Arthur do Val usa caso Isa Penna contra cassação, mas não convence deputados

Parlamentares da Assembleia de SP não aceitam comparação e dizem que deputado deveria renunciar após áudios

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São Paulo

O deputado Arthur do Val (sem partido) e seus aliados apostam no precedente do deputado que apalpou uma colega —e recebeu pena de suspensão— para tentar livrá-lo da cassação na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo).

Para convencer os colegas, Arthur do Val também prometeu que não irá se candidatar à reeleição na Casa, após a repercussão de áudios em que diz, entre outras coisas, que as ucranianas "são fáceis, porque são pobres".

A tendência atualmente é que os argumentos não devam colar com o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp, que julgará o caso antes de levá-lo a plenário.

No caso do deputado estadual Fernando Cury (sem partido), que apalpou Isa Penna (PSOL) no plenário da Assembleia, a punição ficou em seis meses de suspensão, apesar de alguns pedidos pela cassação.

Arthur do Val em evento de filiação ao Podemos, sigla da qual se desfiliou após escândalo
Arthur do Val em evento de filiação ao Podemos, sigla da qual se desfiliou após escândalo - Adriano Vizoni-26.jan.22/Folhapress

Arthur citou o caso, e diversos aliados dele têm compartilhado a história do deputado suspenso para exemplificar que a pena de cassação é alta demais.

O peso da opinião pública, aliado ao fato de que Cury era um deputado com bom relacionamento na Casa, deve afetar o desfecho do caso negativamente em relação a Arthur.

Em uma frente mais institucional, sem tocar no assunto da suspensão de Cury, a carta enviada aos deputados por Arthur cita a necessidade de punição. No entanto a cassação é apontada por ele como uma punição exagerada.

O compromisso na carta, porém, parece brando demais para alguns dos colegas de Arthur, que cobram a renúncia dele.

Vídeo mostra deputado Fernando Cury apalpando a deputada Isa Penna durante sessão da Alesp
Vídeo mostra deputado Fernando Cury apalpando a deputada Isa Penna durante sessão da Alesp - Reprodução

A Folha procurou todos os integrantes do conselho de ética da Alesp. Os deputados, em sua maioria, rebatem a argumentação de Arthur.

"Se o Cury teve uma penalidade dada às relações [dele com colegas] e ao julgamento como foi, não dá para usar a mesma medida. Não é sobre ser pior ou melhor, é sobre quebra de decoro. É sobre isso que a gente vai se debruçar", disse a deputada Erica Malunguinho (PSOL).

Para o deputado Campos Machado (Avante), não há comparação entre os episódios.

"São dois casos totalmente distintos. E eu estou defendendo que o Arthur se demita, renuncie", afirmou. "Ele criou um ambiente constrangedor, e a sua presença na Casa vai virar um maior constrangimento ainda. Vai constranger colegas, principalmente as mulheres."

O deputado Barros Munhoz (PSB) é outro que afirma que Arthur deveria renunciar. "Entendo que no caso dele, se não vai mais ser candidato, deveria renunciar ao mandato já", diz ele.

"Não tem como se justificar. Não adianta ficar comparando com outros exemplos que tiveram uma pena menor. Ele vai receber uma punição do tamanho ou proporcionalidade do fato que cometeu."

A deputada Isa Penna afirma que a maioria da Casa quer a cassação.

"Hoje o posicionamento do Conselho de Ética foi evidente, a Casa e a maioria dos deputados querem a cassação, eu inclusive quero que seja visto não só como quebra de decoro como também misoginia. A partir disso, me perguntam sobre o Cury que não foi cassado, eu quero e sempre quis a dele também, a Alesp e os deputados irão ter que responder a isso ao povo, quem sabe a consciência não bate e eles consigam reaver a decisão de apenas seis meses", afirmou.

O deputado Delegado Olim (PP) afirma que os fatos ainda devem ser analisados, mas que a opinião pública acaba tendo um peso grande num caso como o de Arthur do Val.

O parlamentar assinala a diferença em relação a outros casos por se tratar de uma situação de guerra. "Isso mexeu com o Brasil, deixou todo mundo revoltado", diz ele, acrescentando que o comportamento do deputado não o ajuda dentro da Casa.

"Ele tem poucos amigos", emenda —Arthur já brigou com deputados da Alesp em diferentes ocasiões, além de ter sido expulso do DEM.

A presidente do Conselho de Ética, Maria Lúcia Amary (PSDB), espera que uma eventual punição a Arthur do Val não se dê por causa do isolamento político do deputado.

"Não dá para analisar o histórico dele [de brigas com outros deputados na Casa]. O que está em julgamento aqui é essa situação dele [os áudios sexistas sobre ucranianas]."

"Foi a maior mobilização de parlamentares que já vi", diz ela, que considera tanto o caso Cury quanto o de Arthur graves.

INTEGRANTES DO CONSELHO DE ÉTICA DA ALESP

  1. Maria Lúcia Amary (PSDB)

    Presidente

  2. Barros Munhoz (PSB)

    Vice-presidente

  3. Enio Tatto (PT)

    Membro efetivo do conselho

  4. Wellington Moura (Republicanos)

    Membro efetivo do conselho

  5. Delegado Olim (PP)

    Membro efetivo do conselho

  6. Erica Malunguinho (PSOL)

    Membro efetivo do conselho

  7. Campos Machado (Avante)

    Membro efetivo do conselho

  8. Marina Helou (Rede)

    Membro efetivo do conselho

  9. Adalberto Freitas (União)

    Membro efetivo do conselho

Marina Helou (Rede) ainda cita que o caso de Cury foi interrompido pelo recesso parlamentar entre o fim de 2020 e começo de 2021.

"O caso do Fernando Cury emendou no recesso. Então o do Arthur vai ser mais rápido. Mas eu vejo mais mobilização [entre os deputados, contrários a Arthur] sim."

Adalberto Freitas (União Brasil) afirmou que a maioria dos líderes já se manifestou pela cassação. "Ficou muito complicado [para Arthur do Val]. Não acredito que alguém votaria favoravelmente a ele", diz.

Ele aponta que o caso Cury foi nacional, mas que a questão envolvendo Arthur excedeu essa fronteira.

Procurado, o deputado Wellington Moura (Republicanos) não respondeu até a conclusão deste texto.

A renúncia, citada como solução por diversos deputados, pode não bastar para evitar que Arthur seja cassado. Isso porque, após as representações, se os deputados quiserem, a punição pode ser aplicada mesmo assim.

Para o advogado Amilton Augusto, a dosimetria das penas na Alesp é uma questão que compete exclusivamente aos deputados e dificilmente haveria uma brecha para revertê-la por via judicial.

"Quando você abre a Constituição do estado, as normas da questão ética, não há uma previsão de um rol de penalidades, se fez aquilo, aplica a cassação. Ela é muito vaga. Fala em quebra de decoro parlamentar. Nesse cenário, o âmbito político é que comanda", diz.

Para ele, num caso assim, basta que os deputados sigam os processos adequadamente, como proporcionar o direito de defesa ao parlamentar julgado, que a decisão está resguardada.​

O conselho de ética da Assembleia paulista já recebeu 16 representações pedindo a cassação do mandato de Arthur do Val. Entre eles há uma solicitação assinada em conjunto por 17 deputados e outra enviada pela bancada do PSDB na Alesp.

O grupo se reuniu na manhã desta quarta (9). No encontro, o conselho decidiu, por unanimidade, unificar todas as representações recebidas com o pedido para cassar o mandato de Arthur por decoro parlamentar.

Entenda o caminho para a eventual perda de um mandato:

Como funciona a tramitação do processo no Conselho de Ética da Alesp? O primeiro passo é o recebimento das representações pela presidente do colegiado.

Depois disso, a comunicação é feita aos nove deputados que integram o Conselho, e o deputado alvo será notificado. Arthur do Val terá um prazo de cinco sessões do plenário para apresentar a chamada defesa prévia.

A próxima etapa é a convocação de uma reunião do conselho para que os deputados julguem a admissibilidade das representações, que poderão ser unificadas para a tramitação.

Arthur do Val terá então um novo prazo de cinco sessões para apresentar a defesa de mérito no processo. Após esse prazo, é definido o relator, responsável pela formulação de um parecer que será votado pelo colegiado. Geralmente, esse documento é elaborado dentro de 15 dias.

"Minha preocupação é dar celeridade respeitando o regimento e esperamos que em dois meses possamos resolver essa questão. Claro que ele pode criar mecanismos jurídicos, mas no tocante ao Conselho de Ética vou seguir rigorosamente os prazos", diz a deputada Maria Lúcia Amary, que preside o colegiado.

O que é preciso para que o deputado seja punido? É necessário maioria simples para que a punição contra o deputado seja aprovada pelo Conselho de Ética, que tem nove membros efetivos, além do corregedor. Em caso de empate, a presidente do colegiado pode definir a votação.

O parecer aprovado é encaminhado para votação em plenário, onde precisa da maioria simples para ser aprovado. A Assembleia tem 94 deputados, então isso significa que seria necessário o aval de pelo menos 48 parlamentares.

O deputado já foi punido antes na Assembleia? Sim. A punição mais recente foi definida em fevereiro pelo Conselho de Ética, que decidiu que o deputado deverá ser advertido por pagar salário a um assessor em um dia que ele não estava trabalhando. Na próxima reunião, ele será convocado para receber a punição.

Em 2019, o colegiado havia aplicado advertência verbal a Arthur do Val, após ele chamar colegas de "vagabundos" durante uma sessão plenária na Casa.

Erramos: o texto foi alterado

Os partidos dos deputados Maria Lúcia Amary (PSDB) e Barros Munhoz (PSB) estavam trocados em versão anterior da lista de integrantes do Conselho de Ética da Alesp.

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