Menino de 9 anos, filho de líder rural, é morto a tiros em Pernambuco

Crime ocorreu em engenho onde moram mais de 60 famílias; Comissão Pastoral da Terra pede apuração de conflito agrário

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Rio de Janeiro

Um menino de 9 anos foi assassinado a tiros na noite desta quinta-feira (10), na frente dos pais, no município de Barreiros, em Pernambuco. O crime ocorreu no engenho Roncadorzinho, onde moram mais de 60 famílias.

Presidente da associação dos agricultores familiares do local, o pai do menino, Geovane da Silva Santos, também foi atingido no ombro pelos disparos, mas sobreviveu.

Segundo informações de moradores do engenho, o assassinato ocorreu por volta das 21h, quando sete homens encapuzados e armados invadiram a casa de Geovane.

Crime ocorreu em um engenho onde moram mais de 60 famílias; Comissão Pastoral da Terra pede para que conflito agrário seja investigado
Cama onde o menino teria se escondido com a mãe antes de ser morto por homens encapuzados - Divulgação

De acordo com relato da mãe do menino à CPT (Comissão Pastoral da Terra), braço agrário da Igreja Católica, os suspeitos atiraram primeiro no homem. Ela e o filho se esconderam embaixo da cama, mas os criminosos arrastaram o menino e atiraram contra ele.

Agricultores afirmaram à CPT que a casa de Geovane já havia sido alvo de outros atentados. A comissão pede que a investigação do crime apure uma eventual relação com o conflito agrário existente na região.

A ocupação do engenho pelas famílias, na condição de agricultoras familiares, ocorreu após a falência das usinas onde trabalhavam ou eram credoras.

Segundo a CPT, nos últimos anos a comunidade vem sofrendo diversas ameaças e violências por empresas que exploram economicamente a área, com intimidações, destruição de lavouras e com contaminação das fontes de água.

Segundo a instituição, os casos já foram denunciados às autoridades, sem que medidas efetivas tenham sido tomadas pelo Estado.

O corpo da criança foi enterrado na tarde desta sexta-feira (11). Moradores realizaram um protesto e levaram cartazes com dizeres de "saudades".

Em nota, a Polícia Civil de Pernambuco afirmou que o delegado titular de homicídios de Palmares, Marcelo Queiroz, foi designado para apurar o fato. A Delegacia Seccional de Palmares e a Delegacia de Barreiros estão dando apoio nas investigações.

A corporação disse que "está empenhada na investigação, até a completa elucidação e responsabilização penal" dos envolvidos. Guarnições da Polícia Militar seguem fazendo incursões na área para localizar os suspeitos.

A polícia realizou perícia no local do crime nesta sexta-feira (11) e coletou o depoimento de dois vizinhos. Segundo Lenivaldo Lima, advogado da CPT, a cena do crime não foi preservada até o momento da perícia, já que a família havia lavado o cômodo após a morte do menino.

Ele disse à reportagem que os pais estavam muito abalados e que, por isso, ainda não haviam sido ouvidos pela polícia. A previsão é a de que eles prestem depoimento na segunda-feira (14) à tarde.

Lenivaldo passou o dia todo no engenho, acompanhando a família. Ele diz que os moradores estão muito amedrontados e afirma que durante as conversas não surgiu outra possível motivação para o crime além do conflito agrário.

"Eles dizem: 'Como que isso pode ter acontecido? Uma família que não faz mal para ninguém, que não tem nenhum inimigo, nenhum desafeto'."

O PEPDDH (Programa Estadual de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos) esteve na comunidade no sábado (12) para fazer uma escuta especializada no local.

Segundo a CPT, as autoridades ofereceram o ingresso da família em um programa de proteção provisório. Para isso, o casal deixaria o engenho e se mudaria para um local distante e sigiloso, pelo período de 30 dias, enquanto outras medidas de proteção seriam estudadas.

Tais medidas possibilitariam que a família continuasse vivendo na comunidade, com segurança garantida pelo Estado, ou que deixasse o local definitivamente. De acordo com a CPT, as vítimas estão muito assustadas e ainda estão refletindo sobre qual decisão tomar.

A comunidade aguarda a visita de membros da comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e do Senado na próxima sexta-feira (18).

A comissão da Câmara enviou ofícios para o governador, o procurador-geral de Justiça e o secretário de Defesa Social de Pernambuco.

Nos documentos, o presidente da comissão, deputado Carlos Veras (PT), lembrou que o grupo realizou diligência na região da Mata Sul de Pernambuco em 15 de dezembro, quando recebeu denúncias dos agricultores familiares e procurou contribuir com a mediação de conflitos na região.

"É gravíssimo que menos de dois meses depois um atentado tire a vida de uma criança", afirmou o parlamentar.

Presidente da comissão no Senado, o senador Humberto Costa (PT) pressionou nas redes sociais pelo andamento das investigações.

"Vamos cobrar pessoalmente do governador Paulo Câmara o aprofundamento dessas investigações. Que se façam rapidamente, e que possam indicar os responsáveis por esse que é um atentado contra o direito de as pessoas poderem sobreviver e pacificamente utilizar a terra", disse em gravação.

Também nas redes sociais, a vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos (PCdoB), afirmou que as forças de segurança do estado permanecerão mobilizadas até a elucidação completa "desse crime bárbaro".

"Não podemos tolerar que, em pleno 2022, continuemos a conviver com a violência contra agricultores e suas famílias", escreveu.

Até a tarde de domingo (13), o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), não havia se manifestado nas redes sociais sobre o assassinato do menino.

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