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Eleições 2022 Guerra na Ucrânia

Bolsonaro tenta conter crise com migalhas do marketing de guerra

Pressionado pelo mega-aumento da gasolina, presidente faz jogada de imagem ao recepcionar resgatados da Ucrânia

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Brasília

Efeitos da guerra na Ucrânia tocaram o solo brasileiro num intervalo de poucas horas na quinta-feira (10). No meio da manhã, a Petrobras anunciou um mega-aumento no preço dos combustíveis, deflagrado pela disparada do petróleo no mercado internacional. Logo depois, o voo que resgatou brasileiros e estrangeiros que fugiam do conflito pousou em Brasília.

Atingido em cheio pelas repercussões do aumento da gasolina e do diesel, Jair Bolsonaro avisou preventivamente que não tinha o que fazer. "Eu não decido nada, não", disse a apoiadores, no início do dia. Mais tarde, o presidente se revestiu de autoridade para receber as 68 pessoas que chegavam ao país num avião da FAB.

A reação pública de Bolsonaro aos dois casos mostra como ele costuma lidar com o desequilíbrio da balança política em momentos de crise.

Refém de posições erráticas diante do conflito ucraniano e pressionado por suas consequências econômicas, o presidente tenta catar migalhas do marketing da guerra.

O presidente Jair Bolsonaro recebe brasileiros que estavam na Ucrânia
O presidente Jair Bolsonaro recebe brasileiros que estavam na Ucrânia - Sérgio Lima/AFP

Bolsonaro levou oito ministros, a primeira-dama e aliados políticos até a Base Aérea de Brasília.

Embora a operação de retirada carregue um caráter humanitário e envolva uma complexidade logística, trata-se de um pequeno fragmento da agenda do governo no contexto da emergência que estourou há mais de duas semanas.

A comitiva presidencial cumprimentou os resgatados e posou para fotos ostentando bandeiras brasileiras. Em busca de um bônus de imagem, Bolsonaro tentou vincular sua figura diretamente a um esforço para amenizar os impactos da guerra –ainda que outros prejuízos se avizinhem.

Um roteiro semelhante foi explorado pelo governo no início da crise da Covid. Enquanto Bolsonaro lançava um protocolo que minimizava os riscos do novo coronavírus, o governo tratou com pompa a operação para repatriar brasileiros vindos de Wuhan, epicentro inaugural da doença.

A partir daquele momento, o resgate se tornou uma espécie de rede de proteção para Bolsonaro diante da má administração da crise sanitária. Sem interesse em instalar um plano para conter o vírus, o presidente passou a apresentar a volta dos brasileiros como um ato bem-sucedido de sua gestão na pandemia.

A hesitação inicial do governo em relação aos dois voos reforça a convicção de que houve naquelas operações um interesse considerável em extrair ganhos políticos.

No fim de janeiro de 2020, Bolsonaro disse que não buscaria os brasileiros de Wuhan porque a viagem seria cara demais. Dias depois, a Força Aérea começou a divulgar informações sobre a preparação de aeronaves para a missão.

No caso da Ucrânia, o governo deixou de elaborar um plano de evacuação nos dias que antecederam a guerra.

Embora houvesse sinais de um avanço russo e recomendações de outros países para que seus cidadãos deixassem a região, o Brasil se manteve em silêncio para evitar constrangimentos com o recém-visitado Vladimir Putin.

Bolsonaro apostou num tipo de neutralidade pragmática diante da guerra, acreditando que contrariar os russos causaria prejuízos econômicos ao Brasil. Esse impacto veio mesmo assim.

A recepção oficial aos brasileiros e estrangeiros resgatados mostra que o presidente continua investindo em gestos simbólicos para contornar os efeitos da crise. Uma jogada de imagem é certamente mais simples do que a busca por uma solução para o complexo problema dos combustíveis.

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