um recurso ao Estado-Maior do Exército para tentar obter os documentos relacionados ao pedido do presidente por tratamento especial à filha.

A postura de sigilo por parte do Exército repete o que foi feito em relação ao processo administrativo disciplinar que apurou transgressões por parte do general da ativa Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde. Em maio, ele subiu num palanque político com o presidente e acabou absolvido pelo comandante. Ao processo foi imposto um sigilo de até cem anos.

A Folha revelou tanto o pedido de Bolsonaro para que a filha fosse matriculada no Colégio Militar de Brasília sem processo seletivo, em reportagem publicada em 25 de agosto, quanto a decisão do comandante de autorizar a matrícula excepcional, em reportagem veiculada na quarta-feira (27).

Oliveira disse ter se baseado no regulamento dos colégios militares, o R-69, e no fato de o presidente da República ser comandante supremo das Forças Armadas.

O R-69 não prevê condições específicas para presidentes ou para militares como Bolsonaro, que é capitão reformado do Exército.

Vagas são abertas por processo seletivo e são preenchidas mediante um rigoroso concurso, que inclui provas de matemática, português e redação, além da necessidade de apresentação de uma bateria de exames médicos e de um histórico escolar.

Neste ano, o Colégio Militar de Brasília abriu para disputa apenas 15 vagas para o sexto ano do ensino fundamental. A concorrência costuma superar 50 meninos e meninas disputando uma vaga. A filha de Bolsonaro terá uma matrícula expressa.

Aos dependentes de militares é dada a possibilidade de matrícula sem concurso, mas dentro de critérios bem específicos, conforme os regulamentos vigentes.

Filhos e filhas de militares podem ser matriculados nos colégios do Exército independentemente de processo seletivo como órfãos, dependentes de militares que mudaram de sede e dependentes de militares reformados (aposentados) por invalidez.

O R-69 prevê ainda acesso a anos escolares para os quais não há processo seletivo, conforme regulação do departamento de ensino da Força.

Para esses casos, são feitos sorteios, mediante inscrição direta dos interessados no Colégio Militar. O de Brasília, por exemplo, publicou um comunicado com informações sobre sorteios para eventuais vagas ociosas no sétimo, oitavo e nono anos do ensino fundamental, além de segundo e terceiro anos do ensino médio, todas elas para 2022.

O mesmo R-69 é usado para as autorizações excepcionais, as matrículas de alunos por decisão direta do comandante do Exército.

Para o caso da filha do presidente, o comandante usou essa possibilidade de autorização excepcional, conforme a resposta fornecida à reportagem via LAI.

O artigo citado foi o 92 do R-69, que "estabelece que os casos considerados especiais poderão ser julgados pelo comandante do Exército, ouvido o Decex", segundo a resposta.

O Exército apresentou outros argumentos para justificar o benefício dado ao presidente. "O requerente é capitão da reserva do Exército brasileiro, foi diplomado e empossado como presidente da República do Brasil, tendo fixado residência na cidade de Brasília", afirmou a Força. Brasília é assistida pelo sistema de colégios militares brasileiros, conforme a resposta dada.

Além disso, ao se tornar presidente, Bolsonaro "assumiu o comando supremo das Forças Armadas", conforme previsto na Constituição Federal. Um direito dos militares, segundo citação do Estatuto dos Militares feita pelo Exército, é a "garantia da patente em toda a sua plenitude".

As crianças que se candidataram às vagas existentes foram submetidas a três etapas: exame intelectual, que tem caráter eliminatório e classificatório; revisão médica e odontológica, eliminatória; e comprovação dos requisitos biográficos dos candidatos, também eliminatória.

O exame intelectual consiste em 12 questões de matemática, 12 de língua portuguesa e uma redação de 15 a 30 linhas.

Já os exames médicos, para os classificados, incluem: radiografia do tórax, glicose, hemograma completo, sumário de urina, parasitologia de fezes, eletrocardiograma e exame clínico e odontológico. A biografia consiste na análise do histórico escolar.

A matrícula de Laura sem concurso, no ano letivo de 2022, repete o benefício dado ao filho da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP). No ano passado, o menino de 11 anos foi matriculado no colégio, sem seleção, para cursar o sexto ano.

Zambelli é uma das principais apoiadoras de Bolsonaro. A deputada admitiu o privilégio, mas negou irregularidades.

Ela alegou que se tratava de uma questão de segurança: o filho sofreria ameaças desde 2016, conforme a mãe. A autorização para matrícula em caráter excepcional foi dada pelo então comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, e publicada em um boletim interno de acesso restrito.

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