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Interpol segura inclusão de bolsonaristas em lista de procurados de forma inédita

Segundo especialistas e informações de bastidores, organização passou a analisar mérito por receio de perseguições políticas

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Brasília e São Paulo

A Interpol, em Lyon (França), não atendeu até agora os pedidos das autoridades brasileiras para incluir bolsonaristas investigados pelo STF (Supremo Tribunal Federal) na sua lista de procurados.

A entidade, que reúne representantes de policias de cerca de 200 países, deixou de fora o caminhoneiro Marcos Gomes, o Zé Trovão, e ainda segura o pedido do STF para colocar o influenciador Allan dos Santos na chamada difusão vermelha.

Em geral, a inclusão ocorre de maneira célere, o que não ocorreu dessa vez —de forma inédita. Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, os dois são alvos de investigações cujo relator é o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo.

Allan dos Santos, influenciador bolsonarista do site Terça Livre, presta depoimento à CPMI das Fake News
Allan dos Santos, influenciador bolsonarista do site Terça Livre, presta depoimento à CPMI das Fake News - Pedro Ladeira-5.nov.2019/Folhapress

O caminhoneiro teve um pedido de prisão expedido por Moraes por causa da participação dele na organização dos atos do 7 de Setembro, ficou foragido no México e não foi incluído pela Interpol até retornar ao Brasil e se entregar à Polícia Federal.

Allan dos Santos teve a prisão e extradição decretada em 5 de outubro no inquérito que apura a existência de uma milícia digital para atacar a democracia e as instituições.

Desde então o Brasil acionou os Estados Unidos, onde o influenciador mora, por meio do DRCI (Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Internacional), e enviou o pedido à Interpol para inclusão na difusão vermelha.

Como a Polícia Federal representa o Brasil na Interpol, é por meio dela que os pedidos com base em decisões judiciais chegam à Interpol. No caso de Allan dos Santos, a decisão de Moraes foi enviada há mais de três semanas.

Caminhoneiro Zé Trovão, um dos articuladores dos atos de 7 de Setembro
Caminhoneiro Zé Trovão, um dos articuladores dos atos de 7 de Setembro - Reprodução

A entidade, segundo relato de investigadores, tem feito uma análise jurídica dos casos para evitar ações contra supostos perseguidos políticos. Não houve uma resposta definitiva até o momento. Segundo informações de bastidores, os documentos ainda estão sendo verificados.

A mudança de postura tem chamado a atenção de policiais no Brasil, que relatam nunca ter visto algo semelhante. Entre integrantes do órgão, entretanto, a nova postura é justificada como forma de evitar novos recursos com alvos de inclusão acionando a Justiça contra a Interpol.

No caso de Allan dos Santos, a decisão foi dentro do inquérito das milícias digitais. Esse caso é um dos que os bolsonaristas criticam pelo fato de Moraes ter reaberto a apuração mesmo após pedido de arquivamento da Procuradoria-Geral da República.

Ao reabrir o caso em outro inquérito, Moraes colocou a PF para investigar uma suposta organização criminosa que atua para atacar a democracia e as instituições.

Por se tratar de apuração amparada pela Lei de Organização Criminosa, os investigadores argumentam que não se trata de crimes relacionados à liberdade de expressão e, portanto, não caberia análise da Interpol por possível perseguição política.

Segundo a normativa do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), a difusão vermelha deve ser acessada em casos de "ordem de prisão por decisão judicial criminal definitiva, de sentença de pronúncia ou de qualquer caso de prisão preventiva em processo crime".

Em tese, segundo especialistas ouvidos pela Folha, após receber os pedidos embasados em decisões do STF, a Interpol deveria incluir os nomes quase que automaticamente na lista, após verificação de formalidades, como é o padrão, para acionar a rede de países integrantes e efetuar a prisão ordenada.

Especialistas ouvidos disseram não ser comum o não cumprimento dos pedidos pela Interpol e não souberam informar outros casos como esses.

Segundo eles, a não inclusão pode ocorrer, por exemplo, em casos em que a autoridade que solicita não é competente, quando o país solicitante passa por convulsão social ou em situações excepcionais.

Em 2018, a entidade chegou a retirar o nome do advogado Rodrigo Tacla Duran da difusão vermelha.

Ele havia sido incluído a pedido do então juiz Sergio Moro, mas recorreu alegando parcialidade do julgador uma vez que havia citado seu nome em entrevista. A decisão da Interpol se baseou, entre outros argumentos, no artigo 2º do seu regulamento interno.

Esse trecho do normativo diz que a Interpol deve "garantir e promover a maior assistência mútua possível entre todas as autoridades policiais dentro dos limites das leis existentes em diferentes países e respeitando a Declaração Universal dos Direitos Humanos".

Questionada, a Interpol não se manifestou.

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